O Senhor do Carro Negro

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Negro, estatura mediana, 50 anos, gostava de vestir-se de branco, pensava combinar melhor com seu belo fusca. Assim como a maioria da sua idade, possuía mulher e filhos. Era um homem de bem, sem beber, é claro. Final de semana, muita bebida, promiscuidade, brigas, discussões, espancamentos, a cada passo reto, cinco eram cambaleando, até chegar no seu tão querido, fusca preto.

Apesar de amá-lo, sua mulher e filhos não suportava mais. Todo fim de semana era sempre o mesmo: Lá se ia pela manhã bem cedo, enchia a cara e por volta de uma hora da madrugada era o maior alvoroço. Após exigir comida a sua mulher, sempre acabava sendo travada uma luta de corpo a corpo com o filho que com a intenção nobre de salvar mãe e irmã, acabava sempre levando aquela surra do pai.

Achando pouco, corria em alta velocidade pela vizinhança, noite adentro buzinando chegando muitas vezes a atropelar quem estivesse em seu caminho sem prestar nenhum socorro. Não precisava. Com seu fusca na mão e a bebida na mente, ele era o rei, ou pelo menos era assim que o mesmo se sentia.

Sua mulher rezava sempre por ele, tinha esperança em ter de volta o homem com quem se casou ou quem sabe ao menos, aquele  que é ao ficar sem beber.

Um dia após uma bruta surra atípica em relação a todas as outras, coração amargurado, boca sangrando, olhos fechados tamanho o inchaço, filhos ao chão também machucados, a dor deles era muito mais da alma do que física sendo assim ela profetizou:

"Aquilo que tu tanto amas, ainda vai te matar."

Nesse momento um sopro forte passou assoviando, como que para confirmar o que a mulher dizia  fazendo todos ficarem por um instante alheios a mais uma tragédia familiar daquele dia.


Sexta-feira, 24 de Junho de 1959

O tempo passou e nada mudou piorava a cada dia. Ele executava seu ritual costumeiro em casa partindo em seguida em direção ao carro.

Buzinas, gritos, alta velocidade,mais um atropelo. Rua vazia restando a madrugada e um cadáver como companhia, ou não será melhor dizer dois?

Fora tudo muito rápido, em fração de segundos após atropelar um rapaz que vinha embriagado cantando alegre enquanto voltava para casa, ele correu depressa, acelerou, mais do que de costume. Parecia sentir prazer ao avistar o pavor nos olhos de todos que ficavam com a morte na sua frente, enquanto olhava para trás, para os gritos de socorro.

Poste a frente, batida inevitável...


"Zé porque você não vende esse fusca filho..."


"Nunca! Ele é meu, não o abandonarei jamais, nem depois de morrer.

Ta doida mulher? "Nunca se desfaçam dele."


E assim foi.

Seu Zé nem viu o que o atingira, quando seu fusca colidiu em cheio com o poste, seu corpo voara numa velocidade monstruosa, estranhamente sua cabeça fora separada do corpo para direita. De platéia apenas todas as almas das vidas que ele e o seu carro tirou.

E como prometera todos os dias anos em que o dia 24 de Junho, data de sua morte, as 01h00min da madrugada, em uma sexta-feira, não há uma só alma viva naquela cidade que não assista o Seu Zé passar buzinando, gritando, correndo com o seu velho e querido carro negro.

Até hoje, tem quem diga que o ver por aí, misturando-se entre todos, na companhia daqueles que levou, aproveitando a festa.

A Garota do Prédio entre outros contosOnde histórias criam vida. Descubra agora