1 • Tinta

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Escura como a noite mais densa.

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Era como Dipper Pines gostava de definir a tinta. De fato, era um escritor singular. Escrevia com penas e pergaminhos. É mais real, mais inspirador, dizia ele.
Quem sofria com essa peculiaridade era a galera da editora. Um trabalhão passar toda aquela papelada para o digital.

Dipper gostava também de parar e fazer reflexões sobre as coisas ao redor dele. Daí a história da tinta. Enfim. Estava divagando. Tinha que terminar de se arrumar logo e estava refletindo sobre como refletia. Louco.

Riu. Gostava de conversar consigo mesmo. De alguma forma, dava certa personalidade à própria vida.

Tsc tsc, divagando de novo.

Ajeitou a gravata e guardou a carteira no bolso. Esquivando com dificuldade dos móveis mal distribuídos pelo apartamento, chegou na porta.

Olhou para trás. Poxa, que sensação chata de estar esquecendo algo! Correu os olhos pela sala. Uma garrafa de vinho vazia aqui, um sapato virado acolá… não, talvez fosse só engano, tinha pego tudo o que precisava.

Saiu para a manhã fria. A palestra era as 9:30, naquela livraria que tinha cheiro de pão fresco. Por falar em pão fresco, será que dava tempo de passar na Starbucks e pegar um café?

Tateou o bolso. Cadê a chave do carro?

Bufou. Esquecera no apartamento, é claro.

Meia hora depois, estava saindo apressado da cafeteria com um café puro numa mão e um pão de queijo na outra. Faltavam 10 minutos, e ele não tinha nem comido. A culpa não era sua, obviamente. As chaves do carro, a maleta e o celular decidiram fazer um complô contra ele, se escondendo em momentos inoportunos.

Deixa pra lá. O importante é só chegar na hora. Parou. Que trânsito caótico é esse logo cedo? Não, não, não. Lhe faltava tempo e paciência para lidar com isso. Manobrou e foi cortar caminho por uns atalhos duvidosos que encontrou por ai.

Okay, deu certo. Ufa. Logo estava estacionado no quarteirão da livraria. Como ela se chamava mesmo? Ah sim, Wards! Ou seria Warps?

Saiu do carro deixando seu pão de queijo intacto e foi a passos largos para dentro do edifício.

Um aglomerado de pessoas se encontrava lá dentro. O local não apto a comportar tanta gente junta.

Tudo bem. Já vira casos piores.

Discretamente, tomou seu caminho até o palco montado às pressas. Atrasado 7 minutos. Droga, já fora melhor. Bem, tarde demais para se lamentar.

— Um bom dia, a todos aqui presentes — Ele falou ao microfone. Vários olhares repousavam sobre ele. —Er, antes de qualquer coisa, quero desculpar-me pelo tempo que perderam em decorrência do meu atraso. Meu nome é Mason Dipper Pines, como vocês já devem saber, e hoje eu vou falar sobre…

É, esse falatório sobre o mais novo romance chiclete dele com certeza não vai ser narrado. Podemos deixar isso de lado e seguir em frente? Sim? Sim.

— …agradeço a todos por comparecerem. Irei agora me dirigir à mesa de autógrafos. Organizem uma fila, por favor.

Chegou a tal hora de fazer a mão sangrar. Meh.

Dipper sempre saia dessas sessões de autógrafos com as mãos ardendo, mas lá no fundo,  até gostava.
Ele se inchava de orgulho ao ver que a trilogia que lhe tirou noites e noites de sono finalmente estava desabrochando para o mundo.

Sua irmã iria ter um ataque do coração, de tão feliz que ficaria. Riu discreto, imaginando a cena enquanto assinava o livro de um leitora. Ela tinha os olhos marejados, e não parava de dizer que era uma honra estar ali com ele.

Não o levem a mal, mas ele não suporta esse tipo de fã. Claro, super legal alguém se sentir tão inspirado pelo seu trabalho, mas ela estava histérica, e o catarro escorrendo do nariz não era muito agradável.

E então, como uma refrescante brisa de primavera, a estação que estava por vir, o próximo da fila era o total oposto da fanática. Vinha sereno e tranquilo com o livro em mãos.

— Olá, Pines — Ele sorriu, e por algum motivo Dipper corou.

Mais do que depressa abaixou o olhar para assinar o exemplar que lhe fora entregue. Muito, muito peculiar.
Talvez nem fosse o rostinho do fã, mas tinha algo em sua voz que deixava Dipper encantado. Não era mais um adolescente, e nem estava vivendo um romance fantasioso como em uma de suas histórias. Ainda assim…

— Cheiro bom, de pinheiro — O fã comentou. Sua franja loira cobria um dos olhos, e fazia seu semblante parecer misterioso e convidativo.

— Hmm? — Pines parou de divagar na beleza do outro.

— Seu perfume. Tem um cheiro bom.

Dipper sorriu de volta. — Ah, obrigado! É um Pinetree, da linha Gravity Falls.

— Devia me falar mais sobre essa linha qualquer dia desses, garoto Pinetree — O loiro se debruchou mais do que necessário para pegar o livro. — Eu vou adorar.

Seus olhos cintilavam quando ele sorria. Dipper reparou ao entregar o livro.
Sem que ele pudesse reagir, o outro segurou sua mão e tirou uma caneta do bolso.

Com medo, Dipper tentou retrair o braço. Alguns doidos já tentaram arrancar sangue dele, só para colecionar.
A má notícia é que o loiro tinha uma pegada muito firme, hehehe. A boa notícia é que ele não tentou furá-lo, só escreveu alguma coisa em sua palma.

— Nos vemos em breve?

O escritor presumiu que fosse uma pergunta retórica, visto que logo em seguida o fã foi embora, deixando ele embasbacado com o que acabara de acontecer. Ao olhos de qualquer outra pessoa, nada demais.

Mas ele sentiu borboletas no estômago, e só podia torcer para que isso fosse uma boa coisa.

Apesar de atordoado, ele não teve escolha senão continuar autografando, mas não sem antes espiar a palma da própria mão.

Bill Cipher
+55 11 9XXXXXXXX

INK INK ✾ Billdip [THREE-SHOT]Onde histórias criam vida. Descubra agora