Capitulo 1: o problema começou.

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-Tia Mia! Tia Mia!

-Oi Juli, como vai princesa?

Abaixo-me a pegando em meu colo.

-Tia, esse ano vai ter festa?

-Mas é claro que vai, princesa!

-E vai ter babi?

-Bar-bi-e, Juli, é Barbie. Sim, para as princesas vão ter Barbies.

-Tia... (Juli enrola os dedos em meus cabelos enquanto deita a cabeça em meu ombro)

-Oi?

-Mamãe me disse que se tivessem mais pessoas igual você, o mundo seria melhor... Obigada por ser tão boazinha pá nós... Você é igual a princesa Elsa!

Ela tira a cabeça de meus ombros me dando um beijo molhado e pulando de meu colo, ela começa a correr, mas para e vira para trás.

- TIA, EU TE AMO!

E volta a correr.
U

ma lágrima de emoção rola pelo o meu rosto, é por crianças assim, tão doces e ingênuas, que eu me esforço todos os anos guardando a maior parte de meu salário no banco e vendendo doces, apenas para lhes fazer sorrir e ter um pouco do que eu não tive. Com apenas 2 anos eu fui abandonada no lixo, minha mãe de coração, Maria, me achou e me criou até os 10 anos, foi quando ela morreu e eu fui para um orfanato, vivi lá até meus 18 anos, desde então venho trabalhando muito e ajudando quem precisa, a 3 anos comecei a fazer estas festas beneficentes; na primeira vez participaram apenas 30 crianças e hoje, atendo 240 crianças, minha meta é chegar as 1.000, mas para isso preciso de mais dinheiro e mais doações.
Olho a hora em meu celular velho, com alguns botões quebrados, está na hora de ir trabalhar, sigo meu caminho a pé, depois de 15 min. de caminhada chego a empresa, vou até a lavanderia e tiro meu velho sobretudo ficando apenas com meu vestido amarelo ovo, uniforme da empresa, guardo minhas coisas no armário, tiro minhas sapatilhas azuis gastas e calço as botas brancas de borracha, pego o carrinho com os produtos de limpeza e penduro nele o esfregão, a vassoura, o rodo, a pá e pego um pano limpo o jogando por cima juntamente com os alvejantes, encho o balde d' água e coloco na parte de baixo do carrinho. Com tudo pronto me encaminho para o banheiro.

Depois de longas horas limpando finalmente chego a última sala, sala do nosso chefe, bato na porta abrindo-a e dou de cara com um lindo homem, acho que ele não ouviu as minhas batidas, pois quando entro ele toma um susto e derrama café quente em seu terno.

-Aí meu Deus! Precisa de ajuda?

Pego uma flanela com um pouco d'água e, ao virar, encontro o homem jogando a camisa social longe, ele passa a mão nervosamente pelos curtos cabelos negros. Perco a consciência e o encaro descaradamente, mas logo volto a realidade e coro absurdamente.

-Desculpe... Eu... Er... Eu bati na... O senhor não ouviu... Aí o senhor derrubou o café...

Minhas explicações confusas são interrompidas por uma gargalhada, eu o encaro sem entender.

-Tá tudo bem, foi distração minha...

Ele olha em meu crachá e repete meu nome numa voz melodiosa.

-Mia.

-Eu... Hum... (Desvio olhar de seu rosto parando em seu peitoral nu, envergonhada tapo os olhos com a mão) acho melhor eu lhe dar licença... Volto depois...

-Está dispensada, mas amanhã limpe primeiramente a minha sala.

Olho-o incrédula e ele faz sinal para eu sair enquanto ri, sorrio e saio dali levando o carrinho.

Ao chegar na lavanderia guardo tudo e lavo o pano estendendo-o no varal, troco de calçado e visto o sobretudo.
Já são 16:00 h, acho melhor passar no banco sacar meu dinheiro para amanhã de manhã ir comprar as coisas para a festa, devido aos papéis que tive que assinar para liberar os $9.000,00 quando saio do banco já está escuro... É um pouco perigoso andar com todo esse dinheiro, mas só tenho conta salário, então tenho de fazer tudo a moda antiga, talvez mais para frente, eu deva abrir outra conta, certamente seria mais inteligente...
Para chegar mais rápido, decidi ir por um atalho, mas assim que entro na viela, me arrependo, estava tudo tão escuro... Aperto o passo e quando finalmente chego a uma rua iluminada, respiro aliviada, mas logo o temor sou tomada por uma nova onda de temor.


-Parada aí dona! Passa a bolsa!

Em pânico eu tento correr, mas sou alcançada, tento gritar, porém os meus pulmões não colaboram, me debato desesperadamente enquanto ele me arrasta para o beco.

-Me solta! Por favor!

Peço aos prantos e como resposta recebi um soco no estômago, caindo no chão sem fôlego, me encolhi em posição fetal, abraçando minha bolsa como se ali estivesse minha vida, ele tenta puxa-la, mas apenas arrebenta a alça e enquanto me arrasta junto da bolsa, depois disso passa a levar chutes e pisões, um atrás do outro, cada impacto recibo vinha carregado de dor e cada vez mais fortes, rezei para aparecer alguém, mas ninguém veio me ajudar, sinto minha força se esvair e num solavanco ele me toma a bolsa para correr, eu não consegui...  Esse monstro levou consigo minha dignidade e, também, a esperança de minhas crianças...

Um longo tempo se passou, finalmente, depois de tanto chorar e  muito tentar consigo levantar, caminho lentamente para casa abraçada em meu corpo, por que fiz isso? Por que não abri logo outra conta? Isso não teria acontecido se eu não fosse tão tola... É tudo minha culpa!

Minha rua está vazia, sem sequer uma alma penada, quanto tempo eu passei jogada naquele chão?
Forço a janela e entro em casa, meu corpo inteiro foi transformado em dor, meu estômago está embrulhado e minha cabeça turbulenta, talvez um banho ajude... No espelho, exato meu reflexo, a cara inchada, pálida e um corte no lábio,  provavelmente mordi enquanto apanhava; ligo o chuveiro e entro embaixo da enxurrada, cada gota d'água parece uma nova pancada sobre os hematomas, minhas pernas amolecem, então me sento no chão e novamente caio aos prantos, sentindo a dor em cada parte do meu corpo e a humilhação que entranhada dentro de mim, que parecia me rasgar de ponta a ponta.
Perdida entre tantos soluços e lágrimas, nem ao menos lembro quando vim para a cama, como posso ter sido tão burra? Eu sabia que deveria ter aberto uma conta corrente! Por que não abri?? Por que fiz isso? Como vou contar as crianças que esse ano não teremos festa? Eu sou uma idiota.

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