Prólogo

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Alex


Era sexta à noite. E, no quarto do hospital, as horas pareciam se arrastar. O remédio fez a dor no meu pescoço passar, mas não me ajudou a dormir. Um turbilhão de pensamentos ocupava minha cabeça e o cansaço tomava conta de mim. Fechei meus olhos, sabendo que a minha mente me faria reviver novamente as lembranças do acidente.

Havia acontecido no caminho de terra batida que levava para a fazenda onde eu morava com o meu pai, quando eu estava voltando da faculdade com a minha moto vermelha.

Eu estava pilotando a moto, quando, de repente, vi-me jogado no chão.

Até hoje eu não me recordo muito bem do que houve, mas algo havia entrado no meu caminho antes que eu fizesse a última curva, bem perto da fazenda. Com um movimento brusco, eu havia tentado desviar, o que acabou fazendo com que o pneu traseiro deslizasse e a moto capotasse até colidir com uma árvore, rente a uma cerca de arame.

O impacto contra o chão me fez sentir uma dor forte no pescoço, sobrecarregado com o peso do capacete, que estava bem preso, evitando que minha cabeça batesse contra o chão.

Mas o motivo do deslize não foi o que ocupou minha mente de imediato, e sim a razão pela qual eu não havia rolado junto com a moto. Nem a minha queda havia sido tão grave quanto deveria ter sido; foi como se a moto estivesse parada, deitada no chão, como se ela simplesmente tivesse tombado – e, inexplicavelmente, rolado – e eu, caído.

Meu capacete fechado foi o que me impossibilitou de ver o que realmente havia ocorrido. Foi como se eu tivesse sido segurado pelas costas ou preso por uma corda.

Eu sei que é loucura. Pode ser que eu esteja mesmo ficando louco ou que tenha batido a cabeça com força. Mas havia, sim, alguém me segurando. Eu pude sentir isso.

No momento, já depois do acidente, deitado em um leito de hospital, minha mente fazia muitas perguntas: como eu caí? Por que não rolei com a moto? Quem me segurou?

Eu sabia que havia sido alguém, eu vi. E, naquela hora, caído no chão de terra batida, tive uma certeza: não havia parado sozinho, alguém havia me segurado, uma mulher com cabelos compridos e avermelhados como o pôr do sol.

Naquele momento, sem dizer nenhuma palavra, seus olhos verdes haviam se fixado nos meus, como se ela quisesse ter certeza de que eu ficaria bem. E, então, ela desapareceu, junto com minha consciência.

***

Fui levado para o acostamento por um senhor de meia-idade com cabelos brancos, Carlos, vizinho de meu pai. Recobrei meus sentidos e o reconheci por causa de sua caminhonete preta. Ele falou, antes que eu pudesse dizer qualquer coisa:

— Você está bem, rapaz? Consegue me ouvir? — Ele parecia bastante preocupado.

— Sim — respondi, atordoado. — Onde está a minha moto? — Com dificuldades, sentei-me na grama, no canto da estrada.

Olhei para os lados para ver se a moça ainda estava lá, mas só estávamos eu e o senhor Carlos, que me encarava assustado. E, do outro lado da estrada, vi meu presente de dezoito anos retorcido, entre uma árvore e arames.

— Ai! Meu pescoço está doendo! — reclamei, levando a mão ao pescoço dolorido.

— Consegue se levantar? — perguntou Carlos, ainda preocupado.

— Acho que sim. Estou bem. Apenas alguns arranhões no braço e essa dor no pescoço. — Fiz uma força enorme para me levantar.

Carlos me colocou no banco do carona da caminhonete e tomou o caminho de volta para a cidade, dizendo que ia me levar ao hospital, o que eu achei um exagero.

— Não precisa se preocupar! Estou bem — eu disse, sem ter muita certeza.

— Se eu te levar para casa assim, seu pai vai te dar uma bronca. É melhor voltar para a cidade e procurar um médico.

Ele acelerou, ansioso e preocupado, enquanto eu segurava o capacete e a mochila, tentando não pensar muito na dor terrível no meu pescoço.

— É... Acho que tive sorte. Parece que não quebrei nenhum osso — comentei.

Confirmei apalpando o braço ferido e as costas doloridas. Carlos olhava fixamente para a estrada.

O Sol já havia ido embora e a noite já estava caindo, sem nem que tivéssemos cruzado a entrada da cidade.

— Sorte? Eu não chamaria isso de sorte! Mas é um milagre que você não tenha sido lançado contra a árvore e a cerca.

— O senhor viu quando caí?

Ele permaneceu em silêncio por um instante, com os olhos fixos na estrada, quando, com calma, me respondeu:

— Sim, vi você apenas escapulir da moto, quando, na verdade, devia ter capotado junto com ela. Parece um milagre você estar inteiro.

Carlos fez ainda mais indagações antes de chegarmos ao hospital. Eu queria questioná-lo sobre a moça que havia atravessado o meu caminho, mas a julgar pelo fato de ele não ter comentado nada sobre isso, supus que ele não a tivesse visto.

Carlos estacionou diante da entrada principal do hospital. Agradeci a ele pela carona, pedi para que levasse as minhas coisas para a minha casa e que informasse o meu pai sobre o que tinha acontecido.

Quando ele se foi, entrei no hospital e me dirigi ao balcão de atendimento. Minutos depois, um enfermeiro me encaminhou para um quarto.

Em menos de uma hora – muito antes do que eu esperava –, quando eu já estava deitado, tomando algum tipo de medicação para aliviar as dores do pescoço, Otávio – meu pai – chegou, com os olhos arregalados.

— Você está bem, Alex? Vim o mais rápido que pude! — exclamou ele, exasperado.

— Estou bem, pai — tentei acalmá-lo.

Então, ele começou o sermão.

— Como pode dizer que está bem, depois de correr como um louco naquela moto, em uma estrada de terra, ainda por cima, capotando em alta velocidade? — Ele estava mesmo furioso.

— Está tudo bem, estou inteiro. Não se preocupe!

— Não me preocupar?! Você viu como ficou a sua moto? Qualquer um que a vir vai pensar que você está partido ao meio.

— Me desculpe! Foi um erro correr tanto — eu admiti, quase sem voz, recostando a cabeça no travesseiro para tentar amenizar a dor do pescoço.

— Foi um erro você ganhar aquela moto. — Ele falava manso, mas com olhar autoritário. Aquilo me dava arrepios. Minha defesa e pedidos de desculpas nunca eram suficientes.

— Está certo, pai, você está certo — sussurrei, só querendo escapar da discussão. Aquela não era uma boa hora para discutir.

— Descanse. Amanhã conversaremos — disse ele gravemente. — O médico disse que você deve ficar aqui esta noite. Venho te buscar pela manhã.

— Está bem. Obrigado.

Ele me encarou e, depois de dar um longo suspiro, declarou:

— Pode não parecer, Alex, mas eu me preocupo com você.

Então, ele saiu do quarto, parecendo cansado, como se carregasse um peso enorme nas costas. Um peso que antes não estava ali, mas que havia surgido com a morte da minha mãe.

Cintilante IOnde histórias criam vida. Descubra agora