Savior (Intersexual)

Assault

Camila POV.

Abri a porta de casa e ouvi as risadas da Sofi, só isso já me fez valer o dia que eu tive. Fechei a porta com cuidado e fui andando até o quarto dela, Ally devia estar fazendo alguma brincadeirinha com ela.

"Boa noite." Sorri me encostando no batente e Ally virou a cabeça para me ver, sorrindo de volta. Eu me sentia péssima de deixar ela cuidando de Sofia enquanto eu trabalho mas eu não podia pagar uma babá, e além do mais ela insiste muito nisso também, eu tinha a melhor amiga do mundo.

"Boa noite, Mila. A Sofi já estava impaciente querendo você." Sorri vendo minha irmã abrir um sorriso largo. Me aproximei ficando de joelhos na frente dela, sorri abertamente vendo aquele sorriso banguelo que eu tanto amava.

"Kaki!" Ela gritou e eu ri, peguei ela de Ally e puxei para um abraço apertado, minha irmã era tudo o que eu tinha, eu amava-a mais do que a mim mesma.

"Oi meu amor." Beijei seu rostinho fazendo-a gargalhar, ri junto completamente abobalhada.

"Mila eu já dei banho nela e o jantar, só estava esperando você para colocar ela pra dormir mesmo." Eu assenti e me levantei, eu me sentia péssima por não ter tanto tempo para ela, mas eu precisava sustentar minha casa e principalmente ela, era horrível chegar em casa com Ally me dando uma novidade de que ela falou, ou fez, coisas novas que eu infelizmente perdia.

Fiquei bons minutos velando o sono dela assim que ela pegou no sono, suspirei e deixei um beijo na sua testa afastando-me para sair do quarto. Desliguei a luz e liguei a babá eletrônica, fechando a porta em seguida. Caminhei até a sala e vi que Ally estava esquentando o macarrão, sorri triste e me sentei na mesa, se eu não tivesse Ally não sei o que seria de mim.

"Cansada?" Ela me olhou de lado e eu assenti, passei o resto da tarde após Lauren ir embora procurando emprego, o que não consegui como sempre, eu realmente não sabia o que iria fazer da minha vida agora.

"Eu perdi o emprego." Sussurrei enterrando o rosto nas mãos.

"Sinto muito, Mila." Ally suspirou triste, ficamos em silêncio até ela terminar o macarrão e colocar na mesa. "Olha, eu tenho uma amiga que conhece alguém que precisa de uma babá urgente." Ela sorriu tentando me confortar e eu olhei-a com atenção, qualquer coisa nesse momento eu aceitaria.

"É bebê?"

"Não, tem cinco anos, vai passar algumas semanas com a irmã mais velha já que os pais irão fazer uma viagem." Assenti, engolindo a comida para responder.

"Você pode falar com ela? Marcar uma entrevista talvez, eu preciso disso o mais rápido possível."

"Vou falar com ela amanhã, ela trabalha no salão que você estava, acho que você conhece, Normani." Puxei na memória tentando lembrar de alguma Normani até que lembrei da cabeleireira, uma morena simpática, nunca nos falamos muito, só o básico.

"Conheço sim."

Terminamos de comer e eu fiz questão de lavar a louça, não deixaria Ally fazer mais nada. Esperei com ela até seu namorado vir buscá-la, e agradeci mais uma vez como sempre, eu não podia nunca deixar de agradecê-la por tudo que faz por mim. Assim que Ally foi embora eu fui tomar um banho, deixei-me relaxar pelo menos por um tempo de baixo da água quente, tudo o que eu mais queria era sair dessa vida mas era difícil, eu tenho fé que sairei um dia e darei tudo de bom para a minha irmã, eu não quero que ela passe por tudo o que eu passei.

Antes de ir para cama fui mais uma vez no quarto de Sofia, vendo que estava tudo como deixei, ela dormia como uma pedra então não tinha porque me preocupar, voltei para o meu quarto e finalmente cai na cama, respirei fundo ao fechar os olhos, eu precisava ser forte, esse foi meu último pensamento antes de cair no sono, completamente exausta.

O despertador me acordou no dia seguinte, tive que respirar fundo para a irritação não me invadir, tinha esquecido de desligar já que tinha perdido o emprego mas acabei fazendo força para levantar, pelo menos era cedo e eu ia poder ter mais tempo de ir procurar algum emprego por perto, não queria chamar Ally logo cedo então resolvi levar Sofi comigo. Tomei um banho rápido e vesti em poucos minutos, coloquei uma roupa simples, apenas uma blusa branca de manga curta e uma calça jeans, junto com um tênis e os cabelos presos em um rabo-de-cavalo. Fui até minha bolsa e conferi minha carteira, apenas para confirmar o que eu já sabia, eu só tinha vinte dólares.

