PRÓLOGO

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A brisa era extremamente gelada. Mais do que o normal para aquela época do ano e, principalmente, para um lugar quente como aquela cidade. O vento soprava e fazia esvoaçar algumas folhas ainda verdes que caiam com frequência da copa das árvores margeando, de ambo os lados, a rodovia.

Era uma autoestrada extensa, onde a próxima curva se dava a muitíssimos quilômetros daquele ponto. A vista se perdia no horizonte da extensão daquela rua.

O silêncio engolia o lugar. A escuridão era densa por falta de postes de iluminação que funcionassem corretamente. Estranhamente há alguns dias as lâmpadas e a eletricidade naquele determinado local pararam de funcionar e retornavam ao seu trabalho quando bem entendessem. O fato de as luzes tremularem, se acenderem, se apagarem e voltar a se acenderem conferiam ao lugar uma atmosfera sinistra e horripilante; ainda mais se levarmos em consideração que a rodovia era deserta, havendo alguns hotéis e pousadas distantes demais umas das outras. Naquele exato local não havia nada, sequer um restaurante de beira de estrada, uma casa de veraneio, uma choupana abandonada.

Absolutamente nada.

A única coisa que quebrava parcialmente a densidade da noite e o silêncio amedrontador eram os faróis baixos de uma viatura da polícia e a estática de um rádio. Lá dentro, protegido do vento gélido, Pedro tentava sintonizar uma estação. Ele gostava de música. Música o acalmava, o relaxava e, acima de tudo, fazia as horas correrem sem que ele percebesse. Ouvindo suas melodias favoritas — muitas delas canções de sucesso dos anos 60, 70 e 80 —, seu expediente acabava mais rápido e mais agradavelmente. Se não fosse a distração da música, Pedro Casagrande ficaria dentro de sua viatura, entediado, atento a qualquer movimento e esperando alguma ocorrência nas redondeza boa o suficiente para quebrar o tédio que o rondava, enquanto as horas se arrastavam lentamente até a aurora.

Impaciente, ele bufou e se recostou pesadamente contra o banco do motorista. Por alguma razão, naquela madrugada, não conseguia sintonizar nenhuma estação de rádio.

Olhou no relógio. Quase duas da manhã e quase uma hora que estacionara naquele ponto desértico para iniciar mais uma rotina do seu trabalho. Praguejou-se mentalmente por não ter dado ouvidos ao seu filho, um jovem de dezoito anos, sobre adquirir um pequeno artefato chamado Ipod ou algum celular Android a qual ele poderia ouvir suas músicas sem a necessidade de sintonizar uma estação.

Se tivesse comprado, não estaria dependendo dessa porcaria de rádio, resmungou interiormente.

No auge de seus cinquenta anos, viúvo desde os quarenta e tendo de criar sozinho o casal de filhos, de oito e quinze anos na época, toda a tecnologia moderna e juvenil do mundo atual era um bicho-de-sete-cabeças para Pedro. Ele ainda enviava cartas em vez de e-mails, apresentava seus relatórios ao seu superior a punho ou, vez ou outra, datilografados numa máquina de escrever quase arcaica guardada no porão de sua casa.

Sem nada para fazer, decidiu ligar para a filha mais velha e saber se o jovem Igor já havia voltado para casa ou se continuava perdido em alguma balada no centro movimentado da cidade. Retirou o celular do bolso, um modelo antigo, e reparou que não havia sinal. Juntou o sobrolho. Nunca faltava sinal.

É feriado!, lembrou-se, As linhas devem estar congestionadas, ponderou.

Tornou a guardar o antigo objeto no porta-luvas do carro e se recostou ao banco outra vez.

Apesar de ser feriado nacional, aquelas ruas não estavam movimentadas com o vai e vem de carros e ônibus turísticos. Na verdade, ela nunca era. A autoestrada era apenas uma via alternativa pouco utilizada.

Hotel Califórnia - O Mal à Espreita - Livro 1Onde histórias criam vida. Descubra agora