Um desejo

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O inverno já castigava as estradas e árvores na floresta encantada, obrigando seus habitantes a usarem roupas mais quentes que possuíssem, o vento era gelado e com pequenos flocos de neve, e todo aquele cobertor branco fazia a diversão das crianças, principalmente para as de classe inferior, significava uma das poucas alegrias que podiam aproveitar. Sem se importar em ter que aguentar o frio nas roupas finas, bolas de neve voavam do lado de fora do silencioso e velho orfanato Sant Louise.

Eram raros os sorrisos que corajosamente iam brotando nas crianças, que tentavam não fazer barulho algum, no medo de ser pegas, se fossem a surra junto a falta do alimento já escasso seria a realidade da noite.

Nada naquele lugar sequer denunciava a existência de crianças, as paredes mofadas não eram tinham cor além do preto e verde junto ao o cheiro de madeira podre acompanhava o ranger do piso quase se abrindo sempre que alguém andava.

Pequenos colchões com forte cheiro de mofo residiam no chão de três quartos, formando a única decoração deles. Para que guarda roupa se só possuíam as roupas do corpo de qualquer forma. A diretora e a cozinheira eram as únicas adultas do local, ódio era pouco perto do que sentiam pelo lugar, e infelizmente para as 15 crianças, esse odio era direcionado a elas também.

Aquela fora a única casa que a pequena garota de apenas 4 anos já teve, havia herdado os traços físicos que iam desde os cabelos escuros e meio cacheados até os dedos do pé da mulher que por livre e espontânea vontade lhe negara seu amor.

Vallerie desejou poder fazer o mesmo muitas vezes, mas seu coração de menina e verdadeira adoração por sua mãe a impedia e impelia a fugir do orfanato para poder admirar mesmo de longe o rosto adorado idêntico ao seu. Nas tardes de domingo, corria pelas árvores da floresta atrás do orfanato até perto do lago para se esconder onde sabia que a tão temida Evil Queen deixaria seu precioso cavalo beber água.

Calada e escondida a pequena menina ousava sonhar em poder ser abrigar nos braços da mulher a quem dedicava tanto amor.

Não podia evitar nem tão pouco tinha uma razão para amar Regina, só amava de forma incondicional, e continuaria amando mesmo que nunca tivesse seu amor correspondido. No fundo seu coração torcia para que tanto amor por sua mãe fosse o bastante para lhe tornar o mais distante possível do monstro que era seu pai. Da aberração que cometera.

Era inevitável ficar imaginando como seria poder chama-la de mãe e receber um sorriso carinhoso em troca, mesmo sabendo que jamais ocorreria.

Sua mãe era uma Rainha enquanto que Vallerie não passava da filha de um monstro. Como poderia ser amada por ela se desde que fora gerada até a hora de nascer só trouxe tristeza e dor a sua progenitora? Nem ao menos se considerava digna dos traços tão belos que herdara.

Por isso nunca tivera coragem de falar com ela, engolia as lágrimas e corria de volta ao orfanato quando via o cavalo se afastar. De todas as crianças era a única a conhecer a identidade dos pais. Informação que causava inveja nas outras.

Não era autorizada a falar algo sobre isso, apenas podia ouvir sobre o quão suja e indesejada ela era. Que p culpado de todo o mal dentro da Rainha havia lhe gerado no ventre de Regina.

O alvo preferido da crueldade daquelas mulheres, saco de pancadas nas horas vagas e escrava em tempo integral. Não era autotizada a brincar.

Razão pela qual seus olhos chocolate apenas olhavam da janela da cozinha a diversão das outras crianças, ouviu o ranger do piso mas era tarde para voltar a limpar, fora pega no ato e denunciou as outras crianças por estar olhando as pela janela, como se já não fosse odiada o bastante por elas. Previa a surra que levaria dos dois lados.

Unhas grandes arranharam o couro cabeludo e um chão recém limpo rachou lhe os lábios em três partes quando fora jogada de cara nele, sentiu o nariz sangrar junto ao um corte se abrindo na sobrancelha. Tinha certeza que seu lado esquerdo da face estava roxo. Não ousou emitir qualquer som, apenas suportou a dor segurando as lágrimas, ainda era apenas uma criança afinal.

Com medo virou o rosto para que a mulher não pensasse estar sendo ignorada, podia imaginar a dor das chibatadas se ela achasse isso. Clarice tinha uma expressão de pavor ao olhar pela janela, não conseguia enxergar mas uma fumaça roxa engolia todo o vilarejo levando junto tudo que estivesse na frente.

Um vento forte entrou pela porta da cozinha ganhando a atenção da criança que suspirou ao ver a fumaça roxa invadindo o local. Pela expressão da ruiva não podia ser algo bom.

Lembrou dos boatos correndo pelo vilarejo de que a Evil Queen lançaria uma maldição para acabar com todos os finais felizes.

A menina só pode fechar os olhos e desejar com todas as forças poder ter uma chance de lembrar e poder conviver com a mãe, queria lhe pedir desculpa por ter nascido, desejava ser perdoada por toda a dor que causou, e se fosse talvez, só talvez pudesse fazer a Rainha gostar um pouquinho dela.

Desejava não ser alvo de seu ódio, isso lhe doía mais do que não ser digna do amor materno tão desejado.

Foi seu último pensamento antes de sentir algo fluir através dela chocando contra a maldição lançada por Regina, não sabia mas seu desejo profundo gerou uma magia que lhe levou a desmaiar sem imaginar que pela primeira vez seu desejo não seria negado.

No Castelo de Snow a tão temida Rainha má gargalhava vendo o poder e rapidez que sua maldição consumia todo o local, adorando a sensação que invadia lhe o coração, finalmente iria experimentar a felicidade que sempre lhe fora negada. Não haveria títulos, não seria odiada por todos e poderia tentar viver além da solidão de seu castelo.

Longe da dor que causara, talvez pudesse esquecer todo o mal que sofreu, e é claro, se deliciar com o sofrimento de Snow sem seu final feliz. O jogo fora invertido.

Mesmo com todo o asco que sentia não pode evitar lembrar da criança que trouxe ao mundo, sentia tanto por ela ser filha daquele monstro que seus olhos só viam ele ao olhar a menina, nem pode perceber que a bebê era idêntica à ela.

Ignorou a lembrança do ser que era sua filha e a quatro anos fora entregue a um orfanato, para sorrir ao lembrar que a cinco anos atrás pode dar fim aquele monstro e viver sem sua repugnante presença, foi um alívio até o primeiro enjôo.

Fez o que sabia de melhor, ignorou qualquer lembrança envolvendo Vallerie enquanto ia sentindo a fumaça lhe cercar sem ao menos sonhar quão perto estaria da criança que pensou nunca ser capaz de amar.


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