Ele não queria, mas decidiu que era necessário se separar do esquadrão. Os homens corriam atrás dele, exaustos, aterrorizados, variando entre estados de choque e uma corrida quase involuntária. O fogo serpenteava para o alto, espalhado pela floresta. Tiros e silvos dos projeteis de RPG tomavam tudo como uma sinfonia demoníaca. Ele nunca se acostumava com o sofrimento humano. Olhou para trás e sabia que era o alvo. O verdadeiro objetivo daquele assalto e emboscada feita pelos malditos guerrilheiros congoleses. O acampamento militar já devia estar em ruínas, e os equipamentos destruídos. Embora soubesse que reforços chegariam, se mantesse consigo toda a tropa, poderia trazer a morte mais rápido a todos eles.
"Cabo, leve o grupo pra noroeste. Eu vou encontrar vocês depois. Eu quero que se espalhem, e desapareçam com essas boinas azuis. Somente eu vou usar. E se alguém os capturar, digam-nos que o general está com a boina azul."
Ele gritou, entre os ruídos de desespero e guerra à sua volta. O cabo nem pensou em questionar, ninguém questionava o general Souza Cruz. Continuou seu caminho embrenhando mais e mais pela mata. Podia ver os raios das lanternas do guerrilheiros, e o barulho enorme que faziam para se mover pela mata. O soldado, por outro lado, era forjado no coração do inferno verde, ele sabia se ocultar, ser tão perspicaz quanto o menor felino na selva. Esperou que um pequeno grupo se aglomerasse em uma área que pôde ver com clareza, e disparou com a FAL, cinco tiros precisos que explodiram as cabeças e tombaram os corpos, apagando uma área iluminada. Sabia que seria percebido, mesmo em meio à toda cacofonia da batalha. Subiu em um olmo baixo e esperou, de uma posição que possibilitava enxergar 360°, que um a um os guerrilheiros surgissem em seu campo de visão. Então apertou o gatilho, alvo seguindo de alvo, abatendo-os em um raio que fez quase uma clareira de corpos para ele. Os malditos se aglomerariam se o descobrissem, e o descobririam logo. Quando matou o vigésimo, saltou do olmo e correu para o mato. Tiros perseguindo-o, os homens confusos com seus companheiros morrendo sem saberem exatamente de onde. O general chegou por trás do que parecia um garoto adolescente, que mal segurava o cinto imenso de balas de AK-47, e quebrou seu pescoço, roubando uma faca presa na cintura do rapaz. Tirou a clock do coldre na coxa, e com as duas mãos menteve em riste a pistola na vertical e a faca na horizontal. Ele mantinha os olhos semicerrados para que a pupila não se contraísse tanto com a luz do fogo polvinhando a floresta, e enxergar com clareza na escuridão. Outras seis vezes, repetiu o assalto pela retaguarda, abrindo gargantas de crianças, adolescentes, adultos ou qualquer homem que ele pudesse chamar de inimigo. Então viu uma trilha de terra. Não sabia exatamente como havia uma trilha naquela região mapeada que ele conhecia bem, e correu naquela direção.
Entrou por um túnel vivo, com as plantas cercando-o de todos os lados, e a floresta foi sendo abafada, cada vez mais silenciosa e escura, até que ele não enxergava mais nada nem ouvia qualquer coisa além dos passos quebrando galhos e folhas secas pelo caminho. De repente o chão ficou duro, liso e quase uniforme. Um estranho ar frio soprou vindo do norte da trilha. Seus passos terminaram o último cipó no chão e ele percebeu que estava pisando azulejos. Pôs a mão na lateral do corredor, e viu que eram paredes. Guardou as armas menores e empunhou a FAL, os olhos vibrando no breu, prontos para matar qualquer coisa que surgisse na sua frente. Ele precisava saber onde estava, precisava encontrar seu esquadrão, precisava matar todos aqueles filhos da puta assassinos do Congo.
Então ele viu uma luz fraca piscando, e o corredor terminava em uma lateral que ligava outro corredor. Andou devagar, passos ritmados, contando a respiração, atento a mira do fuzil. Contou até três, e virou furioso, se deparando com um homem branco, comum, sentado à frente de uma mesa com pilhas e pilhas de papeis, livros e jornais. O homem mal levantou os olhos debaixo da armação do óculos quando notou o soldado surgir com uma arma apontada para ele, e deu outro trago no cigarro pela metade pendurada na boca. Nas duas paredes que o ladeava, havia um infinito de portas, que era impossível ver o final dali, se estendendo até as imagens se borrarem.
"Quem caralho é você?" Ele perguntou em inglês, mas o homem não respondeu nada. "Eu já perguntei, desgraçado. Eu sou da força expedicionária da ONU, se você não me responder tenho permissão para te neutralizar."
Completamente ignorado. Mordeu os dentes então, e andou a passos largos em direção à mesa, pensando que merda de teatro era aquele, que diabo de passagem secreta ele havia encontrado, e porque o maldito não respondia. A arma em riste.
"Next." Respondeu finalmente, o estranho.
"Próximo o que seu desgraçado?" Ele pôs o dedo no gatilho. Então sentiu uma força imensa puxá-lo, como o impacto de uma granada, mas ao invés de violentamente, veio devagar. O dedo voltando para trás, enquanto ele tentava atirar. Uma das portas à sua esquerda abriu.
E do outro lado estava dia.
Quando se deu por si estava jogado num mar de grama, com um céu azul brilhante sobre a cabeça. Seu corpo doía de muitas formas diferentes, e sentiu um sono imenso acometê-lo. Onde estava seu esquadrão? Ele dormira e acordara em outro lugar? Mas como seria possível se estava na batalha há instantes. Contra os pensamentos e a confusão extrema viu algumas figuras ao longe, tentando se esconder atrás dos arbustos. 'Congoleses malditos', pensou quase embriagado. Puxou a pistola do coldre e mirou debilmente nos alvos espalhados. Deu tiros tiros pro vazio e apagou.
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Escape from Hell
FanficFanfic baseada na série Drifters, de Kouta Hirano. Neste história, o general brasileiro Santos Cruz é transportado do meio da sangrenta guerra do Congo para um mundo totalmente novo, onde ele não é mais a mesma pessoa, e seu espírito guerreiro vai t...