CAPÍTULO ZERO

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Sofri um acidente quando eu tinha cinco anos. Perdi meus pais nesse acidente. Quando acordei, estava numa cama de hospital... E as únicas coisas que me lembro são a expressão de preocupação da minha vó, que veio me ver e... Um calor que parecia queimar meus ouvidos e garganta.

"Um celular? Ah, mas acho que este aqui não vai dar..."
O galpão de coisas usadas e normalmente quebradas atrás do meu colégio era meu lugar preferido. Minha tarefa diária era encontrar objetos que poderiam ser consertados para que eu levasse para casa para o fazer.
Sempre gostei de consertar as coisas quebradas. E se alguém precisasse das coisas que eu consertasse, dava a elas sem hesitar e com um sorriso no rosto. "Algo que eu consertei ajudou alguém; fez alguém sorrir." Só isso já me consolava. Sentia que mesmo alguém como eu tinha valor. Me sentia feliz.
"É... Esse celular não vou conseguir consertar. E também nem tenho peças para isso... - pausa - Um celular... Hoje em dia quase todos têm um desse, são mais raras as que não possuem..."
Para dizer a verdade, eu também queria ter um celular, como todos. Mas desde que sofri o acidente, o meu mundo perdeu os sons. Alguém como eu, não teria como conversar com alguém direito, então... Ter um celular seria um tanto inútil. Eu sempre desistia da ideia me convencendo disso. Mas... No fundo, nunca me convencia de verdade.
Queria conversar. Não só através das letras e das mãos, mas com minha voz. Com minhas palavras. Queria conversar com as pessoas! Quando as pessoas estão conversando na sala de aula da minha classe, rindo ou apenas discutindo da matéria aparentemente, eu sentia isso mais forte ainda. Esse sentimento se espalhava no meu coração como se fosse uma mancha... E ficava sem saber como lidar com ele. Chorei muito já. Mas não poderia pensar que, magicamente, tudo iria voltar e eu poderia gritar e abraçar meus pais, dizendo-lhes quanto os amo com minha palavras, e ter amigos para conversar com minhas palavras.
E assim, sem perceber, passei a ficar imaginando um celular na minha cabeça por um tempo. Como seria. Cores. Toques. Tudo. Acho que tentei suprir o meu sonho impossível através da minha grande imaginação. Mas... Se um dia alguém pudesse realmente conversar comigo, que possa ouvir minha voz.

"♪ ♬ ♪ ♪"

"Mas o que!??"

- A-Alô?
- A minha voz... Pode ser ouvida por você? Você consegue a ouvir...?

Notas finais da autora:
Depois de ler a história,  sugiro que ligue para alguém especial para você.

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