No final das contas, o dia que contei a George que ele seria pai, se concretizou como dia mais confuso, porém melhor, da minha vida até hoje.
Confesso que fiquei de certa forma aliviada por não ter que contar para ele da minha própria boca e extremamente irritada justamente porque não pude contar para ele da minha própria boca.
No tempo em que passamos sentados na escada, ele falou o que eu já imaginava, que se achava muito novo para ser pai – apesar de já ter seus 30 e poucos anos –, que ainda queria curtir muito a vida de solteiro antes de ter um relacionamento sério com alguém etc.
Mas também veio dele a seguinte fala:
- Mas eu vou tentar. Ou melhor, vou conseguir. Eu vou ser um pai presente para essa criança, não importa o que aconteça.
George veio para o Brasil com a mãe depois que ela se separou do marido. Ele cresceu, então, sem a figura paterna e disse que não gostaria que o filho passasse pela mesma situação.
Então, conforme os meses passam, ele se faz mais e mais presente. Tão presente, na verdade, que virou quase o terceiro morador do meu apartamento. Ou quinto, se contarmos o bebê e Nino.
Talvez quem não esteja gostando muito disso é Naná. De acordo com ela, esse tempo que está passando na serra, na casa dos pais, é apenas um retiro espiritual. Não sei quanto ela vai surtar quando formos eu, ela, Nino e um bebê em casa.
George faz questão de bancar a reforma do quarto da criança. Eu disse que era inútil fazer qualquer coisa agora, porque ainda nem sabemos o sexo, mas ele insiste e cá estamos no meio de uma mini obra e alguns pintores.
- Talvez você devesse dormir em um hotel essa semana. – Ele contempla. – Pelo menos até tudo estar limpo e sem esse cheiro insuportável de tinta.
- Você ficou maluco? – Rio. – Não vou ficar em hotel nenhum.
- Então venha para a minha casa.
Meu olhar arregalado denuncia meu espanto. Eu? Na casa de George?
- Eu tenho um quarto de hóspedes. – Ele conclui.
Agora minha barriga já está consideravelmente grande e eu tenho um pouco de dificuldade em me equilibrar quando me estico para pegar os potes de sorvete no alto do armário.
Foi no quarto mês quando eu decidi que, ao menos uma vez na vida, não ia me privar do que eu quisesse comer. Eu estou em um processo de descoberta de um novo corpo e, por incrível que pareça, não ligo quando algumas estrias avermelhadas surgem na base dos meus seios – que, a propósito, estão gigantescos.
George me ajuda a preparar um sundae para nós. Estou enlouquecida por sorvete nas últimas semanas, e hoje ele me trouxe um pote do meu sabor preferido: gianduia trufado com chocolate 70%. Velhos hábitos são difíceis de mudar.
Ele insiste que precisamos sair para escolher o berço. Mas a verdade é que já sei o modelo que quero, mesmo antes de engravidar. Ele não se opõe, só quer comprar o mais rápido possível, e isso me deixa um pouco agoniada.
No escritório, todos sabem que eu e George teremos um filho juntos, mas ninguém ousa fazer qualquer comentário sobre isso. Talvez todos tenham apreço demais por seus empregos para fofocar sobre a vida do chefe.
George queria que eu ficasse em casa, curtindo a gravidez tranquilamente. Mas, bem, ele esquece que sou tinhosa o suficiente para encarar um tribunal lotado de leões do direito, mesmo portando uma senhora barriga. Ele tem é que parar de me subjugar tanto.
Às vezes me sinto como uma leoa, capaz de qualquer coisa que eu realmente queira. Dentro e fora da Corte, e principalmente em relação ao bebezinho dentro de mim.
- Ok, vou arrumar algumas coisas e podemos ir direto para o seu apartamento depois da loja de decoração, já que não faz sentido algum trazer tudo pra cá nessa bagunça.
- Eu estava pensando...
- Não me diga! Você pensa? – Interrompo rindo.
- Deixa de ser boba. – Ele sorri. – Estava pensando se você não quer fazer uma ultrassonografia, dessas cheias de frescura. Ou você está firme nessa ideia de não saber o sexo?
- Estou firme nessa ideia.
- Lela, isso é tão injusto!
George parece uma criança quando joga os braços para cima em derrota e se vira de costas para minha. Ele está louco para saber se teremos a Ana Carolina ou o Philipe – por mais que eu não ame esse nome por causa da forma como é escrito, deixo ele pensar que vamos registrar a criança assim, mesmo sendo uma sentença de bullying por toda a vida escolar dele.
- Eu tenho quase certeza que vai ser menino.
- E se eu souber e não te contar?
- George! – Rio. – Se você souber, a primeira coisa que vai fazer é encher essa casa de presentes e obviamente eu vou descobrir.
Ele me lança um sorriso amarelo e vai até meu quarto, onde eu pedi para que pegasse a mala em cima no meu armário.
Eu e George temos um relacionamento quase estranho. Quer dizer, nós não somos namorados, nem super amigos, nem nada previamente definido pela sociedade. Nós somos apenas... Nós. Nós e nosso mundinho paralelo onde as coisas caminham muito bem, obrigada.
Às vezes acho que ele sai com mulheres quando não está comigo. Mas Naná diz que nunca mais o encontrou em lugar nenhum. E, como ela costuma ir nas mesmas festas que ele, talvez ele tenha realmente sossegado.
De qualquer forma, cá estou eu, arrumando as coisinhas de Nino em uma bolsa enquanto George está sozinho no meu quarto, com livre acesso à minha gaveta de calcinhas e à caixa onde guardo coisas que prefiro que ele não tenha conhecimento.
Mas, quando chego levemente esbaforida no cômodo, ele está sentado na cama, sorrindo para um porta-retrato cuja foto é uma versão mini de mim sendo batizada. Por algum motivo, eu tenho certeza que ele vai ser o melhor e mais babão pai que essa cidade já viu e meu coração transborda.
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E agora? [COMPLETO]
Short StoryManoela Mancini é uma advogada de sucesso. No auge dos seus 25 anos, conquistou um papel importante em um dos principais escritórios da cidade, mas uma noite inesperada com seu chefe, um dos solteiros mais cobiçados do momento, pode por tudo a perde...