Manhã de sexta. Escritório da sra. Marion Kresney, orientadora pedagógica, que tem olhos pequenos e gentis e um sorriso que quase não cabe no rosto. De acordo com o certificado pendurado na parede, ela trabalha no colégio Bartlett há quinze anos. Esta é nossa décima segunda reunião.
Meu coração está acelerado e minhas mãos ainda tremem por ter subido no parapeito da torre do sino. Meu corpo inteiro está gelado e tudo o que eu quero é deitar. Espero a sra. Kresney dizer: Eu sei o "que você estava fazendo na primeira aula, Caroline Forbes. Seus pais estão vindo pra cá. Médicos estão de prontidão para levá-la ao instituto psiquiátrico mais próximo.
Mas começamos como sempre.
— Como você está, Caroline?
— Estou bem, e você? — Sento sobre as mãos.
— Também. Mas vamos falar de você. Quero saber como está se sentindo.
— Tudo bem. — Só porque ela não tocou no assunto, não quer dizer que não saiba. Ela quase nunca pergunta as coisas diretamente.
— Como tem dormido?
Os pesadelos começaram um mês depois do acidente. Ela pergunta sobre isso sempre que nos vemos, porque cometi o erro de "contar pra minha mãe, que contou pra ela. Esse é um dos principais motivos pelos quais estou aqui e a razão pela qual parei de falar as coisas pra minha mãe.
— Tenho dormido bem.
A sra. Kresney sempre sorri, não importa o que aconteça. Gosto disso nela.
— Algum sonho ruim?
— Não.
Eu costumava escrever sobre meus pesadelos, mas não escrevo mais. Lembro cada detalhe. Como o que tive há quatro semanas, em que eu estava literalmente derretendo. No sonho, meu pai me disse: "Você chegou ao fim, Caroline. Chegou ao limite. Todos temos um limite, e o seu é este". Mas eu não quero que seja. Vi meus pés virarem poças e desaparecerem. Depois "foram as mãos. Não doía, e me lembro de pensar: Eu não deveria me importar, porque não dói. Só estou desaparecendo. Mas eu me importei quando, membro a membro, o resto de mim sumiu antes que eu acordasse.
A sra. Kresney se mexe na cadeira, com o sorriso fixo no rosto. Me pergunto se ela sorri enquanto dorme.
— Vamos conversar sobre a faculdade.
Durante essa mesma época, no ano passado, eu adoraria conversar sobre a faculdade. Lexi e eu costumávamos fazer isso de vez em quando, depois que nossos pais iam dormir. Se a temperatura estivesse agradável, sentávamos do lado de fora; quando fazia frio, ficávamos dentro de casa mesmo. Imaginávamos "os lugares para onde iríamos e as pessoas que conheceríamos, bem longe de Bartlett, Indiana, população de 14983 habitantes, onde nos sentíamos extraterrestres de algum planeta distante.
— Você se inscreveu na UCLA, Stanford, Berkeley, Universidade da Flórida, Universidade de Buenos Aires, Universidade do Norte Caribenho e Universidade Nacional de Cingapura. É uma lista bem abrangente, mas e a NYU?
Desde as férias de verão antes do sétimo ano, o curso de escrita criativa da NYU era meu sonho. Isso porque visitei Nova York com a minha mãe, que é professora universitária e escritora. Ela fez pós-graduação na NYU e durante três semanas nós quatro visitamos a cidade e conhecemos seus antigos "professores e colegas — romancistas, dramaturgos, roteiristas, poetas. Meu plano era me inscrever para a admissão antecipada, em outubro. Então o acidente aconteceu e mudei de ideia.
— Perdi a inscrição. — O prazo para admissão regular foi há uma semana. Preenchi tudo, até escrevi a dissertação, mas não enviei.
— Vamos conversar sobre sua escrita. Vamos conversar sobre o site.
Ela está falando do lexiecaroline.com. Lexi e eu começamos o site quando viemos morar em Indiana. Queríamos criar uma revista on-line que oferecesse duas visões (muito) diferentes sobre moda, beleza, garotos, livros, a vida em geral. Ano passado, Gemma Sterling (estrela da websérie Rant), "amiga de Lexi , mencionou nosso site em uma entrevista, e o número de seguidores triplicou. Mas eu não encostei mais nele desde que Lexi morreu. Afinal, qual seria o objetivo? Era um site sobre irmãs. Além do mais, naquele instante em que atravessamos a barra de proteção, minhas palavras também morreram.
