Filosofia Marxista

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"O tempo é o campo do desenvolvimento humano"
(Karl Marx)

Tendo como base Demócrito e Epicuro, que evidenciavam o materialismo, e Heráclito que falava sobre a dialética (do grego, dois logos,duas opiniões divergentes). Marx defendeu o materialismo dialético, visando superar o pensamento de Hegel (GeorgnWilhelm Friendrich Hegel - 1770/1831 -, último filósofo clássico alemão, autor do esquema dialético, no qual o que existe de lógico, natural, humano e divino, oscila perpetuamente entre a tese e a antítese, até chegar a uma síntese mais rica) e Feuerbach (Ludwig Andreas Feuerbach - 1804/1872 -, filósofo alemão, aluno de Hegel, reconhecido por sua teologia humanista, que prega a religião como forma de alienação que projeta os conceitos do ideal humano em um ser supremo.
Ao estudar os três filósofos da Antiguidade, Marx concluiu que por meio de seus conceitos, eles apontavam um novo caminho, que aperfeiçoado, poderia demonstrar novas fórmulas de encarar a realidade. Demócrito (provavelmente, ele viveu entre 460 e 370 a.c), considerado um dos escritores mais fecundos da Antiguidade, nasceu em Abdera (colônia jônica da Trácia).
Estudioso da matemática e física, teve uma cultura semelhante à de Aristóteles, foi discípulo e sucessor de Leucipo, na direção da escola de Abdera. Entre suas muitas viagens, chegou a Atenas, onde seu pensamento foi ignorado por muito tempo. A filosofia de Demócrito reside num materialismo mecanicista atomista, que foi reformado mais tarde por Epicuro e Lucrécio. Segundo Demócrito, a natureza é composta de vazios e átomos, partículas materiais indivisíveis, eternas e invariáveis. "Nada nasce do nada", escreveu o filósofo, que acreditava que tudo se encadeia, necessariamente; os corpos nascem de combinações de átomos e desaparecem pela separação dos átomos. A alma é feita de átomos e o conhecimento sensorial deve-se à emissão, pelos objetos, de substâncias muito finas que agem sobre os sentidos. Por sua vez, Epicuro foi discípulo de Pânfilo na juventude, e mais tarde de Nausífanes. Fundou uma escola no jardim da sua casa em Atenas (306 a.c) e, ao invés de reunir seus ouvintes numa palestra, passava o dia familiarmente com eles. Epicuro creditava à Filosofia uma função terapêutica - na falta de liberdade política, à filosofia grega volta-se à investigação da condição humana - buscando encontrar uma explicação mais plausível para desgraça. Epicuro acreditava que sábio é aquele que busca conquistar a liberdade e independência interior e que a tarefa da filosofia é a de mostrar aos homens, os meios para atingir a felicidade. Nos ensinamentos de Epicuro é excluida qualquer explicação metafísica da realidade, ele não procurava nada nem invocava outra origem das coisas, além da natureza.
Herdeiro da tradição atomística de Leucipo e Demócrito, também afirmava que na Física, os átomos são os únicos seres dos quais podemos ter certeza, para explicar a múltipla variedade das coisas e do seu fim, pela combinação dos mesmos. Já na filosofia Canônica, sua teoria do conhecimento faz da evidência um índice de verdade e fonte única de todo saber, que não pode conter engano, pois apenas o juízo e o raciocínio que fazemos dele é que pode errar. Constata que os homens são infelizes por temerem os deuses e pelo medo do futuro ao detectarem a morte como algo inevitável. Porém, para Epicuro, a filosofia não é a pura reflexão sobre a morte, porque ela só existe enquanto vivermos e já não existe quando morremos.
Heráclito era natural de Éfeso, cidade grega que tinha sofrido o domínio persa. Entre as doze cidades jônicas que formavam o chamado "dodecápolis", Éfeso, destacava-se pelo seu enorme templo dedicado à deusa Ártemis. Heráclito, segundo a tradição, pertencia à alta aristocracia. Ele renunciou ao trono de rei em favor do seu irmão. Revelou um grande desprezo não apenas pelas multidões, mas também por todas as formas de pensamentos tradicionais, afirmando-se como crente numa verdade universal, o logos (a nossa razão e a razão de tudo o que existe), acessível a todos sem qualquer iniciação ou ritual. Devido á forma enigmática como se expressava, na antiguidade, ficou conhecido como "O Obscuro" ou "O que fala por enigmas".
