Coração

60 2 4
                                    

A Guerra Universal Real havia acabado, porém o Garoto Cósmico não havia conseguido morrer. Que pena...

Ele estava sozinho...

Sua existência era provavelmente a única, última em todo o universo.

Ele chorava muito... Suas lágrimas entristeciam as estrelas, elas brilhavam menos... Suas lágrimas realmente as machucava...

O Garoto Cósmico chorava até soluçar e entre soluços e tentativas de se conter, percebeu que suas lágrimas faziam pequenos furos no véu da realidade tão escura quanto seus cabelos e suas vestes, um véu bem próximo cuja luz entrava de bem longe.

Decidiu então criar algo para rasgar a realidade para que pudesse ir para outra, assim deixaria seu antigo lar finalmente dormir em paz.

Em um momento, havia uma Tesoura de Transparência Preciosa.

Ele a chamou assim pois sua mãe um dia o disse:

-"Meu amor, meu querido "...", não permita que ninguém nunca o faça mal, não permita que arranquem de você suas lágrimas, elas são preciosas e serão raras no mundo em que vamos enfrentar adiante. Guarde-as, pois são importantes, são poderosas, têm uma conexão forte com seu coração."

Se lembrando disso, o Garoto cuja pele era vermelha como o sangue, se ouriçou, de sua espinha às brânquias de seu pescoço.

Ao rasgar o véu e entrar na luz, sua tesoura se desfez, virando um anel que se prendeu a seu dedo anelar esquerdo.

A primeira coisa que viu? Uma flor exuberante, linda num tom rosa lavanda, como a cor de seus próprios lábios...

-Sinto muito...

Escuro...

Tudo voltou a ficar escuro...

...

Alguém se desculpou por algo ao Garoto Vermelho... Algo que ele não sabia o que era...

Quando acordou, se viu sozinho, seus pés cujos dedos antes eram unidos por uma fina pele para facilitar o nado em seu planeta natal, agora estavam como os daqueles que atacaram o mesmo.

-5 dedos, não 3... 5, 5 pontas, não 3...
O mesmo com as mãos...

...

Irrelevante, aquilo não era importante para ele, o que era importante era tentar encontrar a voz que se dizia culpada, perguntar o que ela havia feito e o porquê de não ter se mostrado a ele.

Aquela flor, era tão bela, suas pétalas eram tão belas, porém desgastadas, assim como o Garoto Cósmico... Estava machucada...

-Você está bem?

Perdido em seus pensamentos enquanto ainda atordoado com a mudança de seus pés e mãos e a sua chegada, sentado no concreto daquele lugar desconhecido, alguém apareceu.

-Você está bem?

-Quem é você? - o Garoto Cósmico perguntava ao homem alto e roxo que estava a sua frente.

-M-meu nome é Syban, Syban Anderè. E v-você, como é o seu?

-Meu nome é... É..., minha mãe me chamava de...

...

Depois da Guerra Universal Real, Askanir Vazzi Latravell foi danificado gravemente, colocado em uma pequena cúpula invisível para se recuperar e lançado na escuridão espacial.

Antes disso, Askanir e seu planeta se viram numa guerra quando um batalhão de criaturas pálidas e bípedes de semblante maligno invadiram seu planeta, bombardearam sua matriz e arrancaram a vitalidade de seu planeta a força. A matriz era o que guardava a vitalidade de Mikrawl, que era o que dava energia a toda criatura viva, desde terrestre, aquático, aéreo ou espectral, sem sua carga constante, não podiam se regenerar quando se machucavam...

Os habitantes de Mikrawl foram dizimados e, segundo o comandante dos bípedes pálidos, a "ameaça" estava neutralizada...

Boram, a mãe de Askanir em seu último esforço, conseguiu salvar seu filho afinal... Ele estava perdido, porém vivo.

-As estrelas me chamam de Garoto Cósmico, pode me chamar assim se quiser, eu não me lembro de muita coisa, nem de meu nome pelo visto. Muito prazer em conhecê-lo.

O Garoto que a pouco tinha uma pele roxa; da abertura de seu colete branco, do meio de seu peito, uma cor rosa começou a se alastrar até que toda pele de seu corpo igual ao da pessoa que acabara de conhecer, como a flor desgastada, exceto seus lábios, que eram vermelhos como sangue, e demonstravam anseio de algo...

-P-prazer, muito prazer.

O Garoto, agora rosa, além dos lábios vermelhos, também corou as bochechas desta mesma cor.

Syban ofereceu a mão à Askanir, que segurou, mas logo soltou assustado...

Ao contrário da cor quente de sua pele, sua mão era mais fria que o gelo que havia nas profundezas da Caverna das Lágrimas do Arrependimento, na vila submersa Ttai, agora, destruída e não mais existente...

-Algum problema?

-N-não, é só que... Nada.

Se levantou e olharam ao redor juntos, vendo que nada tinha ao seu redor...

Askanir explicou sua história, até onde se lembra e Syban ouviu, durante as partes sobre a destruição ficou azul e vermelho, chorando de raiva, mas logo se acalmou.

Eles se entendiam, eram pessoas sozinhas que buscavam um propósito em seja lá onde estivessem, já que Syban também não sabia onde estava.

Syban sabia o porquê estava ali, mas não onde. Decidiu omitir fatos sobre si mesmo para proteção do Garoto Cósmico a quem começou a, carinhosamente, chamar de Cosmo.

-Fala sério, você nunca conheceu uma fada?

-No meu planeta, eu vivia na parte submersa, éramos felizes e todo o lugar era acessível, mas mesmo nas mais profundas cavernas havia coisas sobre as quais não deveríamos nos meter ou conhecer de fato. Essa criaturinha de asas e cauda que você fala eu nunca vi nem na superfície, talvez existisse no plano das Terras Flutuantes ou só na sua cabeça dura, Syban haha.

Continuaram se conhecendo mais e mais, muito mais, até que chegaram em um deserto de areia azul e miragens, um lugar gelado e temeroso, algo que não era problema para Askanir, mas para Syban... Era uma tortura já que sua pele era frágil.

...

O que faria você se um amigo...

O que faria se alguém que ama...

O que faria você se sua mãe...
ou seu pai...
ou qualquer coisa viva que te cativou...

... estivesse sofrendo?

A ChuvaOnde histórias criam vida. Descubra agora