III

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As ruas do centro da cidade estavam em polvorosa. Pessoas fantasiadas de todos os tipos de coisas subiam e desciam pelas alamedas, carregando sacolas de doces e dando risada. Crianças vestidas de fantasmas, vampiros, princesas e até mesmo de pizza já haviam sido avistadas nas casas ao redor, batendo e gritando "doces ou travessuras!" somente para receber mais chocolate.
Mas a casa da frente estava quieta. Marcos olhava ocasionalmente pela janela tentando ver alguma movimentação - discussão entre o casal, uma porta batendo, um carro saindo - qualquer coisa que comprovasse que eles haviam saído para as festividades que não aconteciam muito longe dali.
De repente o ronco do motor se fez ouvir. Ele correu a tempo de ver o carro de César sair da garagem e partir, e o rapaz teve o vislumbre da cortina do segundo andar se mexer. Bingo, eu sabia! Pensou, saindo pela porta da frente e cruzando a rua até a residência vizinha.
Não havia som nenhum ali dentro. Marcos tentou abrir a porta, mas percebeu ela trancada. Quem sai e tranca a esposa dentro de casa?! Ele deu a volta e entrou no quintal depois de pular o muro, torcendo para que a porta dali - se ela existisse - estivesse destrancada. Encontrou um alçapão para o porão, uma estrutura de madeira antiga, originalmente na casa pelo que percebeu. Ele puxou uma das portas e ela se escancarou com um alto ranger.
— Helena? – perguntou ele uma vez dentro da casa. A sala de estar era simples, um sofá de três lugares, uma TV, alguns porta-retratos pelas paredes é um tapete. – Eu sei que você está aí.
Marcos deu uns passos hesitantes na escada e parou para escutar. Nenhum som vinha do andar de cima, mas ele tinha certeza que tinha visto o movimento na cortina. Sentia que Helena não estava lá porque queria, era a única explicação que sua mente produzia, e precisava tirar ela de lá. Uma vez resgatada, chamaria a polícia e prenderiam César.
O rapaz caminhou pelo corredor do segundo andar, alerta a qualquer barulho. Virou a primeira maçaneta e encontrou o banheiro; na segunda porta, um escritório. Na terceira, que ele supôs que era do quarto, estava trancada. Ela está aí. Girou algumas vezes, deu com o ombro na madeira e ela cedeu, fazendo tropeçar para dentro e cair no chão.
Estava um breu só dentro do quarto e ele tateou sem rumo atrás de um abajur. Um cheiro de hospital invadia seu nariz, como se o cômodo tivesse sido esterilizado várias vezes.
— Você nunca ouviu o ditado que a curiosidade matou o gato? – Marcos ouviu a voz de Helena não muito longe.
— Graças a Deus você está bem!
— Por que você não fica para tomar um chá? – perguntou ela, dessa vez a voz mais mecânica de costume e arrastada.
— Onde você está? – Ele sentiu um tecido como uma cortina e puxou-a com força, deixando a luz da lua do lado de fora inundar o quarto.
Peles. Por todos os lados.
Marcos tentou conter a bile, mas vomitou mesmo assim, caindo de joelhos com a força de sua ânsia.
O quarto era repleto de peles humanas.

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