Capítulo 1- Dia do sim

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2015

- Lissa! São 7:30, você vai perder a primeira aula!- ouvi Rachel esbravejar na porta do meu quarto. Pulei da cama e corri para o banheiro, enquanto escovava os dentes, passei o pente em meu cabelo e quase chorei quando vi o quão embaraçado ele estava. Só quando abaixei ao lado da cama para pegar meu sapato, me dei conta que meu despertador não tinha funcionado, até que vi o motivo, ainda eram 6:30 da manhã.

- Filha da puta!- gritei, e ouvi a gargalhada da infeliz do outro lado da porta.

- Só assim para você chegar no horário minha querida!- Rachel disse triunfante, ela entrou com cuidado no quarto, desviando a tempo do meu sapato arremessado.

- Vamos vadia.- eu disse enquanto a puxava para tomar café.

- Ora sua...- ela parou no meio da frase quando chegamos na sala. - Sua mãe tá dormindo no sofá.

- E quando não está?- perguntei enquanto descia a escada de madeira escura que eu tanto amava, eu amava muita coisa na minha casa. Principalmente porque era eu quem cuidava dela, já que minha mãe não ligava para isso, não mais.

- Mãe, acorde! Você tem reunião hoje- chamei balançando seu ombro.

- Não...- ela respondeu meio grogue.

- Tem mãe, e você precisa ir, não pode faltar o grupo- sacudi novamente e ela se mexeu até levantar e subir as escadas com dificuldade, ela não estava bebendo mais, na verdade, desde que ele se foi ela nunca mais bebeu. Porém, a depressão tomou conta do seu ser, ela se culpava toda vez que tinha oportunidade e isso me matava por dentro. Pois a toda vez que ela mergulhava fundo na tristeza, eu sentia medo que fizesse o que já tentou no verão passado.
Sacudi a cabeça para afastar aquele pensamento e fui até a cozinha, Rachel já sabia como se comportar nessas situações, onde uma nuvem negra pairava lá em casa, ela falava sem parar e me contava as piores piadas do universo, e eu ria. Não era atoa que éramos melhores amigas, ela me entendia, e o melhor, não me questionava por tudo.
Chegamos na escola antes da primeira aula, o que me deu um tempo livre para ficar no pátio do colégio rabiscando em meu caderno de desenho. Eu amava desenhar, fazia isso quase todos os dias e nunca mostrava meus desenhos, nem mesmo Rachel tinha permissão para vê-los. O que para ela era um ultraje sem fim, já que nós dividimos tudo.

-Vou até a biblioteca pegar um livro, te encontro na aula- ela disse ajeitando a saia enquanto levantava.

- Não se apaixone pelo novo bibliotecário, ouvi dizer que é um gato- disse sorrindo maliciosamente.

- Sra. Bryce se aposentou?- ela perguntou piscando.

- Não, ela só está doente, substituto.

- Ah, bem que podia ser verdade, não aguento mais aquela chata reclamando que eu atraso a devolução dos livros.

- Então não atrase, você nem lê metade dos que você pega.
Arranquei uma página de um desenho mal feito e joguei de lado.

- Vou te chamar de Sra. Bryce, você é outra chata. Vou ver se aprovo esse substituto.
Eu ri da cara dela.

- Me ama menos!- gritei quando ela se virou. Ela levantou o dedo do meio sob sua cabeça me fazendo rir mais.
Puxei o celular do bolso e conferi a hora antes de ligar para a mamãe. Ela atendeu após o terceiro toque.

- Espero que já esteja na sala de espera do grupo...- Eu disse enquanto pegava uma caneta colorida na meu estojo.

- Estou sim... Mãe!- ela provocou depois de uma pausa. Aquele era um dia do "sim", era assim que eu chamava os dias bons, quando ela estava bem, até me provocava. Sorri internamente.

- E é bom ter levado um casaco filhota, tem uma frente fria chegando- entrei na brincadeira. Ela riu e se despediu.

- Tenho que ir, o conselheiro chegou. Beijos, até mais tarde.

- Beijos, Te amo.

- Também amo você.
Meu dia estava feito, eu estava pronta para passar por ele tranquila.
A minha escola é relativamente grande e bem conceituada no quesito ensino, eu não sou uma das melhores alunas, porém não sou das piores também, minhas médias são até razoáveis.
Entrei para sala tão distraída ouvindo música que nem notei que o sinal já havia tocado, o professor de história já estava perto do quadro no meio de um explicação, quando me viu, ele parou por um instante me lançando um olhar reprovador.

- Desculpe-me- sussurrei inaudível para ele e sentei o mais rápido que pude.

- Olá, esquisita. Você fica bem vestida de saco de batatas- a coisa, quer dizer, Natalie perguntou baixinho. Ela era da minha turma desde o jardim de infância e sempre me detestou, a recíproca era verdadeira, claro. Porém eu nunca entendi sua mania de me infernizar sempre que tinha chance.

- Olá, vaca azeda. Você fica bem vestida de piranha, ah não, pera.

- Ridícula.

-As duas, mais um pio e eu mando para a diretoria- o professor ameaçou.

Rachel fuzilou Natalie com os olhos, mas não podia intervir por já ter muitas suspensões e idas  à diretoria no currículo.

Eu tentei me concentrar na aula sobre revolução industrial e deixar Natalie de lado. Depois de um tempo consideravelmente seguro de sua vista, avaliei o que eu estava vestindo. Jeans rasgados, uma camiseta cinza do The Walking Dead* que propositalmente comprei um número a mais para ficar confortável, o que tinha de errado nisso? Dei de ombros e voltei para minha tarefa. Quem era aquela metida a Barbie humana para me dizer o que eu devo vestir.
Peguei carona com a mãe da Rachel na volta para casa, a Sra. Fisher é muito legal, sempre deixa nós duas irmos aos gritos no banco de trás e nem se importa. As vezes ria das nossas loucuras, mas hoje ela estava calada, até meio apreensiva. Preferi não perguntar, temendo serem problemas familiares. E disso eu entendo bem.

- Esqueci de te contar, os boatos eram verdadeiros, o substituto da Sra. Bryce é o ser mais lindo que eu já vi. Estou impactada!- Rachel gritou colocando as mãos no coração-precisa ir lá conhecer ele.

- Meu Deus Rachel! Mais uma paixão instantânea para sua lista.

- O que posso fazer se meu coração cabe todos?- ela disse me fazendo gargalhar.

- Pelo menos assume que tem mais de um.

- Esse será único.

- Veremos- eu disse sacudindo a cabeça para a inconstante amiga que eu tinha.

A lista de LissaOnde histórias criam vida. Descubra agora