Perdido

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Fazia horas que eu estava andando pelas ruas de Incheon sem saber para onde ir, eu não fazia ideia por onde começar. Minha barriga roncava de fome, eu estava me sentindo um pouco fraco.

Andei mais alguns passos e em um momento vi do outro lado da rua uma lanchonete, o cheirinho de frango assado fez minha barriga parecer um monstro de tão alto que roncou.

Eu sempre andava com as mãos no bolso e com a cabeça baixa olhando para meus pés, em meu próprio mundo. Minha cabeça sempre estava em outro lugar, eu pensava em muitas coisas. Principalmente no meu passado, aquilo martelava o tempo todo em minha cabeça.. me fazendo perguntar as mesmas coisas. "de onde eu vim?", "quem são meus pais?" "pq cresci em um orfanato?" e outras perguntas do tipo.

Abri a porta da lanchonete passeando meus olhos por todo o local assim que passei pela porta e fechei a mesma atrás de mim, caminhei até o balcão.

- Poderia me dar alguma coisa pra comer?. Estou sem dinheiro no momento mas.. posso pagar depois.. ~ disse baixo e calmamente.

- Aqui ninguém dá comida pra mendigo, sai!.. ~ a garçonete respondeu me olhando feio.

Naquele momento uma raiva percorreu por todo o meu corpo me fazendo ficar parado com os olhos fixos nela, minhas mãos se fecharam estalando meus dedos com força, meus dentes se apertavam uns nos outros tão forte que meu maxilar doía.

- Você não ouviu o que eu disse??!, saí! ~ ela falava gesticulando com o pano que estava na mão dela.

- Olá, me vê um X-bacon, por favor.. ~ ouvi uma voz rouca falar, eu ainda estava do mesmo jeito olhando para aquela mulher.

Só Deus sabe a vontade de cortar a garganta dela com uma faca que eu estava sentindo. É.. eu tinha esses pensamentos e vontades, eu apenas imaginava fazendo tal coisa com alguém. Era um desejo de matar incontrolável, nunca soube ao certo porque eu agia dessa forma mas não me preocupava, eu só queria ver o sangue daquela mulher saindo de sí.

- Ei.. ~ o cara disse me olhando.

Sem dizer nada virei meu rosto devagar para olhá-lo, ele tinha orelhas enormes,  cabelos com pequenos cachos, uma roupa que dava para perceber que tinha dinheiro. Era um sapato social preto, a calça também era preta, ele usava em blazer marrom com uma blusa preta por dentro que tampava seu pescoço.

- Você está com fome?. ~ ele perguntou sem tirar os olhos de mim.~ eu te pago um lanche.. ~ sorriu com simpatia.

Fiquei em silêncio olhando para ele sem expor nem uma expressão, eu não gostava que ninguém fizesse nada pra mim, gostava de fazer tudo sozinho.

Então saí de sua presença com passos rápidos para que ele não pudesse vir atrás de mim, passei pela porta e nem quis fazer questão de olhar para trás apenas continuei andando pela rua. Estava escurecendo e ia chover, sentei na calçada encostando na parede de uma loja de móveis e ali fiquei.

Começou a chover então puxei o capuz do meu moletom cobrindo minha cabeça e puxei mais as mangas pra cobrirem minhas mãos. Meus lábios estavam secos e meus dentes batiam por conta do frio, eu estava morrendo de fome não aguentava mais, estava o dia todo sem comer, sem tomar água.

- Eae, man.. tá fazendo o que aí no chão? ~ um rapaz apareceu na minha frente, ele usava umas roupas de bandido, com a toca tapando o rosto.

- Se veio me roubar saiba que não tem nada para roubar.. ah não ser minhas roupas.. ~ olhava para ele.

- Não vim te roubar não, mano.. eu vi tu entrando na lanchonete e vi tu pedindo comida pra aquela filha da puta daquela garçonete e ela te tratou como se fosse lixo.. vim te recrutar..

- Recrutar? ~ estranhei aquilo de imediato mas não expus meus sentimentos, eu nunca mostrava o que tava sentindo.

- É, eu roubei uns lanches e pah..

- Me recrutar pra roubar igual a você? ~ perguntei retoricamente.

- Sim, cara.. você tá aqui na rua, não tem pra onde ir.. único modo de sobreviver é esse..

Ele tinha razão, eu não tinha pra onde ir, não tinha o que comer, era a única forma de sobreviver. Suspirei pensativo até que cheguei em uma conclusão.

- Ok.. ~ respondi.

- Ae! ~ ele sorrio e tirou de dentro da sacola um hambúrguer com batatas fritas e uma coca-cola.~ aproveita, garoto.. ~ sentou-se ao meu lado.

Peguei o lanche nas mãos dele e comecei a comer calmamente o hambúrguer, fechei os olhos sentindo o sabor, matando finalmente a minha fome. Eu estava tremendo de tanta fome que estava, nunca fiquei tanto tempo assim sem comer. Achei que nunca sentiria falta do purê de batata da Naoko, todos os dias no orfanato ela fazia e nós comíamos, era enjoativo mas pelo menos eu tinha comida, agora vou ter que roubar pra poder comer.

Terminei o hambúrguer e comecei a comer as batatas fritas, então avistei aquele homem que ofereceu pagar um lanche pra mim saindo da lanchonete, abaixei a cabeça para que ele não me visse e o olhava de relance enquanto comia. Agora que estava o vendo de pé, ele era mais alto do que pensava.

O homem entrou em um carro preto e então o veículo começou a andar até sumir de vista.

- Eu me chamo Cody.. sou asiático e americano.. qual é o seu nome? ~ o cara ao meu lado puxou assunto.

- Kyungsoo..

- Prazer, Kyungsoo.. ~ ele mostrou a mão para que eu pudesse pegar em comprimento mas não o fiz, apenas assenti fraco com a cabeça.~ já vi que tu é do tipo caladão.. ok..

- Você tem lugar pra dormir? ~ perguntei terminando as batatas fritas e começando a tomar a coca-cola.

- Bom.. não é um lugar de luxo mas dá pro gasto.. tá afim de ir lá agora?.

Fiz que sim com a cabeça e nós levantamos do chão começando a andar pelas ruas, coloquei uma mão no bolso e a outra segurava a lata da coca-cola. Eu andava um pouco longe de Cody, não gostava de ficar muito perto de alguém, me incomodava bastante.

Depois que andamos mais alguns minutos, nós passos nos fundos de uma casa e lá tinha um cômodo grande com várias pessoas, mulheres, homens e até mesmo crianças.

- Eae, rapaziada?!, esse é o nosso novo irmão, Kyungsoo.. ~ Cody disse animado e todo mundo gritou, me dando oi.~ ele é caladão, na dele.. então não fiquem fazendo muitas perguntas.. só o faça entender que vamos cuidar dele.

Ele passou os braços em minha volta e eu os tirei com brutalidade.

- Não toca em mim.. ~ minha voz sempre saia baixa e calma, mas ele entendeu que não gostei daquilo, olhava sério para ele.

Cody ficou um pouco sem entender a minha reação, caminhei saindo de perto dele e percebia os olhares sobre mim. Fui até um canto onde ficava uma cama vazia e coloquei minha mochila em baixo da mesma. Ouvia as pessoas conversarem baixinho, provavelmente era sobre mim.

Deitei na cama e respirei fundo pensando no que fazer amanhã, decidi que não ficaria naquele lugar nem a pau.. era a versão adulta do orfanato, não queria aquilo pra mim então ia me virar. Amanhã cedo eu ia embora, no momento só precisava de um lugar para dormir.

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