Ecos do passado

178 20 18
                                    

O país estava chafurdado em crise econômica e política e como um bicho preguiça afundando num manguezal poluído, esforçava-se para manter o nariz fora da merda e respirar. Não faltavam análises nos telejornais, impressos e suas contrapartes mais verdadeiras nas memes de redes sociais atribuindo as chagas brasileiras a diferentes causas, de acordo com seus alinhamentos ideológicos.

Travava-se uma verdadeira batalha de informações enlatadas em recipientes enferrujados e rotos de mentiras, mas atraentes aos olhares pelas embalagens falaciosas dos designers de informação. Estes preparavam as mentiras entorpecer a sua mente.

E prepare-se para um parágrafo especialmente elaborado para incontestavelmente derreter a sua mente.

Uns atribuíam todos os males aos anos de governo do Presidente Roseberg, o desastroso sucessor do anteriormente, aparentemente bem sucedido Presidente, o popular, e talvez eficiente, Polvo Marusco, atualmente, investigado e condenado, dito por uns injustamente, de receber vantagens ilegalmente, mas conseguir esconder tudo de modo incrivelmente dúbio, não sabendo se dizia a verdade, ou se sempre mente, indubitavelmente, era só mais uma coisa no cenário indiferente que enfrentava de frente o povo desempregado preso numa corrente de mentiras e boatos que, acumuladamente, iam convertendo a todos ao estado de indigente.

Outros diziam que tudo isso começou ainda antes com as privatizações de Ferdinando Eduardo Lodoso e os que iam além, atribuindo tudo aquilo a raiz rota de uma nação que nasceu sob o fugitivo Dom João VI e a aristocracia podre portuguesa que invadiu o Rio de Janeiro contaminando para sempre o Brasil com a praga da corrupção ubíqua.

Tudo aquilo, o Homem-Café já estava careca de saber, mas ele se sentia um pouco incomodado sempre que via uma matéria atribuindo todos os males da atualidade à sua breve atuação como Presidente da República. Muitos jornais diziam: o Herói que destruiu o país. Era irônico, pois não haveria mais país se não fosse por ele. Há poucos meses, ele sozinho, resolveu uma grave crise mundial que ameaçava toda a raça humana de extermínio nuclear. Uma crise tão grave que não foi divulgada pela mídia e, por cuja solução, Café não obteve reconhecimento.

Mas ele não ligava para aquilo. Em seu peito, a cada manhã, havia apenas o sentimento de querer fazer justiça. De ver um mundo melhor, um Brasil melhor para os brasileiros que ainda sofriam por ter seu país sequestrado por uma classe polícia corrupta em alta simbiose com grandes corporações que injetavam capital propinesco nas artérias doentes da nação.

Depois de combater a gangue de seu antigo rival, Berimbau, em Salvador, Café voltava a Belo Horizonte onde seu antigo companheiro de equipe, Tiradentes, precisava desesperadamente de apoio para combater uma organização criminosa composta por traficantes de drogas, políticos e outros agentes públicos.

Café chegou ao aeroporto nos confins de BH usando o disfarce holográfico da LIS, Liga Internacional de Superpoderosos, da qual era um membro. Já fazia algum tempo que não era chamado para alguma crise internacional e Café sentia falta de estar perto de gente honesta. Ao seu lado, seu companheiro imaginário, Coffee Break resmungava alguma coisa a respeito da psicoesfera sombria daquele estado.

Dá pá pará de reclamá, Rique? — Café disse irritado.

Café seguia na direção do homem com um cartaz verde e amarelo.

O homem que o segurava abriu um sorriso que Café correspondeu. Eles se abraçaram.

— Cara, há quanto tempo! Que bom que ocê veio.

— Bom tivê também!

Tiradentes era um sujeito barbudo, que usava enormes óculos escuros, um chapéu marrom e um terno da mesma cor. Havia modificado a largura dos maxilares e da maçã do rosto, usando seus poderes de mutação óssea, também conseguindo um disfarce eficaz.

Homem-Café - O Retorno dos InconfidentesOnde histórias criam vida. Descubra agora