Capitulo Um

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Tudo isso ocorreu à alguns meses, durou algum tempo... Três meses, três longos meses, ah, eu poderia não ter me envolvido, eu poderia ter deixado pra lá, mas agora eu não tenho escolha, seguirei em frente, tentando não olhar para trás, não posso abandoná-la, eu me importo demais para deixá-la sofrer, não posso deixá-la se decepcionar mais, a vida já lhe proporcionou mais sofrimento do que jamais alguém da idade dela deveria passar...

Tudo começou quando trouxe Mary para morar comigo, o apartamento não era nada muito luxuoso, nem mesmo grande, mas ela estava se tornando uma moça, não sairia com Vivian, fazendo bagunça por onde passasse, nem mesmo traria problemas desse gênero.

Vivian, minha irmã mais nova, a minha
pequena, com seus cabelos ruivos, um ar de mocinha, capaz de encantar a qualquer moleques por aí, um amor, um pouco boba, 15 anos, ela ainda tem muito a aprender, não somos filhas do mesmo pai, o que à torna minha meia-irmã, mas isso não tem a menor importância, a amo como parte de mim. Eu fui o fruto de uma traição. Sim, sou a mais velha.

Quando o pai de Vivian descobriu que mamãe o traia, começou a beber, ela engravidou, meu pai cometeu suicídio, e então ela foi perdoada pela traição e cinco anos depois Vivian nasceu, mamãe morreu num acidente de carro e o pai de minha irmã deve estar pedindo dinheiro por aí, dependente de álcool. Sempre achei essas histórias um tanto dramáticas e tediosas, até que aconteceu, diante de mim, e parece que quanto mais você zomba, mais desgraçado se torna.

Mary, nossa prima mais próxima, veio morar conosco um pouco antes de completar seus 12 anos, seu pai era dedicado e carinhoso, sua mãe trabalhava excessivamente, para se manter longe dos problemas durante todo o tempo possível, escondia tudo por trás de uma cara fechada e um mau humor capaz de ser notado a distância.

No entanto, Mary vivenciou todas as discussões violentas, os gritos e as louças se chocando contra as paredes, assim permanecendo alegre todos os dias, ah, ela é encantadora, aquelas bochechas fartas, que te fazem querer implorar por um sorriso a cada minuto, uma flor, sensível e delicada, uma criança...da qual a inocência fora tirada.

Existem dias bons, e existem dias ruins, aquele dia, com certeza, foi um dia terrível. Tio Greg, o pai de Mary, estava sem duvidas, sem mais esperanças, prestes a perder seu pai, mas que droga, por que, as melhores pessoas, aquelas que nos fazem sorrir, têm que partir assim, sem mais nem menos?

Vovô tinha um problema no coração, que por algum motivo sobrecarregou seus rins, ele perdeu os dois, logo descobriram que ele tinha câncer, e não seria possível curá-lo, já estava num estágio avançado. Tio Greg não conseguiu ao menos conversar com Mary, pois Tiffany, aquela maluca insensível, teve um longo dia de trabalho, e estava sob efeito da heroína, gritando sem motivo algum, por conta do dinheiro que ele preferia não dar a ela para comprar bebidas, quando chegou um momento, em que ela ficou impaciente, mais agressiva, correu em direção ao quarto de Mary, querendo agredir cada móvel em que esbarrava, mas Greg nunca permitiria.

Naquela noite, Mary me ligou preocupada, durante a ligação eu pude ouvir todas as expressões de raiva e desespero, Mary estava chorando, sua voz trêmula me implorava para tirá-la de lá, livra-la daquele inferno, tive medo de perdê-la, cada segundo daquela ligação me corroía por dentro, alguns minutos depois houve um silêncio, no mesmo instante, um turbilhão de pensamentos ruins cercaram minha mente, minha respiração diminuía a cada instante, eu precisava pega-la, rápido.

Tiffany entrou no quarto e eu pude ouvir o telefone sendo jogado ao chão, mas não foi desligado, Ela chamava Mary, de uma forma assustadora, tentando parecer amigável, aquelas palavras "não vou machucar você" e "nós iremos apenas conversar"era possível notar claramente em sua voz que estava alterada, eu poderia gargalhar, zombar, ou estar pensando em como aquilo parecia clichê, mas eu só conseguia ter medo. Vivenciar isso é como ir ao dentista pela primeira vez quando se tem uns cinco anos, aquele cara impaciente, que só quer ir pra casa e acender um cigarro, dá um sorriso forçado, pega um instrumento afiado e diz que não vai doer nada, como se a dor fosse refletir antes de ser sentida: "Agora a garotinha confia nele, eu vou ser menos agressiva, e ela vai gritar um pouco menos". Porém, esses sorrisos jamais serão confiáveis.

Onde está minha sanidade?Onde histórias criam vida. Descubra agora