A Carta

428 58 13
                                    

Sophia se sentia um pouco tola ao escrever a carta e endereçá-la, fazia anos desde a última vez que fizera um pedido ao Papai Noel, mas ele era sua última esperança. Tudo estava perfeito para o baile de Natal do dia seguinte: sua família inteira viria para o castelo e seu primeiro namorado a acompanharia na festa. Depois de 17 anos de bailes desacompanhada, Sophia tinha um par, mas também era a primeira vez que não haveria neve durante o evento. Fazia muito frio no reino, mas as temperaturas baixas vinham acompanhadas de chuva, deixando a paisagem cinzenta demais para uma época tão especial. Sophia tinha tudo para que essa noite de Natal fosse inesquecível, a única coisa que faltava era o jardim real coberto por uma espessa camada de flocos de gelo e a única pessoa que podia fazer nevar era o velhinho de roupa vermelha.

Quando a princesa fechou o envelope, percebeu que não sabia o que fazer com ele, eram seus pais que mandavam as cartas quando ela era criança. Decidiu deixa-lo na mesa ao lado da cama, se ele entrava nas casas para deixar presentes poderia muito bem entrar para pegar sua carta. Sophia deitou em sua cama e se sentiu imediatamente aquecida pela lareira, o crepitar do fogo logo deixou-a sonolenta.

Ela não soube dizer o que a despertou primeiro: o barulho de passos ao seu lado ou a brisa congelante que eriçou seus pelos mesmo embaixo do cobertor. Sophia abriu os olhos lentamente e viu que ainda estava escuro lá fora, pois a única luz no aposento vinha do fogo da lareira. Conseguiu distinguir uma silhueta a alguns centímetros de distância de sua cama e foi o suficiente para levantar e correr para a porta dupla de sua suíte. Ela estava prestes a gritar quando a figura desapareceu e uma mão fria cobriu sua boca.

— Não grite, por favor! — uma voz masculina surgiu em seu ouvido, seu hálito gelado fez cócegas no pescoço da princesa — Eu não vou te machucar, mas se você gritar vai revelar a minha identidade para o castelo inteiro.

Sophia sentiu a mão soltando-a lentamente e virou-se para encarar o invasor. Um garoto que não parecia muito mais velho que ela mesma encontrava-se com uma mistura de medo e preocupação em seu rosto. Mesmo à luz do fogo sua pele era incrivelmente pálida, ela esperava que seu nariz estivesse vermelho do frio, mas seu rosto era completamente branco. Seus olhos eram tão claros que pareciam translúcidos e seu cabelo era tão branco e desarrumado que parecia feito da própria neve. Suas roupas seguiam as mesmas cores, ele nem parecia real.

— Vou chamar os guardas!

— Você não pode fazer isso — o garoto tocou nas portas e as maçanetas congelaram instantaneamente.

Sophia estava praticamente paralisada enquanto o garoto andava em círculos pelo quarto, tentando descobrir o que fazer. A princesa tentava encontrar uma razão lógica para todos esses acontecimentos, mas não conseguia encontrar nenhuma. Decidiu que a melhor coisa a se fazer era chamar os guardas que certamente estavam do outro lado da porta. Estava prestes a gritar quando foi interrompida.

— Tudo bem, chame seus guardas. Mas eles não podem perder alguém que não existe.

Ele desapareceu e as portas descongelaram. Sophia sentia que estava ficando louca e não conseguiria dormir depois da misteriosa visita. Ela abriu as portas e todos os guardas do corredor se viraram para ela.

— Está tudo bem — ela disse antes que pudessem fazer perguntas — Só vou até a cozinha.

Sophia desceu as escadas frias do castelo enrolada em seu robe de veludo, as pantufas peludas abafaram seus passos. Ela ascendeu as luzes da cozinha e resolveu fazer um chocolate quente. Estava prestes a colocar o leite numa caneca quando uma silhueta apareceu em seu lado.

— Está mais calma?

O susto a fez bater na caneca e o leite começou a se escorrer do copo caído. Quando o garoto estendeu a mão, ela achou que ele ia tentar segurar o leite derramado, mas o líquido branco parou no ar, em estado sólido.

— Assim é mais fácil de limpar — ele pegou leite congelado e olhou para Sophia — De nada.
Ela desistiu de tentar entender a situação e decidiu acreditar que era apenas um sonho.

— O que você faz aqui? — ela perguntou.

— Você me chamou — ele pareceu aliviado e sentou na bancada de mármore da cozinha.

— Eu não te conheço. E eu certamente lembraria de alguém que pode congelar as coisas.

— Você escreveu uma carta para mim — ele tirou a carta recém escrita do bolso de seu casaco branco — e eu vim recolhe-la.

Sophia refletiu por um momento e perguntou:

— Você é o Papai Noel?

— Você está dizendo que eu pareço um velho barrigudo? — ele pareceu se divertir com a expressão confusa da princesa e explodiu numa gargalhada silenciosa — Meu nome é Jack Frost, já deve ter ouvido falar de mim.

— Um elfo que faz desenhos de gelo?

— Primeiro um velho, agora um elfo. Você está me magoando — ele desceu da bancada e começou a andar no limite das grandes janelas, por onde ele passava o vidro formava pequenos cristais de gelo — Eu prefiro ser chamado de "Senhor da Geada" ou "Mestre da Neve", até de "Príncipe do Gelo" se combina mais com você.

— Mas a minha carta foi endereçada ao Papai Noel.

— Existem vários departamentos no Natal, o velho Noel não conseguiria fazer tudo sozinho. Muita gente pede por neve e sou eu que realizo esses desejos, não que eu receba qualquer crédito por isso — ele parou de andar quando a maioria das janelas estavam congeladas e olhou para mim — Se nós formos lá fora eu posso realizar o seu.

— E como eu explicarei aos guardas que um estranho entrou no castelo de madrugada sem eles terem visto?

— Não se preocupe com isso, eles não poderão me ver — com essas palavras ele sumiu.

981 palavras

O Príncipe do GeloOnde histórias criam vida. Descubra agora