— Não quero falar sobre o site.
— Soube que sua mãe é escritora. Ela deve dar várias dicas.
— Jessamyn West disse: "Escrever é tão difícil que os autores, tendo passado o inferno na Terra, escaparão de qualquer punição depois".
Ela fica instigada com a citação.
— Você acha que está sendo punida?
Ela está falando do acidente. Ou "talvez esteja se referindo a estar aqui nesta sala, neste colégio, nesta cidade.
— Não.
Se eu sinto que deveria ser punida? Sim. Por que mais eu teria cortado a franja?
— Você acha que é responsável pelo que aconteceu?
Arrumo a franja. Está torta.
— Não.
Ela recosta na cadeira. O sorriso desliza uma fração de centímetro. Nós duas sabemos que estou mentindo. Me pergunto o que ela diria se eu contasse que há uma hora estavam me convencendo a sair do parapeito da torre do sino. Agora, tenho quase certeza de que ela não sabe.
— Você já voltou a dirigir?
— Não.
— Já andou de carro com seus pais?
— Não.
— Mas eles querem que você ande. — Isso não é uma pergunta. Ela fala como se tivesse conversado com um deles, ou com os dois, o que provavelmente aconteceu.
— Não estou pronta. — Essas são as três palavras mágicas. Descobri que podem me livrar de praticamente qualquer coisa.
Ela se inclina para a frente.
— Já pensou em voltar para a equipe de torcida?
— Não.
— Grêmio estudantil?
— Não.
— Ainda toca flauta na orquestra?
— Sou a última cadeira. — Essa é uma coisa que não mudou desde "o acidente. Sempre fui a última cadeira porque não sou muito boa na flauta.
Ela se encosta de novo. Por um momento penso que está desistindo. Então, diz:
— Estou preocupada, Caroline. Sinceramente, você já deveria ter melhorado um pouco mais. Você não pode evitar carros pra sempre, principalmente agora no inverno. Não pode parar no tempo. Precisa lembrar que é uma sobrevivente, e isso quer dizer que...
Nunca vou saber o que isso quer dizer porque, assim que ouço a palavra "sobrevivente", levanto e saio.
A caminho da quarta aula. Corredor da escola. "Pelo menos quinze pessoas — algumas eu conheço, outras não, outras não conversam comigo há meses — me param no caminho até a sala para me dizer como fui corajosa de evitar que Klaus Mikaelson se matasse. Uma das garotas do jornal do colégio quer fazer uma entrevista.
De todas as pessoas que eu poderia ter "salvado", Klaus Mikaelson é a pior escolha, porque é uma lenda do Bartlett. Não o conheço muito bem, mas já ouvi falar dele. Todo mundo já ouviu falar dele. Algumas pessoas o odeiam porque acham que ele é esquisito e se mete em brigas e toma suspensão e faz o que quer. Algumas pessoas o idolatram porque acham que ele é esquisito e se mete em brigas e toma suspensão e faz o que quer. Ele toca guitarra em cinco ou seis bandas diferentes e, no ano passado, gravou uma música. Ele é meio... radical. Tipo, um dia veio pra aula pintado de vermelho da cabeça aos pés, e nem era dia de jogo. Falou pra algumas pessoas que estava protestando contra o racismo e pra outras que estava protestando contra o consumo de carne. No primeiro ano, apareceu de capa durante um mês inteiro, quebrou uma lousa no meio com uma mesa e roubou os sapos do laboratório de biologia e fez um funeral para eles antes de enterrá-los no campo de beisebol. A grande Anna Faris uma vez disse que o segredo para sobreviver ao ensino médio é "ficar de boa". Klaus faz o contrário disso.
Chego cinco minutos atrasada para a aula de literatura russa, na "qual a sra. Mahone está passando um trabalho de dez páginas sobre Os irmãos Karamazov. Todos reclamam, menos eu, porque apesar do que a sra. Kresney parece pensar, tenho minhas circunstâncias atenuantes.
