Marisa saiu de sua banheira enrolada em uma de suas macias toalhas turcas em direção ao seu quarto, para terminar de se secar e se vestir. O cômodo em que dormia era enorme, redondo, uma maravilha da arquitetura, com duas colunas gregas desenhadas com fios de ouro e prata de cima à baixo.
A empresária da moda sentou-se em sua cama de lençóis de seda inteiramente nua para apreciar seu corpo ao espelho. Tinha formosas curvas sem trabalho, trabalho apenas de seus cirurgiões plásticos dos mais diversos lugares de mundo. A empresária da moda passeava com suas mãos por todo seu corpo. Se achava tão linda que podia ter uma bela noite de amor com ela mesma. Se pudesse entrar no espelho e beijar a mulher a sua frente, ela faria.
Depois de ficar um bom tempo praticando aquela meditação narcísica, deu início ao difícil trabalho de se vestir. Via em seu armário: peles de lobo, de chinchila, de leão e cintos com fivelas banhadas a ouro, mas Marisa gostava mais das que eram puramente ouro, que eram pesadas e, as vezes, machucavam a cintura, mas chamavam muito mais atenção da imprensa. Assim como gostava. Como para onde iria estaria frio, decidiu pegar um desses seus casacos de pele. Tirou cada um para testar em frente ao seu espelho como ficariam naquele momento. Foi lá pela oitava prova que percebeu que seus gostos deviam ter mudado durante o verão. Não estava contente com nada.
Tirou mais algumas coisas do armário e jogou sobre a cama, vendo que não havia mais nada de novo desde o ano passado, mas não se desesperou, tinha ainda tempo para sair de casa e para chegar ao desfile. Veio a idéia de chamar Cláudia, sua estilista que, com certeza, ia ter o molde de uma boa peça de seu tamanho, original e o melhor de tudo: ia estar rapidamente pronta para entregarem-na. De seu celular, ligou para seu mordomo: Augusto.
Augusto vinha andando a passos largos depois de ouvir ao chamado de Marisa para ir ao seu quarto. Quando chegou, o criado se posicionou para ouvi-la:
- Augusto, ligue para Cláudia, é a primeira da lista dos contatos. Diga que me arranje um cassaco novo para hoje a noite. Não diga que estou sem, diga que deixei os meus da nova coleção na minha casa de praia em Malibu e que não tenho tempo de pegar um jato pra lá e buscar. Diga também, de preferência, que o casaco seja com pele de veado, ela sabe que estará de volta à moda esse ano.
- Claro. Avisarei agora mesmo!- Assentiu o mordomo.
- Diga que não demore. De preferência, que esteja em mãos no máximo em 3 horas. Vou me encontrar com alguém antes de ir ao desfile, mas ainda vou estar aqui.
Quando o mordomo saiu, pôs uma roupa mais modesta para ficar em casa e erminou de passar a maquiagem. Fez tudo isso enquanto, como sempre, tocava a rapsódia turca de Lizst, que a dava ânimo para receber seu convidado ali em sua residência em Frankfurt e encarar os críticos do desfile da nova coleção da L'appeal, sua marca de roupas.
Ao ver no seu relógio que ainda faltavam meia hora para a chegada de sua visita (seu pretendente que vinha direto de Moscou para vê-la), desceu as escadas de sua mansão em direção a sua bodega, onde tirou para si uma taça de um vinho tão velho que a data de fabricação estava apagada demais para ver de que ano era.
Logo notou a falta de Augusto no bar, local que fora designado a limpar e servir desde o início de seu contrato, mas não o via em lugar algum. Quando aparecesse ia mandá-lo de volta ao trabalho. Deixou a garrafa de vinho pela metade no balcão do bar, e, pegando uma última taça para si, voltou ao seu quarto pensando em encontrar o mordomo no caminho.
Marisa retornava tranquilamente ao seus aposentos pelo corredor escuro do segundo andar quando algo a puxou, fazendo um barulho de rasgar que a assustou e derrubou o vinho no chão, quase em si mesma. De repente, suas calças estavam com um rasgo na parte de trás da coxa.
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Terror: O Livro Dos Contos
HorreurEsse livro é uma compilação de contos de terror. Tudo bem ler sozinho a noite, mas verifique se está realmente sozinho... Um novo conto toda sexta!