Deixei de lado por enquanto e foquei em Sofia que acordaria daqui a pouco, ela estava acostumada a acordar no mesmo horário que o meu para assistir desenhos enquanto eu esperava Ally. Minha irmã era uma criança tão boa que as vezes eu me sentia tão mal por não conseguir dar a ela tudo o que ela merecia, desde pequena nunca foi escandalosa, sabia receber um não e era tão humilde, sempre com um sorriso lindo no rosto e me dando abraços apertados quando me via triste, era por ela que eu lutava todos os dias, eu ainda daria uma vida de princesa pra ela.

"Kaki!" Ouvi sua voz sonolenta me chamar e fui até seu quarto, encontrei ela embolada no edredom rosa coçando os olhinhos e os cabelos lá no alto, isso me fez rir.

"Bom dia, leãozinho." Sorri me inclinando e pegando-a no colo, ela fez um bico pelo apelido e enfiou a cabeça no meu pescoço, ela não gostava quando eu chamava-a assim porque sentia vergonha do cabelo bagunçado pela manhã, era a coisa mais fofa.

"Pala!" Resmungou contra meu pescoço.

"Vamos tomar um banho? A Kaki vai ter que sair mas hoje você vai ir comigo." Foram questões de segundos pra ela sair do esconderijo e me olhar animada, ela sempre amava quando eu levava ela pra sair.

"Sovete!" Seus olhos brilhando fizeram meu coração partir, tinha que usar aquele dinheiro para condução, eu odiava negar algo para ela.

"Isso bebê, sorvete." Sorri fraco e abracei-a deixando beijinhos molhados em sua bochecha, me aqueci ao ouvir sua gargalhada gostosa.

-*-

Nós tomamos café juntas, fiz as panquecas de banana que nós amávamos e devoramos tudo de uma vez, precisava deixá-la de barriga cheia até pelo menos o almoço, até lá eu arranjava um jeito de almoçarmos na rua ou teria que voltar mais cedo. Peguei o primeiro ônibus que ia para o centro e resolvi que voltaríamos a pé, pelo menos eu garantia um dinheirinho pro sorvete dela, que eu sabia que seria cobrado uma hora ou outra.

Sofia era muito quieta e obediente, então nas primeiras horas da manhã eu me foquei em pegar os currículos que sempre carregava na bolsa e entregar, não tinha muitas opções para emprego, sempre ia diretamente em lojas e salões, via nos postes se havia algum anúncio de empregada, em restaurantes pequenos ou bares, qualquer lugar que me aceitasse já estava bom demais. Era nessas horas que eu me arrependia amargamente de largar os estudos, mas minha vida nunca foi fácil, e se eu quisesse um emprego digno teria que esperar Sofia crescer mais um pouco e retomar os estudos, estava nos meus planos, mas ela ainda era pequena demais para isso.

O sol já tava rachando e eu suava assim como Sofia, ela já estava pedindo pelo sorvete então resolvi comprar logo uma casquinha para ela, fomos andando pela rua movimentada e eu a apertava no colo enquanto me esquivava das pessoas, achei a alguns metros uma barraquinha de sorvete e suspirei aliviada, olhei para Sofi e apontei, sorrindo por vê-la pular animada no meu colo.

"Vou pegar o dinheiro, fica quietinha." Pedi ao colocá-la no chão e ela assentiu, agarrando na minha perna. Tirei minha bolsa do ombro e a abri me preparando para pegar minha carteira, mas em seguida senti um puxão tão forte que arrancou minha bolsa, olhei desesperada apenas para ver um homem correndo com ela. "Minha bolsa!" Gritei desesperada, merda! Era o resto do meu dinheiro ali, meus documentos e os currículos.

Peguei Sofia com pressa no colo e corri atrás daquele maldito, eu estava cansada por ter andado por horas, as pessoas dificultavam meu caminho, mas eu não parava de correr como se minha vida dependesse disso. Não queria assustar Sofia mas eu precisava da minha bolsa, e em meio a corrida eu tentava acalmar ela que já dava indícios que iria chorar.

"Poliça!" Sofi gritou apontando para o outro lado e eu olhei alarmada, sentindo vontade de chorar ao perceber um carro de polícia ali. Atravessei a rua rapidamente e me aproximei deles, era um homem e uma mulher que conversavam. 

"Por favor, me ajudem!" Pedi ofegante, tinha noção que meu estado já estava deplorável pela corrida mas não podia ligar para isso agora. A atenção dos dois foram para mim e eu congelei no lugar.

"Camila?"