Divagações de uma submissa

Pressa

Minha avó já dizia: " a pressa é inimiga da perfeição"! Também ouvi muito um outro ditado que ela dizia: "o apressado come cru e quente"!

Embora antigos servem perfeitamente para ilustrar minha divagação de hoje: A pressa

A pressa em conhecer um Dominador, a pressa de "se tornar uma submissa", ter sessão e em botar uma coleira.

Já mencionei de passagem algo relacionado a isso no capítulo que falo sobre Negociação & Confiança, mas agora gostaria de divagar mais especificamente sobre o assunto.

Percebo que a pressa é algo bastante comum a quem está interessado em fazer parte do universo BDSM. Mais comum do que deveria acho eu. Mais comum do que é sensato. Mais comum do que é seguro.

A impressão que tenho é que as pessoas passam sua vida toda sendo baunilhas (os que não são BDSM) e que de repente dá um estalo e querem "se tornar" BDSMer a todo custo do dia pra noite, tipo "tirando a barriga da miséria" ?

A meu ver essa é a fórmula para o fracasso e talvez seja uma das principais razões pelas quais tanta gente abandona esse modo de vida desanimados e decepcionados, não muito tempo depois de ingressar.

A outra razão é achar que tudo em uma relação D/s é maravilhoso. Que é só prazer! Só festa, só oba-oba.

Desculpem-me por desapontá-los mas não é só isso não.

O BDSM propicia experiências maravilhosas, grandiosas, apaixonantes, viciantes..... mas nem tudo são flores.... Nesse caminho iremos encontrar flores maravilhosas, mas também muitas pedras e espinhos.

Pra início de conversa é preciso antes de qualquer coisa ter um conhecimento mais profundo de si mesmo, às vezes percebendo coisas que passavam desapercebidas, outras vezes provocando mudanças no modo de ver a si mesmo, causando espanto, provocando uma saída da zona de conforto rumo à um destino incerto.

Incerto porque não há garantias. Aliás a vida não nos dá nenhuma, independente do modo que escolhemos vivê-la.

É preciso também conhecer o máximo possível sobre esse universo que queremos adentrar. Ler artigos sérios, frequentar debates, conversar com pessoas do meio, ler livros, perguntar, questionar. Conhecer as práticas - na teoria, antes de se aventurar na real.

Conversar com submissas e com Dominadores que já tenham submissas, pegar sempre mais de uma opinião sobre o mesmo tema. Observar. Desconfiar. Sim, desconfiar! Não é porque é BDSM que não vamos encontrar pessoas mal-intencionadas. Elas existem em todo lugar.

Frequentar sites confiáveis e mesmo nestes ter o máximo de cuidado, sondar o ambiente, fazer amizade, jogar conversa fora, antes de se aventurar no privado, em um encontro ou em uma sessão.

Sempre pode haver pseudo-dominadores à espreita de quem é recém-chegado. Portanto todo cuidado é pouco. Já ouvi falar de "n" casos de submissas ou pretendentes a submissas, que se deixaram enganar, as que tiveram sorte, perderam apenas o tempo, outras tiveram fotos divulgadas, foram ameaçadas ou foram agredidas.

Idade não é garantia de imunidade, mas como ingressar nesse universo se praticamente ainda não se iniciou a vida baú ? Quais as referências que se tem? Quais os parâmetros de comparação?

Quando se é muito jovem e inexperiente não houve tempo ainda de construir essas referências e parâmetros. Como distinguir BDSM de abuso seja ele físico ou psicológico, sem conhecimento do mundo e de si próprio ?

Muitas vezes as pessoas são apenas fetichistas, gostam de um sexo mais apimentado e acabam confundindo um pouco. As vezes vão em busca do que não tem em casa achando que o BDSM é o caminho, é a salvação.

As vezes viram um vídeo ou leram um conto, ficaram excitadas, gostaram, gozaram e acham
Que descobriram a verdadeira "vocação". Mas não é bem assim. Não é porque gostaram de ver um vídeo de spanking que irão gostar de apanhar! Não é porque leram um conto sobre um romance BDSM que vão gostar de servir à um Dono. Ser controlada por ele. Obedecer a ele. Ser castigada por ele. Ficar sem sentar por ele. Deixar de ir para a balada por ele. Ser usada por ele.

Mas como fazer essas distinções ? Não é fácil e não é do dia pra noite que vai se ter essa resposta. É necessário TEMPO. Não ter pressa.

É necessário experimentar na prática?

Sim, é!

Mas não de imediato, não com a primeira pessoa que chegar dizendo ser Dominante. Não sem antes estudar, ler, debater sobre as muitas faces, liturgias e práticas do BDSM.

Usar sabiamente o período chamado negociação. Sem pressa. Discutir tudo. Falar francamente sobre tudo. A negociação é o namoro. Ele será um gentleman. Você será um doce. Vale a pena aproveitar ao máximo.

Acreditem eu sei que vai dar uma vontade louca de sair correndo na primeira oportunidade para se ter uma sessão e botar uma coleira no pescoço.

Um Dominador autêntico não vai ter pressa em te levar pra cama e fazer sexo com você. Ele não quer sexo, apenas sexo. Sexo ele pode encontrar facilmente por aí e você também eu presumo.

Se o Dominador for sério, ele vai te conter. Vai se segurar e "te segurar". Se vocês se conhecem há pouco tempo ele não vai logo de cara exigir que você o chame de Meu Senhor ou Meu Dono.

Ele não vai mandar você ficar nua pelo skype.

Ele não vai te chamar de cadela, se mal se conhecem.

Ele não vai te amarrar numa primeira sessão.

Ele não vai para uma sessão sem haver acordado uma safeword (palavra de segurança).

Ele não vai te colocar em risco. Nenhum risco.

Isso, se ele for sério. Mas e se não for? Com quem você poderá contar ?

Você só poderá contar com você mesma!

Por isso a necessidade de não ter pressa. De muito autoconhecimento, de conhecimento do mundo e do BDSM.

Tempo. Paciência. Muito tempo. Muita calma.

Sempre.