AFASTE-SE

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— Oi, Tia. Está tudo bem?

— Está, menino. Só liguei para dizer que vou esperar tu chegar. Precisamos conversar...

— O que houve? Lana está aí, certo?

— Lana está bem. Chegou do colégio, Suzi está aqui tentando fazê-la ir pro banho e cuidar do dever... tudo em ordem.

— Então o que há, Tia?

— Precisamos conversar sobre minhas férias. Vou passar uns dias em Salvador... conversamos sobre isso. Quero ir viajar logo!

— Vai mesmo deixar Lana e eu aqui...

— Oxi! Quer ir comigo? — ela ri. — Eu levo vocês comigo! É só tirar umas férias também, nunca fez isso. Allana ia amar minha Bahia, e você também!

— Tudo bem. Conversaremos quando eu chegar. Já que vai me esperar, sairei mais cedo. Saio em quinze minutos!

— Vem com cuidado. Essas estradas estão cada vez mais perigosas.

— Sou cuidadoso. Não se preocupe!

— Tá. Até já!

Tia diz, desligo o telefone, e bufo. O que eu ia fazer sem Tia? Estava conosco há tanto tempo, claro que precisava de umas férias da minha fuça. — sorrio com o pensamento. — Mas eu infelizmente não sabia cozinhar um Miojo. Ia encher Allana de pizza por um mês? Não, claro que não.

Recosto-me no apoio da enorme cadeira estofada, pego o porta-retrato de Nanda, e fito seus olhos azuis e brilhantes. Minha mulher era a mulher mais linda que existiu nessa terra. Nanda era surreal. Nem parecia desse mundo. Vai ver foi isso, ela não pertencia a esse mundo sujo. Era um anjo.

Balanço a cabeça para afastar o clima triste de perto de mim e não me deixo levar. Em pouco tempo veria Allana, ela logo olharia em meus olhos e notaria minha tristeza. E se tinha algo que eu detestava era ver Allana triste. A partida precoce de Nanda me deixou extremamente cuidadoso, e preocupado com seu bem-estar. Precisei me policiar demais para não trancá-la em uma redoma e até hoje trabalho isso em mim. Nanda faleceu Allana tinha quatro anos, já tinha consciência e sente a falta da mãe, então eu tento supri-la de todas as maneiras possíveis. Minha filha é minha maior riqueza, tudo o que eu tinha de mais precioso.

Entro em meu apartamento e encontro minha princesa no tapete com o caderno no colo, Suzi a "babá" disfarçada, — Allana diz que não é mais criança, não precisa de babá. — acompanhando tudo de perto, e o cheirinho da comida de Tia me desejando boas-vindas!

— Oi, pai! — Allana corre ao me encontro e me dá um abraço apertado.

— Oi, princesa! Como foi seu dia? Como vai com esse dever, aí?

— Eu já terminei, é matemática, tiro de letra! Meu dia foi bom! E o teu???

— O meu foi muuuuito ruim porque eu não estive com minha princesa, mas agora melhorou cem por cento! — eu brinco e ela ri me mandando parar de mentir. — Como vai, Suzi? Tudo bem por aqui? — me aproximo da jovem cansada que vestia branco de forma padrão devido às regras do condomínio, e ela tenta sorrir.

— Graças a Deus, seu Vicente! Está tudo muito bem! Já que o senhor chegou, eu vou indo! Tô super cansada. Dá uma beijoca aqui, Lana!!! — Suzi agarra Allana que agora fingia tentar fugir de seu "abraço de urso", pego o caderno da aluna nota mil em matemática só para "dar uma olhada" e deixo as duas na sala para procurar pela baiana que ia nos abandonar.

Suzi também estava conosco há certo tempo. No começo foi muito difícil Allana confiar nela, e se aproximar. Antes dela eu já havia contratado três outras babás. Duas delas começaram a me olhar de uma forma que muito me incomodou e eu dispensei, — e Allana também me ajudou na decisão quando disse não ir "com a fuça de nenhuma delas". — e a outra, não aguentou a primeira semana de teste. Allana fez um inferno tão grande na vida daquela mulher, que ela saiu correndo daqui deixando Allana com Tia e não voltou nem para receber. As outras duas arrumaram forças para aguentar as peripécias de Allana ao gamarem em mim, mas Suzi foi pacientemente conquistando o coração peludinho da pequena, e logo, ganhando minha confiança ao não me olhar com desejo. Era noiva e pelo jeito amava seu parceiro, não me olhava com aqueles olhos: a mulher certa para cuidar de minha filha sem se aproximar demais. Eu definitivamente fugia de qualquer mulher que dava sinais de que gostava do que via. Para minha vida correr bem bastava uma punheta dia sim, dia não, e eu saciava meus desejos fisiológicos, somente porque era algo que eu não podia controlar. Só havia existido "uma" mulher na minha vida, e como ela se foi, acabou.
Eu não preciso de ninguém.

A Minha Nova Diarista DEGUS - Foi RETIRADO EM 21/05/18Onde histórias criam vida. Descubra agora