Intense

Prólogo

Dia do último teste.

O tão esperado dia havia chegado. Eu tinha me preparado durante toda a minha vida pra conseguir aquele cargo, mas mesmo assim me sentia um pouco insegura. Só conseguia pensar em meus pais, se caso eles ainda estivessem vivos, e no quanto eles ficariam orgulhosos se eu conseguisse de fato aquele emprego. Pois foram eles que colocaram este sonho dentro de mim e o alimentaram com o passar dos anos. Depois da morte trágica deles, o mínimo que eu poderia fazer era passar no teste final e ocupar o lugar que eles tanto sonhavam pra mim.

Lembro-me de ter descido até o salão principal, onde todos os outros já aguardavam pelo momento que finalmente decidiria o futuro deles assim como o meu, e me sentar na poltrona que indicava o meu nome. Depois de cerca de 30 minutos um homem, de blusa e saia escuras, subiu ao palco, porém, apenas por um breve momento para informar que os testes começariam às 16h naquele dia. Cheguei a pensar que poderia até ser um teste de resistência. Não consigo lembrar exatamente que horas eram, mas talvez faltassem umas 2 ou 3h, pois eu decidi levantar e me dirigir até o banheiro no andar superior, para que pudesse ter alguns minutos sozinha e tentar acalmar a ansiedade que já estava começando a crescer dentro de mim.

Depois disso, a única coisa deste dia que continua nítida em minha mente foi o instante em que conheci Benício e algumas das coisas que aconteceram depois disso. Portanto, vou relatar isto com a maior riqueza de detalhes possível, pois eu já sou capaz de ter certeza que este mundo acabará por tirar até estas lembranças de mim.

No instante em que eu entrei no banheiro fui capaz de sentir a energia que aqueles olhos azuis depositaram em meu corpo. Água. Senti como se estivesse tonta... Fraca o suficiente até para não conseguir ficar em pé. Ele andou em minha direção e me pegou em seus braços antes que eu caísse.

"Você está bem?" Eu simplesmente não conseguia pronunciar nenhuma palavra. Ele era lindo. Até hoje eu não sei como descrevê-lo. Mas se existissem anjos, ele provavelmente seria o mais belo de todos. O contato entre nós parecia me apagar e ao mesmo tempo me ascender como nunca havia acontecido antes. Eu não podia perder a cabeça, não hoje.

"Fogo." Quando finalmente consegui falar, ele imediatamente me colocou sobre um banco e se afastou. Neste momento eu percebi que estávamos sozinhos no banheiro. Não havia mais ninguém ali e não parecia haver mais ninguém em nenhum outro lugar. Éramos só nós dois. As únicas vidas em todo o universo.

"Me desculpe. Eu não percebi... Hã, eu não sabia. Não sabia que você não sabia controlar ainda. Desculpe." Ele parecia nervoso, talvez até impaciente. Mas aquilo me ofendeu, pois é claro que eu sabia controlar as nossas diferenças. Eu me preparei a vida inteira para um cargo no Reino, isso exigia, principalmente, que eu soubesse controlar tudo.

"Eu sei controlar. É que com você foi diferente." Depois que eu terminei a frase foi impossível não notar um sorriso nos lábios dele, por mais que ele tentasse disfarçar. Aquilo fez uma onda de calor percorrer cada centímetro da minha pele, no mesmo instante em que o mesmo aconteceu com ele. Nós tivemos uma ligação diferente e profunda desde o primeiro minuto.

Lembro que conversamos por mais alguns minutos, até que ele me convidou para beber alguma coisa, já que ainda faltava muito tempo até o início dos testes. Então fomos até o bar e ficamos lá por algumas horas. Porém, o clima da nossa conversa esquentou novamente e acabamos indo parar em um dos quartos daquele enorme prédio. Depois disso as minhas memórias começam a se embaçar um pouco. Só consigo lembrar que quando retornamos ao salão principal tudo estava escuro e não havia ninguém lá. Eu havia perdido o teste final e ele também, mas não tinha nada que eu pudesse fazer para reverter aquilo. Eu estava flutuando e ele estava bravo, muito mais do que eu, talvez estivesse colocando a culpa de tudo em cima de mim. Apesar de eu não conseguir lembrar, tenho a sensação de que alguma promessa foi quebrada entre nós. Mas agora, esta é a minha última lembrança daquele dia.

Sinto falta do mundo em que nasci e de todas as suas peculiaridades, mas não houve um momento em que eu me arrependesse de minhas escolhas. Proteger ela está acima de tudo.

Diário de S. R. V.