New Person

14 2 0
                                    

Pov. Sam

Eu não imaginava ser mandada para um lugar tão inabitável como para onde eu estava indo. A carruagem estava com um ar frio invadindo-a pelas rachaduras em seu casco, enquanto as rodas rangiam em contato com os prováveis cadáveres que as rodas de madeira das Tiliflex teriam que se esforçar para ultrapassar.

Não sei ao certo, mas a viagem pareceu durar exatamente duas horas e alguns minutos, pois o tempo parece passar muito lento aqui dentro, pelo simples motivo de eu não conseguir enxergar o lado de fora. Eu consigo sentir as auras envolta da carruagem, implorando para eu levá-las comigo, desenterrar os seus cadáveres, e tirá-las de seu sofrimento, mas não podia fazer isso nem se eu quisesse.

— Eu poderia destruí-lo em segundos, sabia? — comentei para o metamórfico, inclinando-me para frente para poder ter uma visão mais nítida dele.

— Se o fizer minha senhorita, terá que ir andando até as tropas de treinamento. — sua voz era grave, e parecia estar com algo preso em sua goela, pois tive dificuldade de entender a frase inteira. — Há muitos cadáveres no subsolo, eu não gostaria de pisar neles.

— Nós estamos pisando neles.

— Nós não. — ele exclamou, apontando para o cavalo negro em sua frente. — O cavalo está, ele absorve todo o mal, e não deixa as almas chegarem até nós, sem o cavalo, estaríamos sobre o subsolo também.

— Eu não morrerei fácil. — disse ríspido, engolindo a seco essas palavras.

— Mas você morrerá, e sabe disso. — sua voz continuava suave, calmo como o vento que invadia minha carruagem. — Não foi para isso que foi mandada? Para morrer.

   Mandada para morrer. Essa foi a primeira vez que escuto essas palavras tão nitidamente, e não transformadas em algo em que me fizesse acreditar, que eu poderia ter qualquer chance de sobrevivência nesse lugar esquecido por qualquer Deus.

Encosto-me novamente ao banco felpudo, e me pego analisando as pequenas rachaduras no casco, que davam uma imagem desfocada do lado de fora, e por ela, eu conseguia sentir o cheiro da morte, o cheiro que iria se impregnar em meu corpo em poucos dias. Quando eu descesse para respirar aquele ar contaminado, eu seria um deles, seria da tropa de fronte, e precisaria atingir meu potencial para sobreviver.

Nesse tempo que eu passei dentro dessa carruagem eu pude ver o lado de fora mais do que o necessário, era como o nome dizia, vale da morte, onde nem mesmo os vivos voltam. O ar era sombrio, quente e pútrido, se eu não estivesse vendo com meus próprios olhos, estaria descrevendo o inferno propriamente dito. Talvez esse lugar seja até pior que o próprio submundo.

— Chegamos, senhorita. — a carruagem parou abruptamente, fazendo-me perder um pouco do equilíbrio. — Pode se dirigir à saída, e cuidado a onde pisa, o chão contém olhos.

Ao fim daquela frase, a parede que revestia o casco da carruagem se rompeu, abrindo-se lentamente em direção para cima, mas ainda em contato com a carruagem. O lado em que eu estava rompeu-se em um estrondo, criando uma pequena escada de ferro escuro sobre meus pés, logo embaixo de onde estava a suposta porta.

— Agradeço por ter me trazido até aqui. — respondi calmamente, tentando evitar qualquer som de ironia que saia da minha voz.

— Suas malas já foram encaminhadas para o seu aposento. — disse brevemente. — Estou sempre ao seu dispor, senhorita. — respondeu o metamórfico, inclinando-se em direção de onde eu estava, e eu pude ver seus olhos. Metamórficos não deixam ninguém ver seus olhos. — Quando precisar da minha ajuda, clame por meu nome, e eu a atenderei.

Guerra entre corações Where stories live. Discover now