1. Fogos de artifício

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... 5, 4, 3, 2, 1 BOOM! BOOM! BOOM!

O céu estava coberto em cores, era uma noite agitada e um pouco tumultuada. Naquele momento muitas pessoas se abraçavam e todos pareciam estar felizes, no entanto, para Octávio aquela não era uma noite muito feliz. Ele se encontrava encostado atrás de um sofá, em uma mão segurava um copo pela metade de 51 e na outra uma garrafa cheia. Ele bebia como se tudo o que ele quisesse esquecer fosse sumir assim que a garrafa se esvaziasse, cada gole parecia fazer sua face entristecer-se mais ao ponto de algumas pessoas ao o verem se questionarem o porquê de sua tristeza. Todavia, ninguém podia saber o que só ele sabia, só ele sentia e só ele compreenderia a dificuldade que era está ali comemorando um ano que não havia sido nada bom pra ele.

Aquela noite era demasiadamente fria. O vento parecia ganhar vida, arrastava muitos copos e pratos pelo chão. As luzes preenchiam aquilo que seria escuridão e o lado de fora da casa de praia estava tão iluminado que poderia confunde-se com o dia. A festa estava lotada com muitos conhecidos e também desconhecidos de Octávio. A multidão dançava loucamente ao som de Exagerado, um grande lançamento de 1985. A música estava alta, dava pra sentir a euforia dominar todos os cantos da casa. Mas lá naquele canto específico residia uma pessoa que estava devastada, domada por sentimentos de angústia e inferioridade com a mente entorpecida dividida em pensamentos e álcool. Para muitos, as horas pareciam ter passado rápido, para Octávio o dia foi longo e intenso. Aquela expressão triste e acabada vinha de um dia cheio e turbulento, de uma mente atordoada e cansada.

A movimentação pela casa era grande, todos com suas taças nas mãos e suas roupas brancas com frases clichês de fim de ano. Muitos passavam por Octávio e fingiam não nota-lo ali. Até que, inesperadamente, ele sentiu o seu coração dar uma leve acelerada e uma sensação de algo vindo em sua direção, em certa velocidade, o apavora. Um homem contorna o sofá e senta ao lado dele.

— Ei! Posso sentar aqui, cara? — pergunta o estranho.

— já sentou né, mas... — disse Octávio, em um tom que permitiu somente ele mesmo ouvir.

— Feliz ano novo! — retrucou ele, antes que Octávio terminasse de falar.— Que festa animada!

Ele olhou para Octávio como se esperasse dali surgir uma conversa.

— Eh! Está mesmo — Octávio concluiu sem muito animo.

O estranho deu uma breve olhada para as pessoas da festa e resolveu insistir na conversa.

— Você conhece a Talita, certo? — perguntou ele, se aproximando mais de Octávio.

— Sim, ela é minha amiga - respondeu Octávio. — a gente faz faculdade junto na UFM.

— Ah! Vocês estudam na UFM. Eu vi nos noticiários que as coisas não andam muito bem por lá — comentou ele.

— Sim, e agora com a chegada desse novo gestor as coisas pioraram — continuou Octávio.

— Verdade, cara. — assentiu ele.

Naquele momento, os pensamentos de Octávio já se embaraçavam em questionamentos a respeito dessa pessoa que a principio conhecia sua amiga, e que ele nunca nem o tinha visto. Ele observava o estranho que provavelmente tinha a mesma idade que ele, era alto de cabelo curto, loiro; usava um jeans claro e uma camiseta branca escrita "Liberté Force!".

— Mas então, por que você está aqui sentado sozinho, com essa cara desanimada e com essa garrafa de 51? — Perguntou o cara.

— Esse era pra ser um dia maravilhoso, mas o meu dia já começou uma merda. Meu irmão mais velho me ouviu conversando com a Talita sobre o primo dela que veio passar a virada do ano aqui. — relatou Octávio, enquanto se virava totalmente de frente para o cara, sentido que, de alguma forma, aquele desconhecido poderia ser a pessoa certa para ele desabafar naquele momento. — Acontece que estávamos falando sobre uns problemas pessoais que o primo da Talita esta enfrentando em casa, meu irmão odeia essas coisas, ainda mais como as coisas estão hoje em dia. Ele surtou, nós discutimos feio e ele ficou descontrolado, começou a insinuar coisas absurdas, eu tentei fazer com que ele parasse, mas ele não parava de jeito nenhum.

