João abriu os olhos e olhou para os lados, estava deitado em uma floresta. "É apenas um sonho", pensou ele. Se levantou e viu mais crianças se levantando, crianças que nunca tinha visto antes em sua vida. "Mas que sonho estranho."
- Levantem minhas crianças - disse uma voz, vindo do meio da floresta, uma voz doce, aveludada, confortante. Uma voz que João nunca ouvira antes.
- Vamos brincar crianças? - Continuou a voz. - Sei que querem brincar. Todas crianças querem brincar não é mesmo? - E deu uma leve risada.
Elas se encararam, nenhuma delas entendia o que estava acontecendo.
- Já sei. Vamos brincar de esconde-esconde. Na primeira rodada vocês se escondem e eu tento procurar vocês na mata. O que acham?
Nenhuma criança respondeu, todas olhavam para o mato com medo.
- Podem ir se escondendo amores.
O silêncio permaneceu, nenhuma das crianças se mexia.
- ESCONDAM-SE SEUS VERMES. VOCÊS ESTÃO ME TIRANDO DO SÉRIO - gritou a voz. Mas, a voz estava diferente, estava rouca, grossa, parecia ser de um ser demoníaco, de algo que parecia não ser desse mundo.
Após o grito, a histeria tomou conta das crianças. Começaram a correr para todos os lados. Algumas apenas se debruçaram no chão e ficaram chorando.
- Vou contar a até dez - disse a voz voltando a ser uma voz calma. - Um.
João olhou para uma das crianças que estava imóvel perto dele.
- Vamos, venha, vamos correr.
- Na-na-não consigo - respondeu a criança.
- Quatro.
João olhou para a floresta, sabia que estavam sem tempo e sabia também que algo ruim estava prestes a acontecer.
- Vamos, estamos sem tempo.
- Sete.
- Não consigo. - A criança desabou no chão e começou a chorar.
- Dez - Disse ainda doce. - Aqui vou eu! - Dessa vez a voz não estava mais doce.
João correu para o meio do mato, correu como nunca havia corrido antes. "Quero acordar logo, não estou gostando nada desse sonho."
Um grito de dor e pavor veio à tona.
- Encontrei a primeira, hahaha.
João se desesperou mais. Os gritos continuavam, um a um. Achou uma moita, entrou nela e se abaixou achando ser a melhor solução.
Mais um grito.
- Agora faltam apenas dois.
Ele começou a chorar. Tentou conter o choro para não ser encontrado por aquilo, seja lá o que fosse.
Começou a ouvir passos, vindo em sua direção.
- Oi João, parece que te encontrei. Pode sair dessa moita.
Ele se levanta, limpa seu rosto e sai da moita.
- Parece que você não foi o vencedor dessa vez.
O grito dele ecoou por toda a mata.
***
O médico caminha pelo corredor do hospital até chegar em Ana e Daniel.
- Diga, doutor - disse Daniel.
- Bom, infelizmente o filho de vocês não resistiu.
Ana se abraçou em Daniel e começou a chorar.
- Ele pareceu dar sinais de melhoras do coma, mas começou a se debater muito na cama e não resistiu. Fizemos tudo o que foi possível. Meus sinceros pêsames.
***
Ricardo abriu os olhos e olhou para os lados, estava deitado em um deserto.
"É apenas um sonho" - pensou ele.
Se levantou e viu mais crianças se levantando, crianças que nunca tinha visto antes em sua vida.
- Hoje vamos brincar de pega-pega.
Todas as crianças se olharam.
- Podem correr à vontade, o mais rápido que puderem. Eu vou pegar vocês. HAHAHAHAHAHAHA!
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Esconde-Esconde
Short StoryConto publicado na antologia Entre o Bem e o Mal da editora Illuminare, em 2017.