Até Te Conhecer

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Seis meses, esse era o tempo que eu a conhecia. Ainda me lembro, como se fosse ontem, dela sentada na arquibancada do Ginásio Divino Braga em Belo Horizonte. Eu estava concentrado no jogo que iria começar, era a decisão do terceiro lugar e nós queríamos muito vencer, mas em um rápido olhar para a torcida, eu a vi.

Giulia vestia a camisa do seu time do coração, Cruzeiro, e conversava animadamente com sua amiga. Ela aparentava tão dispersa que não acreditei quando, ao final do jogo, ela me chamou próximo a quadra e disse que era minha fã e queria uma foto comigo. Foi como se o tempo congelasse e eu só soube fazer mais uma coisa além de sorrir, pedir o número dela.

Se eu contasse, para o meu eu de seis meses atrás, que aquela menina de cabelos castanhos era a mulher dos meus sonhos, ele nunca iria acreditar e ainda riria da minha cara. Mesmo tendo que voltar para a Itália no dia após o jogo, eu prometi a mim mesmo que não perderia contato com aquela menina.

Foi assim a minha vida nesses últimos meses. Treino, casa, academia, conversar com aquela que completava os meus dias. A cada conversa no Skype eu sentia que precisava vê-la novamente. Assim, quando descobri que ela estava vindo para a Itália em janeiro, fiz de tudo para encontrá-la. Milão não era tão distante de Trento, então, no meu fim de semana livre, entrei no primeiro ônibus para a "capital" do design.

Ela não imaginava que eu estava ali. Perguntei, como quem não quer nada, o que ela estava fazendo. Ao contar que visitava o parque Sempione, soube para onde deveria ir e não foi muito difícil encontrá-la. Afinal, quem veste um casaco preto, uma boina branca, um cachecol amarelo e preto e anda com uma câmera no pescoço? Uma aluna da Lufa-Lufa? Uma torcedora do Borussia Dortmund? Nada disso, ou um pouco de tudo. Aquela era apenas o jeito de ser de Giulia.

Bella sciarpa. – Falei próximo ao ouvido dela – Mas o que te dedurou foi essa câmera no pescoço. – A morena assustada virou-se rapidamente na minha direção.

– Simo? SIMO! Não acredito que você está aqui! – Giulia me abraçou fortemente.

Aquele cheiro, fazia tanto tempo que sonhava com ele. Pode parecer maluquice, afinal só tinha a visto uma vez na vida, mas aquele cheiro já era característico dela. Afrouxei um pouco o abraço e encarei aqueles olhos castanhos, tão bonitos.

Eu podia ainda não ter certeza, mas foi naquele momento que me apaixonei. Foram as pequenas sutilezas, o franzir do nariz quando ela sorria, as bochechas coradas quando a elogiava, o modo como ela mordia o lábio inferior quando estava nervosa, pequenos detalhes que a faziam única. Até quando discutíamos sobre algo ela continuava encantadora, talvez fosse por esse motivo que eu sempre perdia as discussões.

Uma viagem que rendeu várias fotos, sorrisos e, acima de tudo, muitos momentos marcantes. Em um de nossos passeios pela bela Milão que pude sentir o gosto do seu beijo. O palco desse acontecimento foi o mesmo parque que havíamos nos encontrado pela primeira vez ali na Itália.

Giulia sorria para umas crianças que brincavam no parquinho, próximo ao banco que estávamos sentados. Tomávamos sorvete e, ao olhá-la, vi o canto do seu lábio sujo. Foi a típica cena clichê de filme de romance. Me aproximei para limpar, nossos olhos se encontraram como se fossem imãs e sem que eu percebesse já tinha me aproximado e o foco do meu olhar eram aqueles lábios, que eu desejava há tantos meses.

