Não posso deixar você ir

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STEVE

Acendo meu cigarro, ponho fogo em minha mente. Dou uma longa tragada. A droga me consume, consume meus pensamentos, meu cérebro por completo. É forte é fatal.

Vou em direção a porta da frente onde ao lado está meu skate velho. Saio quase flutuando e antes que o carro da polícia passe por mim respiro profundamente o resto que ainda sobrara no pedaço fino de papel. Prendo o ar, e uma sensação deliciosa de prazer toma conta de tudo. A fumaça que solto forma uma bela nuvem esbranquiçada.

Os últimos anos foram como um sonho, daqueles que te fazem dormir e nunca acordar. Só assim para conseguir suportar a dor que é viver. Puxo o colírio do bolso do meu jeans surrado, arregalo bem os olhos e os aplico uma dose. Os carros com suas sirenes desligadas passam por mim e me cumprimentam, faço uma manobra, um belo rodopio pelo ar, demoro tempo o suficiente para olhar eles pelo retrovisor e levantar em desafio meu dedo do meio. Aterrisso.

Malditos.

Meu caminho é longo, tenho que ir ao limite norte da pequena cidade para chegar no lago. As sombras dos grandes edifícios me escondem, o que é a melhor coisa que eles poderiam fazer por mim.

Chego no prédio abandonado e passo por baixo das vigas que estão grudadas na porta. Enormes tambores estão queimando diesel e aquecendo o clima úmido e frio da cidade. Atravesso o grande salão e várias pessoas me olham. Puxo o capuz para cima de minha cabeça e os cordões para que não caia.

Pulo do skate alguns segundos antes de me deparar com Nina e sua cabeça completamente raspada. Ela me observa, por inteiro. Por fim ela puxa a bandana de sua boca, ela sorri fazendo com que o piercing de seu lábio se estufe para fora. Ela assentiu, pego meu skate e o coloco debaixo do meu braço, atravesso para o fim da pequena sala cujo Nina era a porteira.

- O que você tem hoje para mim? – Pergunto a Paris que estava socando algumas coisas dentro de uma enorme mochila. Ele levanta com sua barriga saltada para fora da camisa.

- Você sabia que drogas fazem mal? – Ele ironiza voltando a expressão para mim.

- Quem morreu para a vida deve ter medo da morte? – Ele sorri e joga em minha direção um enorme embrulho. – Valeu... – Agradeço por entre uma risada.

Abro o pacote e divido em três maços, separo um em cada bolso do meu jeans. Faço o trajeto de volta as ruas, atravesso com o sinal aberto e pedestres na faixa, sem me importar muito com eles, com nada.

Chego em um outro beco e me sento em meu skate. Agarro alguns pedaços finos de papel que encontro pelo chão e encho eles com aquela droga, pego um fosforo e acendo mais um cigarro. Puxo a fumaça até chegar ao máximo, ao limite de expansão do meu diafragma. Prendo toda aquela euforia e aos poucos vou liberando. Inebriando assim mais uma vez meus pensamentos, me mantendo anestesiado e longe da realidade.

Anjos e demônios, tudo junto, sem fim e nem começo, apenas com um de repente. Olho pela penumbra do beco e dou uma longa tragada, provavelmente eu teria medo desse lugar, mas por que temer o que nem sabemos se existe? Se você fechar os olhos, toda aquela agonia do medo se vai, está vendo, não existe o que temer.

Eu temo os humanos, criaturas que machucam, que falam merdas e fazem merdas. Humanos hipócritas de egos elevados, que menosprezam, que querem decidir por um todo. Eu fico pelas sombras das ruas, isso me mantem a salvo do egocentrismo desses idiotas.

Do outro ladoOnde histórias criam vida. Descubra agora