— Não dá pra chamar ela de mulher. — ouvi dizerem sobre ela, uma vez.
— Não mesmo. — concordei, sem concordar.
O problema é que não dava mesmo. Se vestia como mulher, usava batom como mulher. Dançava, comia, até tinha profissão de mulher. Secretária de um importante empresário. Mas se tinha algo que ela não era, essa coisa é mulher.
— Mulher de verdade não faz isso que ela faz.
Eu sabia que ela ouvia aquelas coisas. Sabia por sua reação. Revirava os olhos, bebia outro gole de vodka, outra dose de tequila, acendia outro cigarro. E aquelas coisa a tornavam menos mulher cada vez mais.
Talvez ela devesse usar vestidos mais curtos, batons menos vermelhos e olhar para o chão mais vezes. Aí sim ela seria mulher.
Mulher MULHER mulher mulher MULHER MULHER. Mu—lher.
Virgínia, seu nome, mas podia muito bem se chamar Capitu.
— Você dormiu com aquele cara lá também? Aquele do...
— Não. Com ele, não.
— Duvido.
— Não dormi com ele.
— Aposto que vai dar pra mim também.
— Não quero. Não vou.
— Tá mentindo.
Nunca acreditavam nela.
Uma vez, perguntei:
— Você não acha que deveria transar com menos pessoas?
Trabalhávamos na mesma empresa. Era final de dezembro. Com um gorro vermelho na cabeça, respondeu:
— Não.
Grande homem, aquela mulher. Devia ter nascido com um pau pendurado no meio das pernas, aí seria usada de exemplo. Deu azar, nasceu com um buraco.
Deixe—me falar sobre os buracos. Virginia (Capitu) tinha três. Conheci um deles. Não era algo para se orgulhar. Todo mundo ali conhecia ao menos um. Aqueles buracos eram famosos. Pontos turísticos da cidade. Virginia (Capitu) gostava de estrangeiros e eles gostavam dela.
Um dia, Virgínia (Capitu), foi pedida em casamento por um americano. Ela recusou.
— Eu mal te conheço. Não quero me casar agora.
Na frente de toda a empresa, o americano atirou o buquê de flores no rosto de Virgínia (Capitu).
— Deveria aceitar. Que outro homem vai te querer? — disseram. — Já se deitou em tantas camas...
Virgínia correu atrás dele, o americano. Seus dedos finos apertando as flores, seus cabelos voando. Em três meses estava casada. A partir daí, sempre aparecia com marcas roxas nos braços. Nunca separou.
Em seu enterro, disseram:
— Foi uma grande mulher...
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Grande homem, aquela mulher
Historia CortaPorque uma mulher nunca é mulher quando é livre.