- Léo, querido – disse Drika – pega uma cerveja no bar para mim? Isso aqui tá muito quente!
O rapaz assentiu, solícito.
- Namorados são como assistentes particulares – ela comentou, sorrindo.
Drika era o tipo de pessoa que não deixava muita coisa passar despercebida de seu radar. Sendo assim, não demorou muito para ler a expressão facial de Adrian após ver Laís chegar próximo do palco.
- Você ainda gosta dela, não é?
- Hã, de quem? Da Laís? Prefiro me afastar dos "fantasmas do passado"...
Ninguém é burro de acreditar nessa lorota.
- Ah, qual é – Drika respondeu – Todo mundo sabe que você ainda gosta dela. É tipo Ross e Rachel naquela série, Friends. Se ela dissesse que estava afim, estou certa de que você chegava nela mais rápido que coelho fornicando.
- Voltei, o que está pegando? – Perguntou Leonardo, segurando dois copos gigantescos de cerveja barata.
- Nosso amigo Adrian está tentando me convencer de que ele já não sente mais nada pela Laís...
- Qual é cara, corta esse papo furado. Todo mundo sabe que ela é sua lagosta!
E, pela primeira vez na história da humanidade, Adrian parecia confuso com uma referência à produto cultural.
- Sério que você nunca assistiu Friends na TV Manchete? – Perguntou Mari, entrando de surpresa na conversa.
- Friends? - Retrucou Fernando, aproveitando um oportuno intervalinho no meio do set das Hex Girls para socializar. – Prefiro Três é Demais.
Ao ouvir essa afirmação, todos da mesa começaram a jogar bolinhas de guardanapo e canudo no colega. Era como se estivessem numa cafeteria de escola americana, e Adrian sentiu a vergonha alheia arder em seu interior por sentir que estava dividindo a mesa com as crianças perdidas do elenco de Chiquititas.
- Pessoal, menos. Bem menos. Quase nada – ele respondeu, tentando amenizar a situação. – E eu ainda não entendi o que é essa porra de lagosta. Alguém se importa em explicar?
- Bom, segundo a Phoebe todo mundo, menos o idiota do Adrian, sabe que lagostas se apaixonam e ficam juntas para sempre. E dá para ver casais de lagostas velhinhas nos aquários dando as patinhas...
Houve uma salva de palmas para Mari pela explicação dada. No palco, Fernanda concluía uma rápida checagem de som e estava prestes a anunciar o retorno da Hex Girls. Ficou feliz, pois pensou que os elogios gesticulares eram voltados para a banda. Decidiu não anunciar retorno e se jogar de vez numa canção chamada Crack the Liar's Smile.
I'm using life
It's true, I don't mind if you leave
You're fated, I'm always relieved
I hope you understood the words unsaid
So many rooms inside my head
- Bom, agora é uma boa hora de ir lá falar com a tua lagosta, garotão – disse Fernando. – Aproveita a multidão e se joga!
- Mas pessoal, eu sou péssimo nessas coisas. Lembram do que rolou no show do Raimundos?
Todos emitem, no momento, uma onomatopeia de surpresa desagradável pela lembrança.
- Cara – respondeu Drika – manda esses traumas antigos para a merda e só vai. Se joga logo nessa porra aí antes que a oportunidade passe e você se arrependa.
As mãos de Adrian já estavam molhadas só de pensar em se aproximar de Laís. "Já se passaram mais de 500 palavras desde que o capítulo começou", ele pensava. "O leitor já deve estar morrendo de ansiedade para ver o desenrolar da história".
Havia muitas pessoas no meio do caminho e foi um pouco difícil abrir espaço em meio a tanta gente fazendo movimentos absurdos. Porém, depois de muito esforço, ele conseguiu chegar perto de Laís. Respirou fundo antes de... bem... cutuca-la.
Não foi uma abordagem muito sensata.
- Mas gente, vamos só curtir o show das H... AI MEU DEUS DO CÉU, Adrian! Puta merda, não acredito que seja você! Nossa senhora dos amigos de infância, que reencontro irado e inesperado!
