Capitulo I - In Utero

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Sentiam. Apenas sentiam. Ambas sentiam os batimentos cardíacos uma da outra, abraçavam-se e davam pontapés uma da outra. Juntavam as testas e adormeciam, tão profundamente, que a realidade futura era apenas um sonho longínquo. Viviam rodeadas por um ambiente ameno que brevemente lhes tiraria isto tudo. Tiraria o chão, mais propriamente o colo. Mostraria a realidade, nua e crua, e principalmente, lhes tiraria o ombro amigo.

Chegava lentamente, como quem quer adiar uma desgraça que é certa, uma enfermeira. De olhar baixo, ia avançando e recuando, de papeis na mão mas finalmente chegou ao pobre homem. Não o deixou falar, nem sequer fazer as perguntas chave como: "Como está ela?". Apenas não o permitiu, sabendo que a dor do desgosto lhe tiraria a voz mais tarde.

- Fizemos tudo o que podíamos ter feito, infelizmente a sua esposa não conseguiu resistir, ela estava muito fraca e perdeu muito sangue durante o parto. Lamento ter que lhe dar esta noticia.

-Não. Ela está viva!

Foi nesse momento que que ficou sem voz. Sem reação. Sem chão. O seu olhar era vazio, assim como se tornara a sua vida devido aquela noticia

- Mas tenho boas noticias... ambas as meninas sobreviveram. Elas são saudáveis e eu sei como se deve sentir neste mome...

-NÃO, SAIA DAQUI IMEDIATAMENTE! SAIA! E LIVRE-SE DESSAS BASTARDAS QUE MATARAM A MINHA MULHER!

A enfermeira olho-o com desprezo e admiração, mas compreendeu. Não é fácil aceitar uma morte de uma pessoa tão próxima, principalmente nestas circunstâncias. A verdade é que estavam duas crianças, que reluziam e iluminavam a sala, duas gémeas lindas, de olhos verdes ainda fechados, colocadas na mesma cama. Tinham acabado de nascer dois anjos em Londres. Com as testas encostadas uma na outra, aqueciam-se com o calor corporal uma da outra. Eram duas meninas lindas, prontas para receber o amor de uma mãe e de um pai, apesar do destino já lhe ter tirado a mãe e lhe dado um pai que não se importa com elas. Pelo menos foi o que deu a parecer.

Finalmente, após vários minutos em choque e em conversa simultânea com um psicólogo, decidiu-se que era o mais acertado a fazer naquelas circunstâncias. Entregar as meninas ao sistema de adoção, mas não em Inglaterra, era muito difícil adotar lá e, apesar de não as querer ver, não queria deixar as suas filhas num orfanato até à idade adulta. Ele não queria isso para elas, a única ligação que restava entre ele e a sua falecida esposa. O mais acertado era o sistema de adoção internacional. No entanto ele tinha uma condição, dar nome às suas filhas, enquanto eram suas.

E assim se sucedeu, as gémeas Jane e Victória ficaram entregues ao sistema. Assim como milhares de crianças estavam, no entanto, a sua sorte era que elas eram recém nascidas, ou seja, havia mais hipóteses de adoção, visto que a maioria das famílias adotivas deseja bebés dos zero aos três anos.

Tudo ocorreu num espaço de horas, no entanto, os processos foram divididos, dando às duas meninas menor tempo de espera, mas o que elas não sabiam era que estava prestes a começar a verdadeira história das suas vidas.

Jane, a pequena Jane, foi levada após 12 horas do seu nascimento. De um berço de palha para um berço de ouro na Austrália.

Após a separação, ecoava um choro inconsolável naquela sala brevemente aquecida por máquinas. Aliás, ecoava por toda a ala neonatal. Enfermeiras tentaram consolar a pequena Victória, mas sem sucesso. Tinha tido o primeiro desgosto da sua vida.

E assim começa a sua história. Trinta horas depois do seu nascimento, Victória foi levada para um lugar ameno, que já não era aquecido por máquinas, mas sim por pessoas. Ao contrário da sua irmã, não caminhava para um berço de ouro, mas sim para um berço um pouco melhor do que o que ela tinha agora.

Um berço cheio de nada, cheio de vazio, deu lugar a uma casa cheia de amor no México. Uma família aguardava cada uma delas, um amor tão imenso que podia aceitar uma menina no seu seio familiar sem ser sangue do seu sangue.

O Amor. Algo tão imenso que magoa sem doer. O fenómeno mais enigmático da natureza. Move montanhas, nada mares, faz chover, nevar, ou até fazer sol. O melhor do amor é que, quando estamos apaixonados, nos faz sentir como se tivesse-mos borboletas dentro de nós.

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⏰ Última atualização: Sep 02, 2017 ⏰

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