Anael: graça de Deus
Sophia: sabedoria->
Permanecia em seu posto, encarando tudo. Era muito quieto, como se algo tivesse morrido e vivessem o momento de luto. Talvez fosse isso mesmo.
O sol que se punha já não a impressionava como antes, vira aquela paisagem por tanto tempo e se desapaixonou por ela.
Se pudesse sentir algo, seria culpa. Séculos haviam se passado dês de que fora rebaixada a guarda dos portões do paraíso, a culpa não deveria ser presente aquela altura.
Mas era. Parecia consumi-la a cada nascer do sol. A única coisa que distraia Anael eram as estrelas. Conta-las durante seu tempo livre aliviava a dor da saudade.
Sim, ela achava estranho sentir aquilo, porém nem cogitou a ideia de contar aos outros anjos, tendo em vista que já não era muito amada entre seus irmãos. Permaneceu em silêncio compartilhado com sua culpa e confusão durante um tempo.
Chegava a gostar vez ou outra de toda aquela quietude mórbida, ninguém ousava incomodá-la, da mesma forma que não havia do que proteger os portões. Há muito não se via criatura alguma ter vontade de transpasa-los, e, mesmo que houvesse, Anael carregava uma lâmina de fogo mas mãos.
Teria saudade de um pôr do sol tranquilo como aquele...
Sua memória impecável captou toda a cena de quando foi empurrada do céu repentinamente. Caiu um espaço quase infinito até que enfim chegasse ao chão, as asas dobradas em uma promessa de luto não a podiam ajudar no momento. Por sua sorte e azar, aquele não era o cair de uma expulsão, sim de uma missão, percebeu depois de se estabilizar.
Havia sido rebaixada novamente. Agora, em sua nuca, runas profundas a descreviam como um simplório anjo da guarda. A armadura dourada lhe escorregou do corpo e a lâmina de fogo desmanchou-se no ar.
Incrédula, mira seus olhos para as nuvens. Já não é importante o suficiente para que seus olhos alcancem as portas do paraíso e sabe que, por mais que implore, será ignorada.
Permanece um tempo de pé, perdida, sozinha. A luz do sol já não a ilumina e a lua inicia seu show, acompanhada das lindas estrelas. Anael compara-se com estes astros por ser distante, contudo, a grande diferença entre ela e os que pintam o céu é que estrelas brilham com uma liberdade que ela não poderia ter.
Olhou seu pulso. Fogo sagrado e indolor desenhava sua pele com mais uma runa em enoquiano. Um nome, sua missão. Antes que a palavra se completasse, o anjo se consumiu em tristeza como nenhum outro havia feito. Conhecia aquela marca.
Sophia.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Sophia - Conto
Short StoryUm anjo foi feito para obedecer. Não foi feito para amar, se alegrar, se rebelar. Não foi feito para sentir, sorrir ou sequer cair. Um anjo não foi feito para viver, descrer ou se entristecer. Um anjo não foi feito para sentir o que Anael sentiu...