Capítulo I

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As brumas negras vindas do Leste anunciam a chegada de um mal a cada ciclo que se fecha, seu cheiro é como a podridão dos cadáveres moribundo que lotam as masmorras da capital, a nuvem, como se apresenta, carrega consigo a fuligem das torres de castelos queimados junto das almas perdidas em guerras de outrora. O guincho de terror emitido pelos pássaros quando vão ao seu encontro é de um infeliz e ensurdecedor pedido de socorro, a morte rápida eles desejam enquanto rasgam suas próprias gargantas com suas garras, quebram suas asas indo de encontro aos rochedos e deixam um rastro negro de penas por onde surtam. Os camponeses que vivem pelos ermos do reinado já não podem fazer nada a respeito, cansados de recolher os cadáveres corrompidos que jazem nos campos de trigo eles já não os queimam, mas esperam que os deuses um dia transformem sua carcaça podre em solo fértil onde seus filhos um dia poderão plantar frutos. As fogueiras de azul sombrio se alastram pelos campos em época de previsível revolta do cadavérico deus maligno, do qual as negras brumas persistem emanar.

Certa vez, em seus tempos de menino Vilamond habitou numa terra onde as crianças, assim como eu viviam livres sem temer o anoitecer. As histórias que os anciões contavam sobre o terrível mal que vivia ao Leste arrepiavam nossos cabelos, entretanto éramos livres, poderíamos ao menos viver assim em nossas mentes, mas agora nem em nossos próprios pensamentos podemos sentir a paz que tanto um dia nos pertenceu. Hoje somos velhos saudosistas, mas nossas crianças... temo por elas, já não mais são dotados da grande curiosidade de outrora, hoje o mais simples cadeado é visto com uma mortal ignorância. Alguns a tratam como magia negra. Entretanto o fôlego por aventuras que alguns de nossos jovens apresenta pode trazer a honra que nosso povo merece.

Não contei ainda quem somos, deixemos de lado então a narrativa sobre os males que nos afortunam. Somos elfos! Bravos elfos nascidos no continente perdido além-leste, terra de cinzas, que um dia fora bela terra, entretanto como o universo é regido tudo que se encontra em um, está fadada a ser dividido em dois, assim falou e nos esclareceu a grande deusa Edauwyn, criadora de todos, que deu sua vida para seus filhos habitar.

Os relatos que reuni neste tomo de pergaminhos trata acerca da ascensão de nossa raça, e os fatos que trouxeram esperança de um futuro melhor para este elfo beato.

Me lembro bem daquele verão seis anos atrás. Vilamond, meu fiel amigo e mestre havia vindo de guerras passadas, lutas dos homens que hoje vemos como falhas e vidas desperdiçadas, sangue de elfos vazios para ser exato. O sujeito vestia um manto longo semelhante ao dos monges do portão sul de Okami quando o conheci em minha biblioteca, mas ele não viera de lá, julgo ele ser um emissário da própria deusa, pela maestria que tinha em seus planos. Trouxe consigo uma carta real, selado com ouro e palavras bonitas, papel valoroso que permitiu a construção da academia de Darehar, e consequentemente a milícia da cidadela. Com o pouco de prata que tinha deu vida à nossa esperança. Das vielas da cidade baixa recolheu em sua própria casa os que julgou serem fortes de espirito, pois, o corpo mirrado que trajava simples panos ele haveria de tornar resiliente. Assim chegamos a parte em que conto sobre o torneio dos primordiais, e é por lá que irei dar continuidade na história.

Era fim de tarde quando a mata verdejante deu espaço para sua forma negra se rebelar contra os homens de armas. Pelo alto de uma grande árvore puderam ver as brumas negras de Gralik, o deus cadáver, cobrir a terra. Como gotas de tinta negra destiladas em água cristalina o céu se alterou rapidamente, a folhagem das árvores que cobriam a floresta de Potiguar se retraiu como se um toque macabro a tirasse o dom da vida, e as gotículas acumuladas durante o dia congelaram ao seu contato. O grito dos pássaros em busca de abrigo pode ser ouvido da direção das brumas, e então um grupo voou para o oeste em busca de refúgio levantando uma tormenta negra por onde passavam.

Edauwyn - As Negras BrumasOnde histórias criam vida. Descubra agora