Depois da descoberta do chamado carvão mineral, muitos donos de fábricas começaram a usar ferramentas que eles chamam de máquinas. No início, elas foram usadas principalmente na produção e confecção de tecidos, e agora são usadas para montagem de outras máquinas e muitas outras coisas que não descreverei porque não tenho conhecimento, eu confesso.
As condições dentro dessas fábricas pareciam o inferno, literalmente o inferno. Era um calor extremo e um ambiente hostil como uma selva de metal, e os animais eram os próprios trabalhadores, sempre tentando se adaptar àquelas temperaturas altíssimas e aos perigos que estavam sempre presentes. Mas obviamente, se você não leu o prólogo, você deve estar se perguntando: "Nossa, como ele sabe de tantas coisas sobre as fábricas? ". A resposta é simples, meu caro (ou minha cara): eu vivi essas condições e tive que assistir outras pessoas vivendo lá junto a mim. Os nossos patrões eram como um atirador de elite em uma guerra, sempre de olho em cada funcionário, e se algo desse errado ele estava lá para corrigir o problema. Obviamente ele não matava os empregados, muitas vezes porque não dava tempo, pois eles já morriam em meio às condições do local onde trabalhavam.
Agora que já entendeu melhor o ambiente das fábricas e como funcionam as coisas por lá, vamos ao que interessa: o meu depoimento contando sobre como era quando eu trabalhava lá. Bem, para contar detalhadamente como tudo aconteceu eu teria que escrever uma nova bíblia, mas não tenho tanto tempo de vida assim, e mesmo que eu tivesse eu não escreveria por pura preguiça. Então, de forma curta, vou contar essa história desde os meus 18 anos, quando eu ainda vivia em Glenrothes. Ah, aquela cidade era maravilhosa – não havia tristeza nem aborrecimentos, só paz e conforto. Meus pais, Lisa e William não gostavam muito do lugar, mas ninguém podia reclamar de nada, pois tínhamos o necessário para sermos felizes e éramos com o básico. Contudo, como qualquer outro homem, nós tínhamos ambições e queríamos algo a mais. E foi esse sentimento que nos trouxe à cidade de Liverpool, onde provavelmente vou morrer.
Quando estávamos em Glenrothes, a principal desculpa da minha mãe para vir para Liverpool era porque ela queria voltar à sua terra natal e porque o trabalho aqui era muito mais fácil, uma vez que teríamos o auxílio das máquinas, mas eu sempre desconfiei que ela tinha o que eu chamo de Síndrome do Charlie Launt, também conhecida como preguiça. Meu pai, por outro lado, não apoiava essa ideia de deixar Glenrothes apenas pelo trabalho "mais fácil", mas de tanto minha mãe falar na cabeça dele acabou se tornando inevitável nossa vinda para Liverpool. Porém eu tentei, tentei e tentei de novo fazer a cabeça dos meus pais para continuarmos em Glenrothes, no entanto tudo foi em vão. Lembro de uma conversa que tivemos um dia antes de partirmos para Liverpool.
- Está decidido! Nós iremos com a carroça do seu tio Scott até Liverpool, onde ele conseguiu uma moradia provisória para nós.
- Mas mãe, não acha melhor ficarmos aqui mesmo, em Glenrothes? Temos tudo o que precisamos aqui e temos uma boa casa também. – Afirmei, tentando a convencer.
- De novo isso, Charlie? Quando vai acordar e perceber que toda a Inglaterra está se atualizando com condições de vida melhores? – Disse meu pai, em um tom de pergunta retórica.
- Eu sei disso pai, só que ainda gosto daqui, e vou ter que deixar minha melhor amiga para trás.
- O que? Aquela meretriz da Leonor não sabe fazer nada além de jogar baralho! E eu garanto que lá você conhecerá pessoas melhores, meu filho. – Exclamou minha mãe, tentando me convencer com uma cara amarrada.
- O nome dela é Eleanor, e ela é uma pessoa muito maravilhosa, mas eu vejo que você só está preocupada como próprio umbigo e com aquela cidade sem graça que é Liverpool. Eu vi que não tem como argumentar contigo, sendo assim eu vou ter que ir com vocês para aquela porcaria de lugar. – Falei, já quase me exaltando.
- Respeite sua mãe, rapaz! – Exclamou meu pai, batendo na mesa com a mão fechada.
- Acalme-se William, eu entendo o ponto de vista dele. – Disse minha mãe, tentando aliviar a tensão presente na sala. - Mas filho, essa mudança só trará benefícios para nós, entenda isso.
- Então está decidido. Lisa e Charlie, peguem suas coisas e arrumem-nas, pois ao amanhecer nós partiremos.
- Tudo bem, pai.
- Nos vemos pela manhã, Charlie.
Depois dessa conversa eu não tinha opção senão me conformar com o fato de que estaria deixando minha terra natal.
No dia seguinte, quando chegou a alvorada, todos estávamos prontos para partir. Porém, enquanto Scott não chegava, visitei rapidamente a casa da Eleanor. Eu expliquei que estava me mudando e que infelizmente nós não nos veríamos mais, e antes que eu pudesse me virar ela me puxou e me deu um abraço forte, que me fez sentir culpado por estar deixando-a. Foi durante aquele momento que eu me senti em paz, depois de todo o transtorno que havia acontecido na minha vida, e, mesmo depois do nosso abraço, eu senti que meu corpo e minha alma ansiavam por mais carinho, atenção e paz. E foi naquele momento em que nossas bocas quase se encostaram, porém sabíamos que a amizade poderia estar acabada se algo assim acontecesse naquele momento, então nós recuamos e falamos um último "tchau".
Mas voltando ao que interessa, logo depois da minha visita à casa da Ellie, eu finalmente pude retornar para a minha casa, onde recebi muitas reclamações da minha mãe, dizendo que estávamos atrasados por minha culpa.
- Charlie! Onde estava? Sabia que estamos atrasados? – Afirmou minha mãe, com sarcasmo.
- Eu estava... Ah, esqueça, vamos logo.
- Tudo pronto. Liverpool, aí vamos nós!
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Mariposa Negra: A Grande Revolução
Historical FictionCharlie, junto com a sua família, vive uma vida calma em Glenrothes, uma pequena cidade escocesa. Mas, devido à Revolução Industrial, eles são obrigados a se mudarem para Liverpool, onde acontecerão eventos que marcarão suas vidas para sempre.