A face de Octávio demonstrava que ele estava desesperado, a situação na casa dele estava insuportável, o irmão sempre implicou com ele e as coisas pareciam ter piorado de um tempo para cá. Ele completara seus dezenove anos de idade no ano que se despedia, estava cada vez mais questionador das coisas à sua volta o que parecia assustar seu irmão que sempre ditou as regras em casa, visto que, o pai passa muito tempo fora a trabalho.

O desconhecido percebendo o quão ele parecia está abalado pela situação com o irmão, aproximou-se mais dele, esticou os braços e insinuo lhe dá um abraço.

— Vai ficar tudo bem, você parece ser um cara muito forte. — sussurrou ele no ouvido de Octávio.

— Obrigado. — Octávio agradeceu a tentativa de consolo do cara que logo decide continua o seu discurso.

— Sabe! Você me fez lembra de uma história que uma vez me contaram de um cara que foi capaz de conquistar muitas coisas que fizeram historia e, provavelmente, serão lembradas para sempre. Ele tinha tudo pra desistir, visto que, tudo parecia perdido. Mas ele teve força e decidiu tentar de novo, de novo e de novo. Enquanto muitos largariam de mão e desistiriam, ele persistiu e conseguiu. Ele representou, onde não havia nenhum outro como ele, uma classe que é muito desfavorecida até hoje. E talvez, ele tenha começado uma luta que persistirá por muito tempo — O desconhecido percebendo que Octávio o ouvia atentamente persistiu em tentar anima-lo de alguma forma.

— Olhe para essas duas palavras na minha camisa! - sugeriu o cara, dando uma leve descontraída na conversa — Você consegue  entender o que ta escrito, certo?

— Sim, Liberdade e força — respondeu Octávio.

— Exato! A primeira coisa que você tem que ser é forte, e como eu disse, eu vejo muito isso em você. São duas palavras simples, mas que pra mim têm muito significado. Eu sei que não é fácil, acredite em mim, cara, eu sei que não é. Porém, ter força depende de você, é algo inerente a sua aparência física e, somente assim, você vai poder enfrentar o que vier; porque um dia, quem sabe, a sua força possa ser a sua liberdade! — reforçou ele.

Octávio sentiu-se um pouco aliviado, era como se aquela súbita e inesperada conversa tivesse renovado suas forças. Ele passou a mão pelo rosto na intensão de limpar alguma lagrima que talvez possa ter caído, despercebidamente, de seus olhos, e depois de um breve silencio que se fez, ele resolveu mudar o assunto.

— De onde você conhece a Talita? — questionou Octávio

— Na verdade, eu falava com ela agora pouco, e por sinal, ela me descreveu você muito bem: cabelos na altura do ombro, em um tom de castanho claro, usando jeans e jaqueta; não muito alto; magro e com uma bandana vermelha na cabeça. Assim que entrei, eu vi você sentado sozinho aqui, e achei que, sei lá, você quisesse conversar um pouco. Inclusive, tinha me esquecido de mencionar que a Talita está procurando por você. — disse ele.

Inesperadamente, a conversa é interrompida por vários estrondos consecutivos, mais uma chuva de fogos é disparado e, imediatamente, o cérebro de Octávio libera suas moléculas de adrenalina no sangue e seus batimentos cardíacos aceleram, logo, seus reflexos são ativados. Com o susto, Octávio, impulsivamente, segura à mão do homem, enquanto as pessoas começam novamente a aplaudir e celebrar o ano novo, Os dois sentados de frente um para o outro sorriem e continuam a se olhar. Após alguns segundos, Octávio puxa o braço e resolve dizer algo na tentativa de, com o silencio, não deixar a situação mais estranha do que já estava.

— Acho que tenho que ir — diz Octávio tremulo - Obrigado pela ajuda.

— Não há de que. Você até que é um cara legal. — diz o cara, abrindo um sorriso.

— Até que sou...! — exclamou ele — OK! Vou levar como um elogio

— É um elogio — afirma ele sorrindo, enquanto Octávio fazia uma cara de desaprovação. — Você só precisa acreditar mais em você, liberar essa faísca ai dentro e brilhar, assim, igual esses fogos de artifícios. — Diz o desconhecido apontado para janela aberta, mostrando o espetáculo dos fogos que ocorria lá fora.

Assim que ele volta a olhar para Octávio, percebe seus músculos faciais se movimentarem, suas bochechas se alargarem e seus dentes alvos aparecerem, dando sinal de uma profunda e estranha gargalhada.

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