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Saí daquele elevador, naquela manhã, determinada e ele me ouviria!

-Bom dia, doutor. -Falo, me aproximando.

-Bom dia. -Ele diz, sem olhar para mim ainda. -Deixe suas coisas na sala dos médicos e siga para o primeiro paciente. Eu vou...

-Não. -O interrompo.

Gustavo se surpreende com a resposta e então me encara. Sinto toda minha confiança se esvair quando seu par de olhos cor de esmeralda me encara. Minha boca seca, e tento ser forte.

-Não? -Ele retruca. -Como não?

-Olha, eu não sei porque me trata tão mal. -Falo, e preciso continuar antes que a coragem suma. -Desde o primeiro dia que nos vimos você foi rude e grosseiro comigo. Eu sei que não gosta de mim, já deu para perceber, mas não queria que fosse tão ruim assim. Quer dizer, nós ao menos podíamos ser profissionais e falar sobre o trabalho. E é claro que se quisesse falar sobre aquele incidente...

-Não houve incidentes. -Ele fala, sério, e trinca a mandíbula.

-Jura? -Retruco. -Porque eu podia jurar que a gente quase se beijou.

Ele parece perder o fôlego.

-Eu não estou aqui me oferecendo, tá? -Me apresso. -Eu só não quero que pense que estou planejando correr atrás de você para minha nota no doutorado.

Ele então arqueia a sobrancelha, mas não diz nada.

-Estou aqui propondo, no mínimo, uma trégua. -Explico. -Nada mais.

Gustavo demora mais de dez segundos para esboçar uma reação, e é a pior de todas. Ele começa rindo, o que me deixa completamente confusa e desconcertada.

-Está rindo? -Retruco. -Sério?

-Você não? -Ele enxuga o canto dos olhos e volta a sua postura rígida. -Olha aqui, garota, eu sei o que quer com isso. Você diz que não quer, mas, talvez queira, e, sendo honesto, eu não! Você nem sequer é bonita o suficiente para isso...

E foi aí que perdi meu controle e minha mão direita foi parar no rosto dele. Meus olhos já estavam cheios de lágrimas.

-Você me bateu? -Ele retrucou.

-Vá se foder! -Resmungo e pego a prancheta, andando o mais depressa possível até o quarto dos médicos, sem olhar para trás uma vez sequer.

Entrei na sala, ainda tomada pela raiva. Joguei a bolsa no meu nicho e coloquei meu jaleco. Respirei fundo, uma, duas, três vezes. Enxuguei as lágrimas e tentei me acalmar.

Aquilo tinha sido a ideia mais idiota de toda minha vida. Gustavo jamais seria, no mínimo, um homem decente. Eu não insistiria. Se era pra ser uma guerra, que fosse!

Assim que abri a porta foi como se o sangue vazasse das minhas veias. Gustavo me encarava, com o rosto vermelho.

-Você...

Mas antes que eu completasse, ele me empurrou para dentro da sala e fechou a porta atrás de si. Foi sim uma péssima ideia!  A pior da minha vida inteira!

-Gustavo, desculpa. -Me apresso. -Não queria ser violenta. Mas você mereceu e...

-Não! -Ele me interrompe. -O que você achou que aconteceria?

-Não sei. -Digo e meus batimentos cardíacos aceleram. O que ele ia fazer?

-Você falou o que queria e ouviu o que não queria. -Ele diz, em tom feroz.

-Você foi cruel comigo! -Solto um gritinho. -Eu sei que eu não sou linda como todas essas médicas e enfermeiras, mas eu não merecia sua repulsa.

-Você parece tão ardilosa quanto pensei que fosse. -Ele me olha de cima a baixo.

-Não ouse! -Falo. -Você começou.

-Não, você começou. Quando quis... O que quis, afinal? -Ele fala alto. -Estabelecer uma amizade? Entre nós? Sério?

-E qual o mal nisso? -Retruco, não baixando meu tom. -Ah, claro, você é o pobre doutor infeliz, e por isso todos devem aceitar seu tratamento lixo. Dane-se. Eu vou embora.

-Não. -Ele segura meu braço, assim que tento alcançar a porta.

-Me larga. -Digo, rangendo os dentes.

-Você queria mesmo estabelecer uma amizade? -Ele pergunta, ignorando.

-Me solta! -Exclamo e dessa vez ele ouve. -De que adianta saber? Pelo que sei, já não sou boa suficiente para isso. Tampouco... Como disse mesmo? Ah, é: bonita.

Ele parece ignorar tudo, seu olhar furioso, agora estava mais perto. Ele avançava, até que eu não vi saída. Já havia encostado as costas na porta.

-Eu menti. -Ele fala.

-O quê? -Fico confusa. Meu consciente não respondia e eu não conseguia formular pensamentos correntes até então.

Gustavo então ergue a mão e a coloca ao lado da minha cabeça.

-Você é bonita. E muito. -Ele fala. Suas pupilas dilatam. Eu me sentia como um rato e ele, um grande felino.

-Mas você disse... -Tento ser, no mínimo, forte.

-Eu sei o que disse. -Ele fala e está a poucos centímetros do meu rosto. Sua voz havia adquirido um tom rouco e sedutor. Aquilo fazia o calor percorrer pelo meu corpo. Em especial pela minha virilha. Má ideia!

-O que...

-Você é linda pra caralho! -E então afunda seus lábios nos meus e eu não tenho reação alguma além de fechar os olhos, largar a prancheta e envolver meus braços ao redor de seu pescoço, acompanhando aquele beijo.

Gustavo parecia urgente naquilo. Feroz, e um monte de coisas mais. Suas mãos então, afastaram meu jaleco e encontraram minha cintura, por baixo da camisa.

-Você é muito cabeça dura! -Ele murmura contra meus lábios.

-Mmmm... -Solto um gemido.

-Shiu! -Ele censura, colando a boca na minha, novamente.

Suas mãos pareciam estar em todos os lugares, vasculhando minha cintura, enquanto eu começava a me derreter...

O quê? Não. Gustavo não. Ele era melhor amigo da Helena. Foi noivo dela! E odiava meu irmão, com certeza. Ele deveria me odiar. Eu seria uma... Vingança!

-Sai! -O afasto, ainda zonza.

Gustavo pareceu surpreso, mas tão desnorteado como eu.

-Não. -Falo, não conseguindo encara-lo. -Você foi noivo da minha cunhada. E é, tecnicamente, meu professor. Isso é errado.

Gustavo demora apenas um minuto para se dar conta do que eu falava e precisa passar a mão pelos cabelos para colocá-los no lugar.

-Não foi nada. -Ele murmura.

Meu queixo basicamente despenca.

-Como? -Retruco, incrédula.

-Acredite, é melhor. Esqueça isso. Nem foi lá essas coisas. -Ele da de ombros.

Não consigo negar a repulsa que sinto na hora.

-Você é insuportável. -Falo. -Grosso!

-E você, não passa de uma menina mimada. Você não sabe nada sobre mim. -Ele retruca.

-E você tampouco sobre mim. -E é a última coisa que falo antes de sair, ignorando qualquer coisa que ele pudesse vir a falar em seguida.

InevitavelmenteOnde histórias criam vida. Descubra agora