Adrian sentiu-se mais tranquilo ao ver o quanto Laís estava genuinamente animada em reencontrá-lo. Não era necessariamente uma certeza acerca do "grande questionamento de todos os tempos", porém qualquer sinal que fosse mais positivo que as esperanças para o ano 2000 ajudava bastante.
- Antes de mais nada, gostaria de dizer uma coisa...
- Quê? Não estou conseguindo ouvir direito. Vamos dar um pulo lá fora!
Então os dois seguiram em direção à saída do Mamba Negra. No caminho, Leonardo, Drika e todos na mesa fizeram um gesto que, para Adrian, era muito estranho e gesticularam "ela é sua lagosta" com a boca. Ele não entendeu o que eles quiseram dizer, porque era péssimo em leitura labial e ainda não tinha assistido esse tal de Friends.
-
Apesar de ser uma noite de quarta-feira numa cidade pequena, a praça estava incrivelmente movimentada e cheia de jovens. O vento tornava o clima bastante agradável mesmo com o barulho mínimo, porém incômodo, de mosquitos que se acumulavam perto de todas as lâmpadas de postes.
- Todos esses anos fora, mas parece que pouca coisa mudou por aqui – dizia Laís, enquanto ambos se sentiam aconchegados pelo vento frio de Vila Legal. Sentaram-se num banco próximo à Igreja e não demorou para que a conversa se transformasse em lembranças do passado.
- Lembra de quando a gente saiu correndo pelo pátio da escola, tomando banho de chuva e fazendo juras de amizade com a Marilia, o Jean, o Ramon e a Dayse? Por onde será que eles andam? – Questionou Adrian.
- Como esquecer a cara de susto do Ramon quando viu que a chuva ia levando embora o chinelo que ele estava usando? – Lais responde em meio a risos – Não sei... eles estudam em outras cidades, né? Nunca recebi carta nem telefonema desde que o Colegial acabou.
- Uma pena. Adoraria participar de um reencontro da turma. A escola não foi exatamente o melhor período da minha vida, mas as vezes olho para trás e penso no quanto tudo parecia mais fácil.
- Sim. Parece que alguém simplesmente veio de surpresa e colocou o mundo em nossas costas e cada ano que passa ele pesa mais... crescer deveria ser legal e fácil de gerenciar.
- Como nos filmes, sabe? Sempre tem aquele momento em que está tudo bem, depois o grande conflito, depois o final feliz.
- Mas viver é isso – continua Laís – São vários finais felizes e vários momentos de conflitos que passam a constituir nossa história. Sei que, não importa o quanto haja esperança para os anos dois mil, não vamos mudar muita coisa. O conflito de bem e mal sempre existirá. Mas acho que deveríamos aprender a sorrir apesar disso.
- E a tentar fazer a diferença também – conclui Adrian. – Bom, acho que uma viagem à terra da nostalgia não estaria completa sem uma ida ao Amangaô. O que acha de um sorvetinho de chiclete com menta em nome dos velhos tempos? Eu pago!
- Querido, o ano é 1999 – responde Laís – Sou uma mulher trabalhadora. Eu pago.
Adrian e Laís continuaram engajados naquela conversa filosófica até a dona da sorveteria cansar de esperar que eles fossem embora voluntariamente e lhes informar que já passara da meia-noite e era hora de fechar.
Ela então decidiu perguntar se Adrian não tinha interesse em acompanha-la até sua casa. No caminho, iniciaram um debate louco sobre o Bug do Milênio e o suposto OVNI avistado em 1995 durante um festival de música de Vila Legal.
- Acho essa história meio boba, mas daria um ótimo filme – disse Adrian – Sabe? Com alienígenas invadindo o planeta e explodindo tudo.
- Parceiro, você precisa conhecer Marte Ataca!
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1999 (versão revisada)
FantasyVersão revisada, revista e com muitas alterações de 1999, meu grande amorzinho que já entrou até no ranking do WattPad <3 Adrian é um balconista de locadora e fã de filmes de terror que reside em Alta Granada, uma cidadezinha de interior que é be...