| prólogo |

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O farol alto. Gritos femininos. Um impacto. A respiração acelerada. A pulsação a mil.

Grande parte de Eden Praire já tinha as luzes de suas residências apagadas. As pessoas que ainda transitavam pela pequena cidade do estado de Minnesota voltavam de um dia rotineiro e agitado de trabalho. Mas, mesmo que fosse uma quarta feira à noite, beirando a madrugada, haviam jovens festeiros e despreocupados com o correr das horas que marcavam seus relógios. Ignoravam as ligações incessantes em seus aparelhos telefônicos, e ouviam apenas a música alta que escapava das picapes de um DJ amador e frenético. Eles não se importavam com nada que não estivesse conectado a suas almas leves pela grande quantidade de drogas ingeridas, injetadas, e o álcool se misturando ao sangue que corria em suas veias.

Tudo acontece em um piscar de olhos. Em um momento, dois jovens disparavam palavras duras para o outro, dentro de uma discussão que não terminaria até que cada um seguisse o seu caminho. No outro, tudo o que puderam ouvir fora um zumbido, e sentiram o impacto duplo causado pelo carro sendo arremessado para fora da pista, até que a lateral esquerda de toda a lataria se tornasse fundos e grandes amassados que poderiam ser reparados por um bom mecânico.

Danos irreparáveis são causados, no entanto. Quando as pupilas do par de olhos amendoados dilatam, o rapaz se recusa a mantê-los abertos. A fraca iluminação dos postes de energia a frente causavam-lhe incomodo, apenas não tanto quanto a ardência em seu ombro direito, e em sua testa. Sua cabeça doía, como cada centímetro de seu corpo pressionado entre um acento de couro e o volante. Não possuía forças para olhar ao redor, se tentasse, temia perder a cabeça, literalmente. Como se um castigo que estivesse começando, a culpa despeja sobre seus ombros. Ele consegue ligar os fragmentos pesados que estavam espalhados por sua mente.

A culpa sempre iria acompanhá-lo, a cada passo que desse.

Raiva. Teimosia. Uma queda. A dor. Sonhos esvaindo. Muitos corações aflitos. Um por cento de esperança.

Em um hospital particular no centro, médicos e enfermeiros trabalhavam a todo vapor. Estavam a pouco mais de três horas com uma paciente resistente a toda e qualquer anestesia aplicada. Eles se sentiam tensos, um pouco mais naquele dia. Seu caso era delicado, e mesmo que tivessem um por cento de esperança intacta de que tudo pudesse dar certo quando terminassem, o suor que escorria por suas testas não seria o suficiente. Precisavam ir além, abalar o extremo, por aquela menina que possuía uma vida longa pela frente. Isso se tornou uma missão de honra por cada lágrima derramada assim que fora levada pela maca as pressas, e pelas súplicas do casal de meia idade que não queriam deixá-la sozinha, que clamaram a todos os anjos para que a salvassem.

Os olhos fechados da jovem eram a única segurança de que ela dormia, e não sentia mais a dor alucinante que devia estar sentindo por seus ossos estarem praticamente esmagados. O grande corte em sua perna direita doeria, mesmo quando fosse fechado, e cicatrizado. O homem com um bisturi tinha a testa franzida, analisando o estrago, começava a se lamentar por dentro. Em sua frente estava algo que não desejava nem a mais escurecida alma. Era a dor que seria arrastada por toda a vida da jovem que tanto chorou, sem conseguir pronunciar uma palavra. Ele sabia que se pudesse, olharia em seus olhos e lhe imploraria para que salvasse seus sonhos.

O medo de cair iria arrastar-se por cada caminho que seguisse, em cada passo que não poderia dar. 

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