Seu aspecto era sujo.
O macacão marrom encardido com várias manchas pretas, deixava sua aparência ainda mais asquerosa.
Isso deve ser graxa. Suas unhas devem ser todas sujas de graxa e seu cheiro deve ser horrível, insisti.
— Melissa, você ainda não está pronta? Vamos nos atrasar! Acelera o passo, minha filha!
Calcei as botas, peguei minha bolsa e, relutante, puxei mais uma vez a cortina para vê-lo. Dante já estava abraçando-a por trás, deixando suas mãos explorarem o corpo saliente da mulher.
Passei a mão no pescoço a fim de controlar um suor que rapidamente brotava. Não estava funcionando a "técnica do oposto" que vi na internet, pois nesse momento, eu só conseguia pensar que Dante poderia estar alisando meus longos cabelos castanhos, ou apertando meu corpo com força, deixando marcas vermelhas pela minha pele muito clara. O imagino apreciando meus olhos verdes e passando seus dedos pelo desenho da minha boca. Mordo os lábios sentindo o desejo crescer.
— Melissa!
Assustei-me com o grito que me fez fechar as cortinas rudemente. Apressada, busquei com o tato meus fones de ouvido na enorme bolsa que carregava. Mamãe, segurando a porta do elevador, já me lançava aquele olhar tão característico de desespero; ela odiava atrasos e adorava sermões. Elevadores eram perfeitos para o último. Aumentei a música de Janis Joplin no celular e esperei descer os 3 andares mais lentos do universo.
Precisava tirá-los da cabeça.***
— Parabéns, meu filho! Que missa mais linda! Estamos muito orgulhosas de você.
— Valeu, mãe.
— Daqui a alguns anos já é você, hein?
Pego a caixinha de água de coco na geladeira e me sirvo do liquido gelado.
— Alguns é bondade da senhora, mãe. São muitos. Meu Deus! Muitos!
— Passa rápido! Já está no segundo ano da faculdade, meu bem, e na sua residência você já estará trabalhando, ganhando seu próprio dinheiro, sendo uma médica de verdade! — diz com entusiasmo.
— Doutora "suvaco de bode"! Quem diria, heim?
— Quem diria você, "bafo de cobra"! Engenheiro, heim? Não dava mais que professor de matemática do 6º ano. — Brinco.
— Agora pegou pesado. — diz meu irmão, colocando a mão no peito e fingindo indignação.
Sorrimos um para o outro antes que mamãe começasse seu sermão sobre "Deus habita num lar de paz - parte 34".
— Não me comessem com essas provocações. — Mamãe se levanta do sofá com os sapatos na mão e pára na entrada do corredor. — Como eu estava falando, o tempo passa rápido. Olhe só para o Junior! Parece que foi ontem que você começou a faculdade, não é filho?
— Não é bem assim, dona Karen. — responde meu irmão, vestindo suas proteções de pilotagem. — Na verdade, pareceu uma eternidade, Mel. Cinco anos de puro inferno.
— Viu, só? — provoquei mamãe.
Junior sorriu pra mim e jogou a mochila nas costas, enquanto mamãe fazia cara feia e resmungava como de costume.
— ... depois ela desanima! A Melissa precisa do nosso apoio, Junior! Não entendo como você pode ir trabalhar hoje. No dia da sua missa de formatura? Esse moto táxi se aproveita de você, isso sim! Quando sai o resultado daquela vaga...
Não cheguei a ouvir o resto do monólogo porque já estava com os fones de volta ao seu melhor lugar. Mandei um beijo para meu irmão e fui para o meu "lar sagrado".
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Entre Cortinas | Conto
Historia CortaPequenos fragmentos do dia a dia de seu vizinho foi o suficiente para deixar Melissa completamente apaixonada. A garota observa o casal há bastante tempo e começa a lhe incomodar o fato de saber quase que exatamente a hora que saem, chegam, comem ou...