Infelizmente a viagem chegou ao fim e Giulia precisou voltar ao Brasil. No dia da nossa despedida a surpreendi com um buquê de rosas – sempre critiquei esses romantismos, mas com ela era diferente, eu queria fazer aqueles gestos e muito mais. Aquele momento, que eu queria eternizar e prolongar o máximo que podia, serviu como palco para um pedido, perguntei a ela se queria ser a minha fidanzata.

Os meses foram passando e chegamos ao início dessa história, seis meses que a conheci, três meses que namorávamos. Muitos dos meus amigos falavam que eu era maluco por manter um relacionamento a distância, a um oceano de distância. Mas, o quer seria do amor sem as suas loucuras?

Poderia contar-lhes que tudo ia às mil maravilhas, mas por mais que tentasse manter meu ciúme de lado, toda foto que ela aparecia com um amigo do lado, eu me segurava para não perguntar de quem se tratava. Sabia que aquilo não era saudável, tentando não começar uma briga eu me afastava e, quando vi, já não conversávamos com a mesma frequência.

Nessas horas, eu escutava a voz de meu pai dizendo que eu era muito jovem para namorar tão sério. Não sabia mais como resolver a nossa situação, a cada conversa via uma Giulia mais diferente e fria, podia ser pelas minhas atitudes, tinha deixado de falar com ela em vários momentos para ir a algum treino, jogo, saída com os meninos do time para algum bar. Tudo ainda era muito novo para mim. Minha carreira só estava começando no vôlei e por mais que a quisesse ao meu lado, sabia que aquele não era o nosso momento.

Oito horas da noite no Brasil, estava iniciando uma chamada de vídeo com ela. Por mais que soubesse que estava quebrando o meu coração, eu precisava dar um tempo para nós. Odeio esse termo e por esse motivo iria terminar o nosso relacionamento, pois agora eu não estava dando o meu máximo.

Buonasera, amore mio! – Meu coração apertou ao ver aquele sorriso. Acho que minha expressão estava bem perceptível, pois na mesma hora Giulia parou de sorrir.

– Boa noite, amor! – Dei um suspiro para me acalmar.

– O que você queria falar comigo que era tão importante? – Giulia me perguntou, levantando a sobrancelha esquerda. Acho que ela nunca percebeu que fazia isso quando questionava algo.

– Vou direto ao ponto, porque eu acho que você já tem uma ideia do que se trata. – Giulia respirou fundo do outro lado da tela e já podia ver seus olhos um pouco mais brilhantes devido as lágrimas que acumulavam.

– Sim. – Disse abaixando a cabeça, mas antes pude ver uma lágrima descendo pelo seu belo rosto.

– Por mais que eu te ame, e anote o que estou te dizendo: sempre vou te amar, acho que nosso relacionamento não está dando mais certo. Estamos a um oceano de distância e por mais que tenhamos a melhor das intenções, esse último mês quase não nos falamos, nossas agendas já não se encaixam. – Deixei uma lágrima escorrer e rapidamente passei a mão para limpar.

– Fomos feitos um para o outro, só nos conhecemos no momento errado. Temos apenas 20 anos e muita coisa para viver, nossas carreiras estão só começando e espero, profundamente, que no futuro, se for para ser, nos encontremos de novo. – Suspirei. Giulia ainda não tinha levantando a cabeça, mas a balançava concordando a cada palavra que saia da minha boca.

– Acho que devemos terminar, Giulia. – Dei uma pausa, esperando ela falar alguma coisa – Fala alguma coisa, por favor!

Giulia levantou o rosto e encarou meus olhos, por eles pude ver todo tipo de sentimento, tristeza, amor, raiva, paixão, mas, por fim, ela só balançou a cabeça e desligou a chamada. Ao ver a tela preta não consegui me segurar, chorei de soluçar. Sabia que aquela era a escolha certa para aquele momento, meu coração só precisava entender e aceitar.

Vocabulário:

*Bella sciarpa - Belo cachecol

*Fidanzata - Namorada

*Buonasera, amore mio! - Boa noite, meu amor!

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