O que levaria alguém a perambular às cinco e meia da manhã pelos corredores gelados de um castelo quando poderia estar numa cama aquecida? Eduardo queria muito saber o motivo. Não lembrava de ter acordado, nem de te saído do seu quarto e só para ser um pouco realista, para variar, tinha quase certeza de estar sonhando.
Quase?
Nunca fora o suficiente, nunca poderia ser, não para ele...
Quase era um estado de espírito que pessoas comuns utilizavam para sentirem-se melhor por não estarem seguras dos resultados das ações realizadas.
O herdeiro dos sonhos nunca desfrutaria da liberdade da dúvida
Estar em dúvida se estava num sonho já era algo que Edu deveria comemorar muito! Muito mesmo.
Só que não sentia vontade nenhuma e para falar a verdade estava com um pouco de medo.
Eduardo sabia que sonhos nunca são parques de diversões, especialmente os vindos sem nenhum esforço, contra sua vontade. Ate os mais simples podem trazer mensagens importantes. Se Edu quisesse ter alguma esperança de desvendá-las, teria que por em prática anos de ensinamentos.
Pressupondo que ainda recordava de algum...
Parou então bruscamente, procurando extrair informação sobre o ambiente. Esta era a primeira lição de um sonhador. Disso não podia se esquecer jamais.
Via um salão retangular utilizado para refeições informais com alguns pequenos braseiros espalhados fornecendo calor a ninguém em particular.
Havia comida exalando fumaça em tigelas intocadas postas sobre uma grande mesa de madeira. Os blocos de pedra que formavam as paredes ainda eram frios ao seu toque, o calor dos braseiros ainda queimava seus dedos, os objetos que seus olhos encontravam apresentavam padrões idênticos aos guardados na sua memória.
Tudo isso não queria dizer nada!
Os sonhos são feitos pelas percepções que temos da realidade. Se acreditamos que o fogo é frio, vamos sentir-lo assim; Se pensamos que a neve queima como lava, ela queimará, de modo que não se pode identificar um sonho pelas suas lembranças, com algumas leves exceções.
Eduardo conhecia bem essa sala, a mesma onde conversara com sua mãe, com Mestre Arco e com Maria na noite passada. A mesma onde havia quebrado uma das pernas da poltrona por inclina-la para trás e para frente, um velho hábito de criança que o ajudava a passar o tempo.
A poltrona permanecia quebrada no chão no mesmo lugar que Edu a havia deixado antes de ir dormir. Isso acontecia por que sua mente projetava a última lembrança que tinha do objeto, ou seja, quebrada num canto qualquer.
Só que apesar de Edu não te solicitado ninguém para conserta-la, conhecia bem a eficiência de seus funcionários. Sua casa não teria tantas coisas centenárias se não houvesse bons marceneiros por perto. Logo um dos servos a encontraria e cuidaria de manda-la ao reparo o mais rápido possível, de modo que ela não demoraria muitas horas para retornar nova em folha, como quando foi construída a quinhentos anos atrás.
Com certeza Edu estava num sonho
– Um bom sonhador nunca se limita a apenas um sinal, dizia com frequência seu pai.
Muito bem, pensou Eduardo, presumindo que ele era esse bom sonhador, Caso ignorasse a poltrona, ainda havia outro sinal claro que não estava no mundo real: as passagens estavam escuras, vazias, mortas, as poucas luzes viam de fragmentos de pedra Lis, conhecidas também como rochas luminescentes.
– Tudo isso estava muito errado, todo lugar deveria está fervilhando de serviçais, representando suas ultimas lembranças da realidade.
E é ai que entrava a segunda lição de um sonhador
As lembranças serviam de base para construção do cenário do sonho do mesmo modo que eventos incomuns. No geral é como uma moeda de duas fáceis, elas são completamente diferentes entre si mais as duas juntas contribuem para sua forma final.
No caso de Eduardo a falta de pessoais é o fator que contraria a realidade.
De cara não gostou desse começo, mais continuou andando, adentrando os caminhos escuros desejando encontrar-los tão seguros quanto suas antigas lembranças. Os fatores podem aumentar a medida que o sonhador se aprofunde no enredo. Independente do que aparecesse, ele estava na sua casa e não deixaria que seu primeiro sonho o traumatizasse.
Pena que agir não fosse tão fácil quanto dizer.
O coração de Eduardo estava mais acelerado que de costume, as pernas teimosas, leves calafrios o mantinham tanto alerta quanto desconfortável e o ar gelado não ajudava em nada. Talvez a velha sensação de sentir-se congelar fosse culpa das suas roupas: vestes finas em seda prata sobre um conjunto de puro algodão ou talvez o outono tivesse pensando ser inverno, as vezes acontecia dessas coisas.
Ao ler a temperatura em seu termômetro de bolso quase acreditou que estivesse desregulado.
– Três graus negativos...
– Que merda!
Cada inverno rigoroso era problemático nas terras altas, requerendo estoques abundantes de lenha, tecido, mantimentos e abrigos para a crescente população carente. Quanto mais frio, mais dessas coisas ele era obrigado a providenciar o quanto antes caso não quisesse perder metade da população para o inverno.
Eduardo não viu outra opção a não ser continuar andando em meio ao frio e se entregar ao destino, desejando que as Aves fossem misericordiosas.
Havia chegado o momento de procurar os significados daquilo que o envolvia. Não lembrava exatamente quando o sonho começou, nem por onde já havia passado com exceção do salão. O que o levava a analisar a passagem do tempo.
– Mal sinal, O tempo sempre era complexo. Contudo, na situação em que se encontrava, complexo era o mínimo que poderia esperar.
Independente do cenário projetado, teria que conseguir. O fracasso não é uma opção para o Herdeiro dos sonhos.
Movido por uma chama interior, olhou todos os corredores, salões, e dormitórios num intervalo de piscar de olhos e quando não encontrou ninguém decidiu ir a cidade.
Num tempo que pareceu ser uma eternidade, saiu da edificação, chegando à praça central da cidade. Tudo parecia no mesmo lugar desde que esteve ali, com exceção das pessoas.
Não havia nem uma.
E do silêncio,
Edu não escutava mais nada além das fortes batidas do seu coração.
Que significado teria isto?
Como a segunda maior cidade das Aves poderia está vazia?
Desesperado correu gritando, batendo nas portas das residências próximas, procurando qualquer um. Não demorou a ficar sem fôlego, e ainda assim continuou por mais alguns instantes ate se da conta que precisava parar para respirar.
Enquanto arquejava por ar, se deu conta que estava numa cidade fantasma e que precisava encontrar o significado para este aspecto.
A olhar seu relógio novamente, leu cinco e meia da manhã, o que seria impossível, ele teria gasto pelo menos uma hora para percorrer todo o caminho que trilhou ate ali, precisava de outra referência e pelo menos uma vez na vida a encontrou fácil.
A Torre do Relógio podia ser vista com facilidade de qualquer ponto da cidade, transmitindo um horário fiel a todos os interessados. Edu quis acreditar que ele também poderia ter congelado quando leu a mesma hora. Sabia, entretanto, que não estava frio o bastante.
Esse aspecto trazia consigo outro significado.
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O Herdeiro dos Sonhos
FantasyEduardo vive o drama de ser um Herdeiro dos Sonhos que nunca sonhou uma só vez na vida. Chateado, tentava lidar da melhor maneira com as responsabilidades inerentes ao cargo sem sentir-se realmente satisfeito com seu desempenho. Num dia comum de ou...