15 de Fevereiro de 2017 (11:48 da noite)

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Olá diário (coisa esquisita de se dizer, me sinto muito idiota fazendo isso). Comecei a escrever mais cedo porque aconteceu algo muito legal hoje. Liberaram a visita de pessoas que não são da família e a Cristine veio aqui. Aquela garota é louca. Ficamos a visita quase toda só falando sobre como fugir de um hospital. Falamos um pouco sobre o Denis e das besteiras que ele fazia. Então voltamos a planejar uma fuga dessa prisão novamente
Ela trouxe também um pen drive com minhas músicas favoritas. Seria perfeito se ela tivesse trazido fones de ouvido também. Não posso fazer barulho nenhum aqui. Estou com as musicas mas não posso escutar. Que vida horrível. Acho que vou pedir pra ela fazer download de uns filmes e pra mim poder ver também. Quem sabe até "vejamos um deles juntos quando ela vir me visitar"
Estou me sentindo torturado. Ela falou que tem a nova musica do Motionless In White no pen drive. Mas eu não posso escutar. Estou roendo as unhas. Vou continuar contando a minha história aqui, talvez um dia a Cristine veja o quanto ela me ajudou.


Depois da morte do Daniel, as coisas ficaram bem estranhas lá em casa. Minha mãe estava estranha. Parecia um robô. Não esboçava reações. Como se tivesse perdido tudo dentro dela. Começou a fazer acompanhamento psicológico e foi contemplada com uma infinidade de remédios moduladores de humor, remédios para dormir dentre outros milhares. Ao menos não bebia mais
Foi afastada do emprego por instabilidade emocional. Ela era Juíza. Essas que decidem quem vai preso e tal. Se recusa a julgar qualquer caso que envolvesse acidentes de transito. Eu
entendo, afinal, foram duas perdas sobre as mesmas circunstancias. Pois viemos a saber algum tempo depois que o homem que atropelou meu irmão também havia dormido enquanto dirigia. Se não fosse trágico eu diria que isso é a vida fazendo piadinhas de mal gosto. Ela ia nas consultas, tomava os remédios porém eu sentia que ela não estava se esforçando pra melhorar. Parecia que fazia as coisas sem a mínima fé de que o tratamento poderia realmente ajuda-la .
A casa pareceu estar vazia demais para nós dois por todo o tempo que eu estive lá com ela. E era uma casa grande, pois inicialmente foi planejada para 4 moradores. E agora o número de residentes tinha sido cortado pela metade por desastres familiares do destino. Para ajudar, alguns dias depois da morte do meu Irmão, eu comecei a ter sensações estranhas. A noite quando eu deitava pra dormir era horrível. Próximo ao momento que vamos pegar no sono eu sentia como se meu corpo começasse a apagar. Tinha a sensação de que eu estava morrendo. Sentava na aterrorizado de medo com as mãos frias e algumas vezes até com uma certa falta de ar. Isso me dava muito medo.

Durante o dia essa sensação não vinha com tanta frequência. Mas havia formigamento nas mãos por diversas vezes. O que mais me assustava era quando, eu olhava pra frente e não via nada. Um exemplo: normalmente conseguimos imaginar nosso futuro com facilidade, tipo, os planos, carreira, etc. Mas eu não. Eu não consegui me ver depois de alguns meses ou anos. Parecia que eu não tinha perspectiva de futuro. Como se eu soubesse que minha morte estava dali a alguns dias. E isso fazia se abater uma tristeza momentânea muito inesperada em mim. Por muitas vezes estava me divertindo ou fazendo algo legal e essa sensação caia em cima de mim e eu ficava deprimido do nada