Nem escuto quando a sra. Mahone explica o que devemos fazer. Em vez disso, arranco um fio solto da saia. Estou com dor de cabeça. Provavelmente por causa dos óculos. A miopia de Lexi era mais alta que a minha. Tiro os óculos e os apoio na mesa. Ficavam estilosos nela. Ficam feios em mim. Principalmente agora que tenho franja. Talvez, se usá-los o bastante, eu consiga ser como ela. Consiga ver o que ela via. Talvez eu seja nós duas ao mesmo tempo, e ninguém vai sentir falta dela, nem mesmo eu.
Tenho dias bons e dias ruins. Quase me sinto culpada por dizer que não são todos ruins. Alguma coisa me pega desprevenida — um programa na TV, uma piada do meu pai, um comentário na aula — e rio como se nada tivesse acontecido. Volto ao normal, o que quer que "normal" signifique. Algumas manhãs acordo e me pego cantarolando enquanto me arrumo. Ou aumento o volume do rádio e danço. Na maior parte dos dias, vou andando pra aula. Em outros, pego a bicicleta, e às vezes minha cabeça me engana e penso que sou só uma garota comum dando uma volta à toa.
Vicky Kenny cutuca minhas costas e me passa um bilhete. Como a sra. Mahone recolhe os celulares no "início das aulas, temos que conversar à moda antiga, arrancando folhas do caderno.
É verdade que você impediu que Klaus se suicidasse? Bj. Stefan. Só tem um Stefan na sala — alguns diriam que só existe um Stefan no colégio inteiro, talvez até no mundo —, e é Stefan Salvatore.
Levanto a cabeça e vejo que ele está olhando pra mim, duas fileiras adiante. Ele é lindo. Ombros largos, cabelo castanho-dourado, olhos verdes e sardas suficientes para que pareça acessível. Até dezembro, ele era meu namorado, mas agora estamos dando um tempo.
Deixo o bilhete em cima da mesa por cinco minutos antes de responder. Finalmente, escrevo: Só calhou de eu estar lá. Bj.C. Menos de um minuto depois, o bilhete volta pra mim, mas desta vez não abro. Penso em "quantas garotas adorariam receber um bilhete de Stefan Salvatore . A Caroline Forbes da última primavera teria sido uma delas.
Quando o sinal toca, fico pra trás. Stefan demora um pouco pra sair, esperando pra ver o que vou fazer, mas quando vê que fiquei sentada, pega o celular e vai embora.
A sra. Mahone diz:
— Pois não, Caroline?
Antes, dez páginas não eram nada de mais. O professor pedia dez e eu escrevia vinte. Se pedisse vinte, eu entregava trinta. Escrever era o que eu fazia de melhor, melhor até do que ser filha ou namorada ou irmã. Escrever fazia parte de mim. Mas agora escrever é só mais uma das coisas que não consigo fazer.
"Não preciso dizer quase nada, nem mesmo "Não estou pronta". Está no livro não escrito de regras da vida, no capítulo "Como reagir quando um aluno perde um ente querido e, nove meses depois, ainda está passando por um momento difícil".
A sra. Mahone suspira e devolve meu celular.
— Entregue uma página ou um parágrafo, Caroline. Ao menos tente.
Minhas circunstâncias atenuantes salvam o dia.
Do lado de fora da sala, Stefan me espera. Vejo na cara dele que está tentando resolver o enigma e me transformar na namorada divertida que eu costumava ser. Ele diz:
— Você está linda hoje.
Ele é gentil e não repara no meu cabelo.
— Obrigada.
Por sobre o ombro de Stefan, vejo Klaus Mikaelson passar como um pavão. Acena com a cabeça, como se soubesse de algo que não sei, e segue em frente.
VOCÊ ESTÁ LENDO
All The Bright Places
Fanfiction[ História não me pertence, é apenas uma ADAPTAÇÃO do livro Por Lugares Incríveis escrito pela maravilhosa Jennifer Niven, todos os créditos reservados a ela ] Dois jovens prestes a escolher a morte despertam um no outro a vontade de viver. Caroline...