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O bombeiro queria ficar sozinho no escuro com a mulher. Era o único presente que ele esperava. A vela perdia força aos poucos, o pavio passando do amarelo para o laranja, tombando em si, fechando-se numa curva delicada. Dos salgadinhos e cervejas sobraram lembranças pelo chão, que se espalharam mais com as pessoas que iam embora.

Os últimos casais de amigos saíram, por fim, e arrastaram o bombeiro junto. Foram até o elevador na falação descompassada regada a álcool. Alguns abraços no anfitrião e carreatas de palavras recitadas em voz alta pela espontaneidade do momento. "Saúde, bombeiro." "Felicidade." "Obrigado." "Tchau."

Os presentes ganhos foram poucos, valeu foi a intenção da festa surpresa; e ainda, a garota que continuava no canto da sala. Esperando.

Ficou calmo no apartamento; luzes, enfim, apagadas e o candelabro em bronze no banco, ainda queimando o pavio da vela decorativa numa preguiça ondulante, enquanto a última garrafa de vinho diminuía aos poucos. Restavam poucos goles.

— Gato — a parceira alisou o bico da garrafa e sentou-se no sofá —, sobrou só eu, você e o resto do vinho.

— Ótimo — ele ajeitou os presentes numa cesta e a colocou em cima do fogão.

— Toma cuidado, o pessoal teve o maior carinho pra fazer os embrulhos.

Ele finalizou a taça e deu uma ajeitada nos embrulhos.

— Tá tudo arrumado, relaxa. — Levantou um pouco a camisa, deixando o dourado do cinto vermelho refletir a vela. — Olha o que eu tenho pra você — subiu mais, brincou com a fivela.

— O cinto só? — ela balançou a cabeça. — Isso não dá nada. Eu quero um bombeiro de farda completa. Fiquei sabendo que hoje ia ter um strip por aqui.

Ele estudou a cozinha conjugada com a sala, absorvendo cada detalhe de bagunça deixada pelo aniversário, sentindo os odores da noite, as sensações do momento; mas sempre com o foco na garota. Os poucos segundos a sós foram o suficiente para iniciar a festa particular que ambos esperavam.

— O strip só começa quando os convidados vão embora, é exclusivo. Ou quer chamar mais alguém?

— Não. É tudo meu — ela seduziu. — Mas tem um lance: você só ganha o meu presente se eu gostar da sua performance.

— Então é assim? — ele aliviou o cinto, tirou a camisa, deixou-a cair. Olhou ao redor, brincando com o momento, criando uma fantasia que, para ele, era sempre algo especial; para ela, poderia ser qualquer coisa, desde que ela fosse a peça fantasiada na mente de ambos.

— Você me quer, bombeiro? — apertou a garrafa entre as pernas, correndo o dorso da mão de cima a baixo. A mulher sabia se portar, entendia o efeito que causava no outro. Isso a excitava.

— Fique aí — ele correu para o quarto. Mexeu no armário. Bateu a porta. Puxou uma gaveta. Voltou usando uma farda e trazendo um embrulho nas mãos; a bota engraxada refletiu feito o fundo de uma concha de alumínio. O salto estralando no azulejo.

— Aí sim, bombeirão — ela jogou o queixo para o lado, encurtando as sobrancelhas. — Vem aqui.

— Espera, olha essa surpresa — ele mostrou o embrulho. Tirou o candelabro do banco e pousou a surpresa no lugar, com cuidado para não apagar a chama. Ajeitou o objeto sobre o fogão, ao lado dos presentes.

A vela iluminou ao nível do encosto do sofá, deixando o olhar da mulher mais evidente; o lápis nos olhos ganhou forma ao se mesclar com a sombra, alastrando-se pela lateral do rosto, revelando pontos brilhantes de glitter. Um rastro de estrelas. Linhas suaves de expressão sobre o lábio reuniam audácia e experiência numa sensualidade controlada, indo e vindo com a respiração dela, alcançando o parceiro, para, então, suavizar-se numa postura enigmática.

O bombeiro apaixonadoOnde histórias criam vida. Descubra agora