O inferno é logo ali

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Era por volta de uma hora da tarde e eu estava sentada no sofá enquanto tomava o meu chocolate quente quando ouvi ruídos vindos da casa ao lado.
Há alguns dias atrás, retiraram a placa de "vende-se" e eu ainda não conseguia acreditar que alguém foi capaz de comprar aquela construção diabólica. Eu odiava olhar para aquela casa, e sentia diversos arrepios atravessarem a minha espinha quando a encarava. Talvez isso acontecesse por causa das histórias que contavam sobre ela, só que eu ainda não confirmei essa teoria. Mas agora era um outro momento, e eu queria muito poder olhá-la para descobrir quem era o louco capaz de cometer a atrocidade de chamar aquele local de lar.

A casa era monstruosa. Erguida em seus fabulosos e assustadores dois andares, a tinta negra e os detalhes em madeira que a cobriam era o que mais a destacava das outras construções. O jardim era tão impecável quanto a coloração das paredes, e até as plantas de lá me davam medo.

Ela era bem diferente da minha casa - que tinha um único andar muito bem distribuído em sete cômodos. A coloração da fachada era de tom salmão, e o jardim se erguia repleto de flores coloridas, que se estendiam até a calçada.

Olhando bem agora, a minha casa não era nada se comparada com a casa do vizinho. Que a partir de hoje eu chamaria de diabo. Pois só o próprio diabo seria capaz de habitar aquele inferno.

Eu poderia continuar sentada no meu sofá e fingir que não estava ouvindo os ruídos? Sim, poderia. Poderia também fingir que não estava curiosa para saber quem era o novo vizinho? Sim, mas eu estava.

Já imaginei mil e um tipos de pessoas que seriam capazes de habitar aquele antro do inferno e em nenhum momento imaginei que pudesse ser alguém normal.

Ninguém normal o suficiente chegaria perto daquela casa.

Batuquei os dedos contra a xícara que estava repleta de um chocolate que agora se encotrava tão frio quando o clima la fora e olhei impaciente para a janela coberta pelo blackout rosa.

Seria estranho demais se eu desse só uma espiadinha?

Bom... Eu não sei, e considerando o silêncio da minha gata eu diria que não.

Repousei, então, a xícara na mesa de centro e ajustei o meu vestido ao corpo. Suspirei alto tentando acalmar o fervilhão que se passava em minha mente e caminhei até a janela que ficava do lado contrário à lareira - que agora estalava baixinho enquanto as labaredas de fogo tomavam a madeira recém colocada em seu aconchegante e destrutivo calor.

Sinta-se grata madeira, pelo menos você tem quem te aqueça.

Enfiei os meus dedos entre uma das divisórias do blackout e empurrei um pouco para abrir uma pequena fenda, corri os olhos por toda a extensão da casa que ficava bem ao lado da minha, mas não encontrei ninguém ali. Tudo o que tinha eram apenas dois caminhões de mudança estacionados na frente da construção diabólica; e eles estavam acompanhados de um carro preto que eu não fazia a mínima idéia do nome ou da marca, mas sabia que era bonito e caro.

Carros assim não eram comuns por aqui, no máximo via-se dois ou três veículos iguais a ele no decorrer de um ano. Mas, como eu já disso, era algo raro. Podendo até mesmo ser considerada a execução de uma época festiva quando um carro assim irrompia alguma das únicas duas entradas da cidade.

Olhei para a janela da casa vizinha tentando ver algo a mais, mas os blackout's de lá encontravam-se fechados. Me mantive, então, concentrada e encarando a janela da casa do diabo. Por fim, acabou que esperei por tanto tempo que, quando finalmente notei o blackout se abrindo, algo estranho se enroscou na minha perna. Eu gritei alto, obviamente, dando largos passos para trás até que finalmente me choquei contra uma superfície baixa e firme que me fez cair de bunda no chão. Tombei o meu corpo para trás deitando totalmente contra o piso quando percebi que era apenas a minha gata que estava se enroscando em mim.

O diabo mora ao lado - CamrenOnde histórias criam vida. Descubra agora