CALLIE
Uma rajada forte de vento assombra a escuridão da noite, fecho lentamente meus olhos afim de divagar meu adormecer, o chegar ao transe do mundo dos sonhos – foi assim que nominei. Mas como sempre, sou arrastada. Tento me prender, segurar firme em algo para não ir, mas uma força mais forte que tudo que já senti me puxa.
É sempre a mesma coisa, nunca é muito claro, é como flashes. Estou correndo em um corredor de uma casa abandonada, com suas paredes caindo, se despedaçando, tento proteger meu corpo das pedras que ora e outra caem. Estou vestida com farrapos desfiados, então de repente fico presa, mas presa a nada, apenas não consigo me mexer, olho atentamente cada detalhe para depois me recordar, então tudo oscila entre uma rua e este lugar, quando outra pessoa subitamente aparece no cenário. Ela vem andando, na verdade é homem, ele anda como se minha presença não fizesse diferença, ou como se realmente não me visse, ele levanta a cabeça coberta por um capuz, mas eu acordo.
Meus lençóis estão suados e quase me afogo neles. Olho para os lados, mas ainda é noite. Deixo acontecer a primeira vez com um pouco de relutância, mas o cansaço do dia não pode mais ser combatido, muito menos vencido, então dá mesma forma, porém bem mais fácil e ágil, o transe me leva a mesma situação.
Desperto.
Minha cabeça chega a latejar, malditos sonhos. Abro os olhos e viro o rosto para o despertador, já é tarde o suficiente. Levanto ligeiramente e me visto. Paro em frente ao espelho para ajeitar meu cabelo preto.
De repente minha mente por livre arbítrio me leva aquela casa que inunda meus sonhos. Tento associar aquele lugar a algum que já vi, mas não me recordo de nenhum. Pessoas normais deveriam sonhar coisas diferentes em suas noites, mas não importa o que eu faça durante o dia ou o que eu esteja pensando, no último ano o mesmo sonho vem se repetindo toda noite, o que me faz repensar a minha ideia de sanidade e de normalidade. Meu celular toca, o que me puxa de volta a realidade.
- Eu juro que já estou indo Otto, é só meu carro que quebrou. – Falo pegando minha mochila e a jogando em minhas costas.
- Você não tem carro Callie, vamos se apresse... – Tento cortar a fala dele, mas ele interrompe a chamada. Saio correndo o mais depressa o possível, vou até o ponto de metrô e por sorte o último vagão ainda tem espaço, vou correndo em direção a ele, mas de repente as portas começam a se fechar e minhas pernas tomam um ritmo jamais alcançado por elas. Quando estou perto da linha de chegada as portas se fecham por completas e o vagão rindo de mim saí andando. Baixo a cabeça e suspiro.
Subo novamente as escadas e vou a pé, correndo.
O sol já estava esquentando levemente o asfalto da cidade, agarro com as duas mãos meu cabelo e dou um nó bem alto. Atravesso a bela selva de pedras, as pessoas me cumprimentavam mesmo com minha arrogância. A cidade estava linda, um ar gracioso pairava por todos.
Puxo meus óculos de sol e os coloco sobre meu rosto, entro de fininho na porta do saguão onde os clientes turistas esperavam. Como sempre divididos em três grupos, vi Lexie com um aglomerado e Armando com outro. O terceiro é meu, fiquei bem na frente da dúzia de pessoas que me observavam surpresos. Olhei disfarçadamente para Otto que estava fazendo uma cara rabugenta, me viro para ele e dou uma piscadinha com meu olho esquerdo.
Explico a plateia a minha frente todo o nosso destino e alguns parecem eufóricos com a rota que temos pela frente. Encaminho todos a porta de saída e vou em direção a Lexie. Minha amiga desde do ensino médio, Lexie é a melhor confidente que eu poderia ter, além de ser tão linda quanto eu, loira de cabelos curtos e bem magra.
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Do outro lado
Mystery / ThrillerUm thriller onde encarar as perdas do passado é mais fácil que enfrentar o futuro, onde atrações se misturam com seu maior terror e onde a vontade de se manter imune aos sentimentos nos leva a fazer o inimaginável, mas isso sempre terá um preço a se...