1. SUPERMULHER

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— Já é o sétimo dia! — Diana Conti amarrou seu cabelo ruivo num rabo de cavalo. — Isso mesmo, uma semana!

— Desculpe-me, meu amor, bom dia. — Alexandre Guerra deu-lhe um beijo na testa. — Você sabe como é a vida de jornalista... — Ele saiu em direção ao corredor, vestindo o paletó.

— Corrida? Imprevisível?! — Diana pulou da cama dentro de suas pantufas de coelho e o seguiu. — Eu sei disso, sou meteorologista, Alex. Eu convivo com o imprevisível cotidianamente, e torno-o previsível!

Ela parou de frente para o espelho de corpo todo do corredor, onde o marido arrumava o topete e alinhava a gravata azul, e cruzou os braços:

— É graças a mim que você não vai colocar o guarda-chuva na bolsa, porque hoje não vai chover, pois moramos num caldeirão gigante chamado Rio de Janeiro. Eu sei como o tempo é instável, sei como são as inconstâncias, e as contorno!

— Você é a Supermulher — sussurrou Alexandre, dando um selinho demorado em Diana.

Ela deu de ombros.

— Eu sou. Mas mesmo a Supermulher, antes de salvar o mundo das tempestades, terremotos e furacões, tem tempo para tomar café da manhã com a pessoa que ama. — Ela endireitou a gola da camisa dele. — E pela sétima vez ela não pode, não porque não queira, mas porque o marido sai cedo demais para farejar furos de reportagem...

— Diana...

Diana balançou a cabeça.

— Não, está tudo bem. Chega de brigar. É melhor você ir, vai se...

— Shhhhh — Alexandre colocou um dedo sobre os lábios dela. — Vem comigo. — E puxou-a pelo corredor.

— O q-quê, como?! — Diana esperneou. — Eu tô com sono, Alex, são seis da manhã, é melhor que você...

Ela se interrompeu ao entrar na cozinha e se deparar com a mesa... repleta. Havia mistos-quentes com peito de peru e queijo gouda — seu predileto — empilhados num prato redondo, iogurte de frutas vermelhas em garrafas, suco de abacaxi com hortelã (que somente Alexandre tomaria) em uma jarra, bolo de laranja, donuts, e, é claro, a bebida indispensável para Diana: café. O inigualável cheiro de café fresquinho, recém-saído da cafeteira, preenchia a cozinha.

— Você fez tudo isso? — perguntou, boquiaberta.

— Quem mais teria feito? Você? — Alexandre riu, puxando uma cadeira para Diana sentar-se. — Sabemos que a única boca que consegue engolir sua comida, amor, é a lixeira.

Diana estalou a língua.

— Ok, Alexandre, já tá pegando pesado.

— Desculpe. — Ele riu, sentando-se e estirando o guardanapo sobre o colo. — Tudo o que menos quero é nublar o tempo com você.

— Já tá nublado — brincou ela, mordendo um pedaço de seu delicioso misto-quente. O queijo esfiou.

— Bom, então não quero as trovoadas. — Ele encheu o copo com suco, como de costume, até a metade.

Diana engoliu o pedaço de sanduíche que tinha na boca e não abocanhou outro. Por uns segundos, se deteve a fitar o marido; o coração quentinho dentro do peito, confortável, como se enrolado num cobertor macio.

Ela observou como Alexandre sempre tomava um gole de suco após morder um pedaço de pão, pois, se não o fizesse, com certeza acabaria engasgando-se. Notou como ele mastigava vinte vezes o alimento depois de morder e como era cuidadoso em não permitir que a mordida deixasse cair uma migalha sequer fora do prato.

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