Capítulo 01: Rock'n'Roll Star (Oasis)

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Era 1999 e o rádio ainda era um dos principais meios de comunicação. As ruas de Vila Legal, cidade interiorista com clima de capital, ostentavam belíssimas árvores seculares e cartazes gastos de bandas de rock naquela manhã de quarta-feira. O dia aparentava ser tão comum quanto os outros para Adrian, que acordara resmungando com seu despertador.

Os mais idosos liam jornais enquanto nosso protagonista e sua bike seguiam para a Cine Vídeo, locadora de filmes e único lugar onde fãs de cinema podiam ter acesso à lançamentos naquele lugar do Brasil – que, olha a coincidência, também era seu local de trabalho.

Adrian refletia com certo desgosto sobre o longo café da manhã que teve com sua mãe. Para ele, era difícil imaginá-la com toda a libido sexual que emanava das piadinhas feitas sobre o encontro que ela teve com Patrício da Bodega, o "homem mais desejado do bairro". Pelo menos, ele concluiu, era melhor que ouvi-la narrar sexo entre cachorros na hora do almoço.

Preso em seus pensamentos e na música que vinha de seu walkman, o rapaz preparava o estabelecimento para recepcionar seus visitantes: colocar os pôsteres para fora era a parte mais entediante, porém, depois de suar um pouquinho, ele teria tempo para assistir qualquer filme que quisesse – e de graça. E tudo que ele queria naquela manhã era testar se ainda lembrava dos diálogos de A Revanche dos Mortos-Vivos, de Pierre B. Reinhard.

Quartas-feiras, em peso, são dias de pouco movimento em locadoras – nada, afinal, se compara ao fim de semana e sua política de "Leve no Sábado, Devolva na Segunda" – mas, naquele dia tão rotineiro, seu professor favorito dos tempos de escola veio em busca de um filme para assistir com os alunos.

- Regis, há quanto tempo! Que prazer te ver por aqui rapaz – disse Adrian, visivelmente contente com a visita.

- Adrian, meu aluno preferido. Espero que trabalhando aqui consiga alimentar sua sede de cinema – ele respondeu, lembrando-se do quanto o rapaz se empolgava nos dias de aula que ele trazia filmes. – Gostaria de trabalhar estereótipos na aula de filosofia mais tarde, e não sei qual seria a melhor fita para dialogar com os jovens. O que me recomendas?

- Muito fácil. Leva o Clube dos Cinco. John Hughes trabalha exatamente isso a partir de um encontro entre cinco adolescentes de personalidades distintas. É um dos meus favoritos, e tenho certeza que os alunos irão gostar.

Assim, após uma breve conversa sobre o Brat Pack e curiosidades semelhantes, Adrian realizara a primeira locação do dia e retornava para seu cantinho de frente à TV. Em sua cabeça, enquanto ocupava os olhos com uma das zumbis arrancando violentamente o pênis de alguém com a boca, memórias contínuas dos "tempos de escola" o mergulhavam numa violenta sessão de nostalgia: amigos que já não vê há alguns anos, aulas incríveis e Laís, seu primeiro grande amor.

Talvez seja cedo para falar mais de Laís, mas preciso dizer que de todas as pessoas pelas quais Adrian já se apaixonou, por ela seu coração ainda bate forte até hoje. É difícil colocar em palavras o que ele sentiu quando ela ganhou bolsa para estudar na capital e foi embora. De um lado, estava feliz por saber que a garota estaria realizando o sonho de estudar o que mais gostava na vida num lugar onde as oportunidades apareciam como mágica, de outro era difícil digerir a saudade (e o fato de que nunca teve coragem de lhe dizer "eu te amo").

O filme acabou e, vendo a hora, ligou o rádio para ouvir o programa de sua eterna amada na Princesa FM. Cale a Boca e Escute havia estreado há mais ou menos três semanas, mas já era preferência entre toda uma faixa etária que transformava o centro de Vila Legal numa das cenas musicais mais incríveis dos anos noventa.

1999 (versão revisada)Where stories live. Discover now