Capítulo 1 - Notícia

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- Senhora Mathews, eu realmente sinto muito. Os exames indicam que as possibilidades de Jake ter um filho biológico são inexistentes. - disse o dr. Mason. Minha mãe parecia devastada. Claro que como todas as mães com um filho já adulto, ela sonhava com netos. Me senti culpado por frustrar seus planos.

Eu observei-a agradecer ao médico e se levantar da cadeira. Enquanto ela se encaminhava para a porta, corri para chegar a recepção, que era onde eu estava antes que a mesma entrasse para receber o resultado dos exames. Assumi uma expressão serena e perguntei quando a vi se aproximando:

- Como foi? - tentei transmitir o máximo de calma na voz, para que ninguém suspeitasse de que eu tinha escutado tudo atrás da porta.

- Ah, Jake... - Kat (mais conhecida como minha mãe), se sentou ao meu lado e me abraçou, como fazia quando eu era pequeno e me machucava brincando de alguma coisa. Assim que se afastou, olhou para mim com um misto de pena e preocupação. - Eu sinto muito.

Ver alguém falando que eu era incapaz de ter filhos biológicos tornava tudo mais real. A dor veio sutil e se apoderou de mim antes que percebesse. Toda a força e auto controle que tinha sumiram em um piscar de olhos. Jamais teria um filho ou filha verdadeiramente meu. Parecia que eu tinha perdido alguém. E de certo modo, eu tinha.

Consegui a proeza de perder a mim mesmo.

Ao perceber o que se passava, minha progenitora levantou e ofereceu-me a mão. Aceitei e me deixei ser levado por ela até o carro. Assim que entramos, liguei o rádio e coloquei em uma estação qualquer, mas imediatamente o som foi interrompido.

- Jake, escute. Eu sei que é difícil, mas nós vamos pensar em uma solução mais adiante. Você pode resolver isso. Nós podemos. - ela sorriu. Esbocei um sorriso e como aparentemente se deu por satisfeita, começou a dirigir em direção a nossa casa.

                                                                         *

Suspirei aliviado quando finalmente terminei aquela planilha. Eu simplesmente odiava ter que analisar os lucros do mês e ter que formatar no Excel. Nunca me dei bem com matemática, o que provavelmente me irritava ainda mais na hora de realizar aquela tarefa. Mas como a empresa andava bem, fiquei satisfeito.

- Jake, isso aqui está um chiqueiro. Não sei como você pode ser virginiano  e trabalhar nessa bagunça. - disse Jess, entrando na sala e torcendo o nariz para minha sala. Sempre trabalhei melhor no meio do caos, o que era um pouco contraditório.

- Deve ser culpa do meu ascendente. - disse, fazendo piada com o termo que ela me ensinara quando analisava meu mapa astral. Os signos diziam muita coisa sobre as pessoas, segundo ela.

- Ah, isso talvez. Mas na verdade não vim te dar uma bronca, só te lembrar que você vai sair comigo e com August hoje. Mas não podemos voltar tarde, porque antes das 23 horas eu preciso estar em casa de acordo com Greg. - revirou os olhos. - Eu odeio isso.

Jess era minha melhor amiga e como me contava tudo, eu sabia que no fundo ela não sentia a menor atração por homens. Era triste imaginar que por causa da família Jazzy (o apelido dela na empresa) jamais poderia ser quem realmente era. Honestamente, eu não sabia como lidaria com isso. Mas minha família sempre me apoiou em absolutamente tudo e eu sabia que se eu fosse gay, não precisaria ter medo dos meus pais.

- Bem, nada de lamentações! August já saiu e disse que nos encontra lá. Vamos logo. - disse ela.

- Aonde vamos mesmo? - questionei. - Ah, você pode me dar uma carona hoje? Precisava estar aqui cedo para uma reunião e August apareceu na minha casa me apressando. Acabei indo com ele.

- Claro. Nós vamos no Johnny's. Preciso urgentemente do meu cappuccino e de um pedaço de torta de chocolate. Estou em crise de falta de açúcar. - riu. Começou a sair da sala e a segui, indo em direção ao carro branco dela.

- Estou a fim de um chocolate quente hoje. - disse, já morrendo de fome. Não tinha almoçado por conta de uma reunião que durou além do esperado. Jazzy tagarelou durante todo o caminho e eu só prestava atenção em algumas frases. Era impressionante a velocidade que as palavras saiam de sua boca. Era quase musical.

- Chegamos! Ainda bem. Ande logo, eu vou ter um treco no meio da rua se não tomar aquele cappuccino agora. - ela disse saindo voando do carro. Sorri e fechei minha porta, feliz com a companhia. Não podia pensar em alguém melhor para ser minha amiga.

Quando finalmente entrei no estabelecimento, August ria ao ver Jess praticamente dar pulinhos com a tão sonhada torta em mãos. Ela se sentou e indicou a outra cadeira da mesa para que eu me sentasse.

- Você disse que estava com crise de açúcar e eu não levei fé, mas depois dessa reação eu acredito. - August riu.

- Nunca duvide de mim sr. Gus. Eu sou uma mulher sincera. - disse com um sorriso travesso no rosto.

- August, acho que nunca vi ela tão feliz desde que descobriu que meu signo e minha lua combinam perfeitamente, seja lá o que isso significa. - ri.

- Eu até explicaria o que a lua significa, mas esse maravilhoso cappuccino merece toda a minha atenção. - Jazzy falou, pegando o café da bandeja da garçonete e agradecendo em seguida.

A noite passou rápido e logo o veículo branco estacionou em frente a minha casa. Ela destravou o carro e sorriu para mim.

- Foi legal. Vamos fazer toda semana, se pudermos. Agora eu preciso ir para casa ou Greg vai se chatear comigo. - disse cabisbaixa.

- Jess... você não pode continuar com alguém que não te faz feliz. Precisa ser você mesma. - tentei consolar minha amiga, mas sabia que ela iria esconder sua verdadeira identidade.

- Se fosse fácil assim... Ah, já é tarde. - ela disse olhando o relógio no pulso. - Vejo você amanhã?

- Claro. Boa noite. - falei e me dirigi até minha casa. Assim que entrei e tranquei a porta, me dirigi ao banheiro e tomei um banho frio. Eu esperava que Jazzy pudesse resolver tudo e prometi a mim mesmo que a ajudaria, não importava o que custasse. Depois da chuveirada, deitei na cama e comecei a ler. "Os miseráveis" era meu clássico preferido, então resolvi reler o mesmo até finalmente pegar no sono.

                                                                      *

Não sei exatamente quando, mas de repente eu me vi no meio de um pátio. Algumas crianças brincavam, exceto por uma. Uma garotinha loura estava sentada em um dos bancos, com um livro na mão. Quis ir até ela, mas não pude me mexer. Sabia que já tinha visto aquele livro antes, mas onde? Incapaz de me mover, tentei chamá-la, mas minha voz também não saía. Até que a cena mudou e eu vi um nome. Orfanato Mrs. Reynolds. Que lugar era aquele? Tudo desapareceu, e a última coisa de que me lembro foi ter escutado a voz de uma garotinha cantar:

"Imagine there's no heaven / It's easy        if you try".

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⏰ Última atualização: Jun 16, 2017 ⏰

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