No início de sua atividade filosófica, Marx dedicou-se a Hegel com tal paixão que se assumiu como hegeliano, tanto que definiu o pensamento do mestre como a "filosofia atual do mundo". Posteriormente, influenciado por outros conhecimentos, começou a criticar a concepção de história de Hegel, por acreditar que ela não era uma mera seqüência casual de acontecimentos, mas um suceder racional que se desenvolve segundo princípios que emanam a partir de uma dialética interna.
Marx começou a seguir o caminho da dialética do idealismo (doutrina filosófica que nega a realidade individual das coisas distintas do "eu" e só lhes admite a idéia) e da dialética do materialismo (que é a posição filosófica que considera a matéria como a única realidade e que nega a existência da alma, de outra vida e de Deus). Ambos os caminhos sustentam que realidade e o pensamento são a mesma coisa ou que as leis do pensamento são as leis da realidade. A realidade é contraditória, mas a contradição supera-se na síntese que é a "verdade" dos momentos superados. Enquanto Hegel considerava ontologicamente (do grego onto+logos; parte da metafísica, que estuda o ser em geral e suas propriedades transcedentais) a contradição (antítese) e a superação (síntese), Marx considerava históricamente a contradição de classes vinculada a um certo tipo de organização social. Se Hegel apresentava uma filosofia que procurava demonstrar a perfeição do que existia (divinização da estrutura vigente), Marx apresentava uma filosofia revolucionária que procurava demonstrar as contradições internas da sociedade de classes e as exigências de superação.
É certo que a dialética materialista foi introduzida por Ludwig Feuerbach para combater a doutrina hegeliana, que apesar do método revolucionário era eminentemente conservadora. Da crítica a dialética idealista, Feuerbach partiu para a crítica da Religião e da essência do cristianismo. Ele pretendia trazer a religião do céu para a terra, invertendo os papéis, ao invés de existir um Deus que criou o homem à sua imagem e semelhança, com seu pensamento, ele induzia a idéia de que o homem criou Deus de acordo com suas próprias necessidades. Dessa forma, Feuerbach conservava os valores morais da religião e em toda a humanidade, o homem seria o Deus para o seu semelhante.
Mesmo sendo adepto da dialética hegeliana, Marx, rejeitou, como Feuerbach, o idealismo, mas, ao contrário, não procurou preservar os valores do cristianismo. Se Hegel tinha identificado, segundo Radbruch (Gustav Radbruch - 1879/1949 -, representante da Filosofia dos Valores de origem neokantiana), o "ser" e o "deve-ser", encarando a realidade como um desenvolvimento da razão e vendo no "deve-ser", o aspecto determinante, o correto seria prevalecer o aspecto determinado por essa unidade.
Na dialética marxista, postulava-se que as leis do pensamento correspondem às leis da realidade. A dialética não é só pensamento, ela é pensamento e realidade a um só tempo. No entanto, a matéria e seu conteúdo histórico ditam a dialética do marxismo, já que a realidade é contraditória com o pensamento dialético. Percebe-se que contradição dialética não é apenas uma contradição externa, mas a unidade das contradições: "a dialética é a ciência que mostra como as contradições podem ser concretamente (isto é, vir-a-ser) idênticas, como passam uma outra, mostrando também porque a razão não deve tomar essas contradições como coisas mortas, petrificadas, mas como coisas vivas, móveis, lutando uma contra a outra em, e, através de sua luta" (Henri Lefebvre, Lógica formal / Lógica dialética, tradução de Carlos N. Coutinho, 1979, p. 192). Portanto, os momentos contraditórios são situados na história com sua parcela de verdade, mas também de erro; não se misturam, mas o conteúdo, considerado como unilateral é re-captado e elevado a nível superior. Mas Marx também acusava Feuerbach, afirmando que seu humanismo e sua dialética eram estáticas: "O homem de Feuerbach não tem dimensões, está fora da sociedade e da história, é pura abstração". E concluía que era indispensável compreender a realidade histórica em suas contradições, para tentar superá-las dialeticamente, principalmente, porque a dialética apregoa, de acordo com seus princípios, a materialidade do mundo; que tudo se relaciona (lei da ação recíproca e da conexão universal); tudo se transforma (lei da transformação universal e do desenvolvimento incenssante); que as mudanças qualitativas são conseqüências de revoluções quantitativas; que a contradição é interna, mas os contrários se unem num momento posterior, em conseqüência da própria luta que é o motor do pensamento e da realidade; a anterioridade da matéria em relação à consciência, e, a vida espiritual da sociedade como reflexo da vida material.
