Você deve sair agora. Não porque eu esteja mandando, mas porque o sol já vai se pôr em Copacabana e você não vai querer ir até lá no escuro, vai? Então você sai agora e cruza o JB, bem em frente àquele bar, dos guarda-chuvas coloridos, você a vê correr a seu encontro. Espere calmamente ela terminar de falar, ela está nervosa, tem medo que você seja morto ou se mate, essas coisas de mãe. Não se preocupe, esta é a última vez que você a vê. Olhe bem para ela, aposto que você nunca tinha reparado a semelhança com Zenaide, mas sim, elas são irmãs, por isso você chama a bruxa de tia. Você deve estar se perguntando porquê falei dela, pois bem, não quero que você tenha surpresas: Zenaide te chamou pra entregar a encomenda porque contratou um moleque pra dar cabo de você, bem na curva depois do banco. Não se preocupe, ele não vai conseguir te matar. Você se despede dela e promete terminar a conversa em casa. Sorri nervosamente e ela balança a cabeça sem se conformar. Suba a colina ao lado do bar e vá até o final. Há uma plantação de bananas por boa parte do morro, você escuta alguns pássaros, está pensativo, lembra de algumas vezes que visitou a avó no interior e que uma vez comeu um tipo de banana cozida. Não se distraia muito, concentre-se em chegar até o banco de pedra. Caminhe mais uns vinte metros e você já verá Ramon sentado no banco. Sorrindo, afinal vocês são amigos de infância, você pede a ele que entregue a encomenda. Ele concorda com naturalidade e você desce o morro de volta. Agora preste atenção: você está recebendo uma mensagem do 22 que, quase ilegível de tão mal escrita, dá a entender que você vai ficar com o serviço permanentemente. Em seguida ele manda outra pedindo pra ir nos arcos buscar um dinheiro. Você não deve ir lá. Vá pra barra e tente vender algo lá. Repita como um mantra: você não vai até os arcos. Agora você está saindo e pensando no que fazer. Não seja preguiçoso, se você for até a barra, pode encontrar um cara bacana que precisa de ajuda e se você ajudá-lo vai ser muito bem recompensado. Mas se for pros arcos, vai ficar subindo e descendo morro até a morte ou a prisão. Você resolve ir ao ponto de ônibus e o primeiro dos dois que passar, será o destino. O letreiro falhado diz " L PA". E você entra, como um coelho entrando numa armadilha com os cães babando e latindo ao redor. Desce em frente aos arcos e não dá quatro passos completos, um sujeito numa moto lhe acerta dois tiros na nuca e um no ombro.
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Sísifo
Short StoryAdolescente de classe média entra para o tráfico apesar das advertências do narrador.