12. O Sabor Amargo da Traição

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Li Ka Hua

— Bàba! — Gritei. Mas só percebi que o havia feito quando minha mãe entrou no quarto, assustada, e sentou ao meu lado na cama segurando as minhas mãos trêmulas.

— Shh... está tudo bem, querida, foi só um pesadelo. — A voz aguda e suave dela entoou as palavras quase como uma canção. — Seu pai ainda está no hotel, mas logo vai chegar em casa, acabou de ligar e está bem. Foi apenas um pesadelo.

Assenti. Àquela altura eu conseguia distinguir os pesadelos das visões. Com tudo que vinha acontecendo ultimamente eu andava muito sensível a tudo, os pesadelos envolvendo meu pai vinham aumentando consideravelmente e nada mais eram que reflexos do meu medo de perdê-lo. Minha mãe acariciou meu rosto delicadamente e eu a abracei, chorando copiosamente de uma maneira que não costumava fazer com ela. Em resposta, seus braços se apertaram em torno do meu corpo e ela não fez perguntas, simplesmente permitiu que eu chorasse até que o medo fosse apaziguado.

Fazia uma semana da tentativa de suicídio de Janet Morgan e sua carta que me apontava como principal culpada pelo ocorrido. Ela faltara aula no dia que cortara os pulsos para dar uma nota exclusiva à impressa a respeito do meu "tratamento privilegiado" no Haimei, fornecendo, inclusive, fotos minhas que foram tiradas sem minha permissão e eu não tinha a menor ideia de quando.

‡‡‡

Uma semana antes...

O barulho das sirenes chamou minha atenção fazendo com que me levantasse e tirasse os fones de ouvido para ver o que estava acontecendo. Era intervalo do almoço e tudo parecia ter corrido tranquilamente no dia, não imaginava o que poderia ter acontecido para... foi então que meus sentidos voltaram ao alerta e me lembrei de Janet Morgan. Senti um gelo subir pela minha espinha, aproximei-me do parapeito do terraço e olhei para a fila de carros que entrava pelos portões do Haimei, uma ambulância, dois carros de polícia e, do prédio, saíam alunos e professores às pressas na direção dos dormitórios. Um enjoo forte me pôs para baixo, encolhi-me no chão e sabia que seria incapaz de comer, as imagens do corpo de Janet vinham à minha mente como um filme de terror, ordenei mentalmente que minha respiração mantivesse o foco, se ela estava mesmo morta como eu vira, as coisas iriam ficar difíceis para mim.

Por um tempo fiquei apenas ali, encolhida, pensando se deveria ligar para o meu pai ou se deveria simplesmente fingir-me de desentendida e chocada, torcendo internamente para que os paramédicos tivessem chegado a tempo, embora eu soubesse que as possibilidades eram muito pequenas. Me surpreendi com o fato de que estava preocupada com Aidan, imaginando o impacto que a notícia teria sobre ele e passei a me censurar por isso, eu não podia me importar com ele, mesmo que quisesse isso, não podia pelo bem de nós dois. Juntei minhas coisas e, relutante, desci as escadas na direção do hall, uma loucura de alunos murmurando por todos os lados, professores com expressões chocadas e preocupadas e, em meio a todo caos, a senhorita Thames tentando manter a ordem nas coisas. Mas em nenhum lugar eu vi Aidan.

— Li Ka Hua — o senhor Sojiru surgiu no meio da multidão, parecia ansioso —, venha comigo.

— O que está acontecendo? — Perguntei enquanto seguia-o para sua sala.

Ele não respondeu até que tivéssemos entrado na sala e ele fechado a porta garantindo que ninguém nos perturbaria. Senti-me momentaneamente desconfortável, mas tentei afastar os pensamentos.

— Já telefonei para o seu pai — disse ele — deve chegar a qualquer momento.

— O que foi? — Insisti. — Foi ela, não foi? Janet...

Olhos Vazios ✔ [REVISANDO]Onde histórias criam vida. Descubra agora