Marx também contrariava Hegel, que enfatizava que a realidade tinha de ser entendida a partir de um espírito absoluto, por acreditar que isso não passava de um injustificado "misticismo", que colocava a filosofia a partir de um ponto acima da realidade factual. Contrapondo-se ao pensamento hegeliano, Marx ressaltava que a realidade do mundo não devia ser explicada com base em uma realidade divina, mas que o ponto de partida do pensamento tem que ser a realidade concreta, de cunho ateísta: "A missão da história é, após o além da verdade ter desaparecido, estabelecer a verdade do aquém."
Quando Hegel afirma que a realidade estaria conciliada com a razão, segundo Marx, ele não poderia ter em vista a realidade concreta, já que em sua teoria tudo se passa no âmbito do mero pensamento. "Mesmo a realidade sobre a qual Hegel fala, é a mera realidade pensada. A realidade factual mostra-se contraditória, inconcebível e não conciliada com a razão", dizia.
Marx acreditava que todo o empenho filosófico de Hegel voltava-se para o fracasso porque ele não tinha sido capaz de incluir essa realidade efetiva em seu pensar, por mais abrangente que tivesse sido: "O mundo é portanto um mundo dilacerado que se opõe a uma filosofia fechada em sua própria totalidade." Além disso, ele dizia que a realidade concreta é a realidade do homem:"As pressuposições com as quais iniciamos são os indivíduos reais."
A filosofia como Marx postula, pode ser definida como "humanismo real", - em contraposição a Hegel e em concordância com Feuerbach -, que é na filosofia da existência humana:"A raiz do homem é o próprio homem', ou 'o real primeiro e originário para o homem é o primeiro homem, e é dele, portanto que o novo pensar também tem de partir."
Em seu pensamento Marx não considera o homem, como fazia Hegel, essencialmente a partir de sua faculdade de conhecer. Ao contrário, evidenciava sua ação concreta: "Parte-se do homem real que age. No práxis (prática), o homem tem de comprovar a verdade, isto é, a realidade, o poder e a mundanalidade de seu pensamento". Se Feuerbach concebia o homem como indivíduo isolado, Marx ressaltava com toda clareza que o homem sempre viveu em uma sociedade que o superava:"O indivíduo é o ser social. O homem, isto é, o mundo do homem: Estado, sociedade".
Tomando a natureza social como ponto de partida para toda reflexão subseqüente, Marx dizia: "Não é a consciência do homem que determina seu ser, mas é seu ser social que determina sua consciência." Para ele a sociedade humana se constitui basicamente, não por meio da consciência comum, mas por meio do trabalho comum, já que o homem é originariamente um ser econômico. As relações econômicas e particularmente as forças produtivas a elas subjacentes são a base (ou a infraestrutura) de sua existência. Apenas na medida em que essas relações econômicas se modificam, também se desenvolvem os modos da consciência, que representam a "superestrutura ideológica". Desta superestrutura fazem parte o Estado, as leis, as idéias, a moral, a arte, a religião e similares. Na base econômica reencontram-se também as leis do desenvolvimento histórico, como as que Hegel atribuiu ao espírito. As relações econômicas desdobram-se de modo dialético, mais precisamente, no conflito de classes, já que a história, nada mais é do que lutas de classes.
É fácil perceber que até aqui, só há teorias antropológicas e histórico-filosóficas, que demonstram que a filosofia é bastante rica, em suas mais diversas interpretações. Então, porque, as palavras de Marx são tão estimulantes? A resposta é simples, Marx não se restringiu ao âmbito do pensamento puro, ele empregou suas teorias e trabalhou decisivamente para transformar da realidade: "Os filósofos têm apenas interpretado diversamente o mundo; trata-se de modificá-lo."
