Poças de Chuva

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Estava a chover, aquela chuva miúda, que só molha ao fim de um bocado. Um rapaz seguia pela rua. Era de estatura média, uasava uma gabardina só ligeiramente mais preta que o cabelo ensopado.

Pisava as poças que lhe apareciam, só porque podia, antes que a água escoasse pelo passeio. Pensava, como todos os dias no seu caminho para casa, na vida e nas questões que lhe assombravam o dia e a alma.

A água escorria pelos toldos das lojas á beira da rua, som que lhe dava uma sensação boa, pois gostava dele. Punha-lhe sempre um ligeiro sorriso nos lábios ouvir a chuva a cair.

Seguia este rapaz, por esta chuva que lhe escorria pela gabardina pensando na vida, e em como ela era uma merda no sentido em que se recusava a apresentar-se perfeita e como ele queria ( pensamento infantil, mas que o assaltava por vezes), e no qual ele achava resumir as causas da infelicidade da vida do homem. Passavam carros na estrada molhada, fazendo voar lençóis da água para o passeio, lençóis que se transformavam em poças que ele pisava antes que escoassem.

Seguia assim no seu caminho para casa a passo, sem pressa, mas sem vagar porque a chuva estava a aumentar de intensidade até que reparou naquilo. Um pequeno brilho prateado dentro duma poça, que lhe saltara aos olhos por um segundo. Aproximou-se... não era lá uma grande poça, se não fosse por aquele brilho nem se teria aproximado para a pisar. Era pouco funda, como uma poça deve ser, e aquilo que causava o brilho era uma chave dentro de água. Uma chave daquelas que parecem antigas, em latão com ornamentos, só que esta chave tinha algumas particularidades. Aquilo que vira fora sem dúvida um brilho preteado, mas dava para ver que a chave não era polida. Devia pegar-lhe? Decidiu que era melhor e assim fez, abrigando-se depois debaixo de um toldo de um dentista para examinar melhor o achado tão invulgar. A primeira coisa que fez foi confirmar que aquela chave não brilhava de maneira nenhuma em que a luz, pouca que havia na rua, lhe desse. A segunda coisa que reparou foi que era leve, apesar de parecer ser em ferro ou latão, como as chaves antigas, e....mais uma coisa, não era fria apesar de ter acabado de sair de uma poça de água de chuva gelada....grande mistério!

Fosse como fosse tinha que chegar a casa, por isso fechou a chave na mão e seguido o seu caminho como antes, mas agora interrogando-se de onde possivelmente viria ela. Chegou à porta de casa, a chuva parara, finalmente. Abriu a porta, entrou em casa, despiu a gabardina ensopada, e a meio do ato de a pendurar, houve um pormenor que lhe parou o movimento e lhe fez saltar uma palpitação do coração, vindo-lhe de repente uma questão á cabeça " como entrei eu em casa?". Ficou nesta posição pir uns cinco segundos com esta questão a ressoar bá cabeça.

Por fim, num impulso como que um choque eléctrico, pendurou a gabardina, e levou a mão ao bolso das calças. As chaves de casa estavam lá, intocadas, secas e frias como o metal deve estar. Na outra mão sentia a chave.

A chaveOnde histórias criam vida. Descubra agora