Fui ao medico inclusive e ele disse que isso era inicio de depressão. Eu não acreditei pois não me sentia triste. Eram apenas sensações que faziam eu me sentir mal. Mas eu não me sentia deprimido. Só me sentia mal. Todos nós sabemos o que é se sentir triste. Eu inclusive
formei uma imagem de o que é ter depressão. E não me sentia depressivo. Eu não estava me sentindo profundamente triste. Eu não tinha depressão de acordo com o que eu pensava. Eu não vivia no meio da tristeza. Chorando pelos cantos. Pensando: "Meu deus, eu vou me matar'"
Eu me sentia meio preso. Tinha vezes que eu não consegui fazer minhas atividades diárias. Porque tudo que dava errado eu sentia que a culpa era minha. Como se eu tivesse sentindo uma dor horrível. Mas eu não fazia ideia de onde doía, tinha medo sem saber o porque
e ainda por cima, eu não queria conversar sobre o assunto com ninguém. Chegou um ponto em que esses sentimentos ruins eram tão fortes que eu sentia dores físicas. O coração acelerava do nada. Fiz diversos exames para ter certeza de que não eram problemas de coração. Doía o peito. A indisposição fazer algo legal também foi estranha, mas não tão constante.


Ficava enjoado, dores por todo o corpo. Nos ombros e nuca eram as piores possíveis. Eu não consegui sair da cama por muito tempo. Cristine ia me visitar, mas parecia que a companhia dela não trazia o mesmo impacto como antes. Sabe, as coisas que antes eu julgava serem sensacionais viraram apenas coisas. Nada além disso. E talvez a pior de todas sensações foi começar a pensar se eu poderia ter impedido a morte do meu pai e do meu irmão. Se eu tivesse ido com o meu nessa viagem (pois ele havia me convidado, estava de férias na escola) se eu estivesse no carro, poderia manter ele acordado. E meu Irmão. Se naquele dia, eu abrisse mão de jogar e não tivesse dado dinheiro a ele. Se eu tivesse contado para nossa mãe que ele faltava a aula por diversas vezes por esse motivo. E se essas duas perdas pudessem ser evitadas se eu fosse mais correto?


Coisas assim começaram a fazer eu me sentir culpado demais. E após isso, qualquer coisa que acontecesse trazia até mim a sensação de que foi minha culpa ou de que eu poderia ter impedido. Foi esmagador. Foi devastador. Foi me contorcendo por um bom tempo e eu negando o fato de estar sofrendo com depressão! - "Isso é doença de gente que só quer atenção. Todos ficam tristes, essas pessoas só não sabem lidar com a tristeza." - Essa era claramente a ideia que eu tinha sobre depressão.


Comecei a desenvolver a baixa autoestima. Toda garota bonita que via na rua . Ficava com vergonha só de ela olhar pra mim. Ficava sozinho tentando resolver problemas que não tinham como ser resolvidos. As atividades que eu gostava quando Cristine me ajudava, eu optei por fazer sozinho. Eu estava odiando companhia. Passei a ficar o dia todo dormindo e a noite apenas me arrependendo sobre ter perdido um dia todo logo após passar o dia todo dormindo novamente. Me sentia um inútil, por minha mãe perder um filho e o que sobrou se tomou um inútil que não sai do quarto pra fazer nada. Nem para dar bom dia. Me afastei das pessoas
que eu gostava só por me sentir como se fosse um incomodo pra eles. Eu tinha a sensação de estar incomodando eles sempre que eu dizia um oi. Como se o simples fato daminha presença fosse um atraso eles. Comecei a surtar com isso. E todos os sentimentos ampliados quando vinha a memoria do meu pai, do meu irmão. Lembrei do momento quando eu e o Denis ajudamos a Cristine com o garoto que ela gostava. Fizemos todo um plano de como fazer eles se encontrarem sozinhos e criar o clima perfeito para eles se beijarem. Dizer a ela o que falar. E depois fizemos uma mini festa nós três lá em casa pra comemorar que ele havia chamado ela pra um encontro. Nunca vi ela tão feliz. Os olhos dela brilhando. E uma das melhores lembranças que tenho do meu Irmão. Pois acho que nunca nos empenhamos tanto em algo juntos quanto esse dia. A maioria das pessoas reclamam de irmãos mais novos. Eu sempre fiz tudo junto com o meu. Daniel, Cristine e eu éramos um trio.

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⏰ Última atualização: Aug 21, 2017 ⏰

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