Marx, além de empreender uma crítica ao seu tempo, também observou que em seus dias, a verdadeira essência do homem, sua liberdade e independência, não podiam se fazer valer. Por toda parte, as autênticas possibilidades humanas de existência, haviam se perdido, provocando a depreciação do homem, definida por ele como "auto-alienação". Segundo dizia, "essa auto-alienação finca suas raízes no produto do trabalho homem, que não lhe pertence, nem mesmo para usufruto, mas é de seu empregador".
Partindo do conceito marxista, o produto do trabalho torna-se uma mercadoria, uma coisa estranha ou alheia ao trabalhador. Marx ressaltava que: "o objeto que o trabalho produz, seu produto, apresenta-se a ele (trabalhador) como uma essência estranha, como um poder independente do produtor". E da mesma forma, o trabalho também se torna um "trabalho alienado", não imposto pela simples autoconservação do homem; mas torna-se, em sentido próprio, num "trabalho forçado". Esse aspecto, segundo Marx, atinge sua culminância no capitalismo, no qual, o capital assume a função de um poder separado dos homens.
A alienação do produto do trabalho também conduz a alienação do homem. Isso não vale apenas para a "luta de inimigos entre capitalista e trabalhador". As relações interpessoais, em geral, perdem cada vez mais a sua imediação. Elas são medidas pelas mercadorias e pelo dinheiro, "a meretriz universal". Os próprios proletários assumem o caráter de mercadoria; sua força de trabalho é comercializada no mercado, que se encontra a mercê do arbítrio dos compradores. Seu "mundo interior" torna-se "cada vez mais pobre"; sua "destinação humana e sua dignidade" perdem-se cada vez mais. O trabalhador é "o homem extraviado de si mesmo"; sua existência é "a perda total do homem"; sua essência é uma "essência desumanizada".
Em sua época, Marx crê poder demonstrar que, no ápice desse desenvolvimento, tem de sobrevir a guinada, que segundo ele, se torna possível desde que o proletariado se conscientize da sua alienação e compreenda, como "a miséria consciente de sua sua miséria espiritual e física, a desumanização que, consciente de sua desumanização, supera por isso a si mesmo". Segundo os prognósticos de Marx, a sociedade chegaria a uma concentração do capital nas mãos de poucos, a um crescente desemprego e empobrecimento das massas. Nesse momento, o capital iria se tornar seu próprio coveiro, já que estabelecida essa concentração se seguiria, segundo "leis infalíveis" - ditadas pela necessidade histórica, cientificamente reconhecidas e a dialética -, a subversão e a revolução, que teria a missão "transformar o homem em homem", para que ele se torne supremo para os outros homens.
Dessa forma se derrubaria "todas as relações em que o homem é um ser degradado, escravisado, abandonado e desprezado", para favorecer seu retorno ao "verdadeiro reino da liberdade", onde ele reconheceria "toda a riqueza de sua essência" e, com isso, superaria definitivamente a alienação.
Essa tarefa, segundo Marx caberia ao movimento comunista:"É chegado o tempo do comunismo como superação positiva da propriedade privada enquanto auto-alienação do homem, e por isso, como apropriação real da essência humana por meio dele, para o homem; por isso, como regresso - perfeito, consciente e dentro da riqueza total do desenvolvimento até aqui -, do homem para si mesmo enquanto homem social, ou seja, humano. Esse comunismo é a verdadeira dissolução do antagonismo entre o homem e a natureza e entre o homem e o homem. A verdadeira solução do conflito entre liberdade e necessidade. Ele é o enigma decifrado da história, a verdadeira realização da essência do homem. Com o comunismo, encerra-se a pré-história da sociedade humana e inicia-se a sociedade realmente humana".
Apesar de todas as teorias sobre o materialismo dialético - assim chamado porque sua teoria é materialista e o seu método dialético - terem sido uma constante no pensamento de Marx (e posteriormente de Lênin, que na verdade o constituiu como doutrina) que o concebeu como forma de superação do capitalismo, demonstrando como uma sociedade comunista deveria ser, infelismente, ele não nos deixou mais nenhuma informação adicional para colocá-la em prática, além de suas próprias palavras.

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