Único; Museu

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Eu não me lembro bem em que momento, mas repentinamente nós nos encontramos naquele festival indie. Você tinha seu jeito encantador, era animado e parecia extremamente feliz por estar naquele show.

Também não sei a razão a qual me forcei a manter uma conversa com você, sendo que eu podia muito bem dar as costas e ir embora. Afinal, você era um estranho bem estranho.

Seu nome entrou como melodia nos meus ouvidos e saía como poesia de minha boca. Eu parei de prestar atenção na voz profissional do cantor estrangeiro e me concentrei na sua, tão meiga e rouca, uma combinação temível para mim.

Taehyung falava sobre o equilíbrio, as tonalidades das estações, tatuagens e astros. Eu fui enlaçado pelo seu papo contagiante, as teorias e as relações malucas – mas que faziam um sentido confuso – que ele fazia, mal vendo as horas passarem.

Então, eu fui muito bem apresentado às suas tatuagens. Ah, cada uma mais bonita que a outra, totalizando cinco. Imaginei, para cada uma, um significado, porque você me deixava curioso todas as vezes em que desviava o assunto.

Você me intrigou.

Conheci o sistema Solar no seu braço e passeei de Mercúrio para Vênus, depois para a Terra, Marte, Júpiter, Saturno, Urano, Netuno e, por último, Plutão. Passeei por cada um de seus canteiros de flores escondidos na pele e me perdi nas estrelas que mapeavam sua tez.

Me surpreendeu ainda mais o fato de que você as pintava com canetas, essas desgastadas e com pouca tinta, cada uma de suas tatuagens, como se seu corpo fosse a sua tela particular.

Você é uma pintura.

Foi-me dada a oportunidade de pintar seus planetas e, assim, eu complementei a pintura abaixo da sua. Não entendi por que começou por Saturno, senti vontade de perguntar. Mas me contive com um sorriso enquanto escutava suas risadas de cócegas ao me ter pintando Urano.

Taehyung provavelmente não viu, porém, uma vez ou outra eu parava de pintar e observava os traços de seu rosto, tão delicados e ao mesmo tempo tão intocados. Eram marcantes, assim como sua presença, seu jeito exótico, tudo.

Sua pele brilhou, radiante com a explosão de fogos que assistimos. Eu me esqueci totalmente do show e acreditei fielmente de que aqueles eram especialmente para você, porque você estava tão incrível...

Você me prendeu.

Aventurei-me afundo por suas outras tatuagens e descobri a minha favorita até então, a na clavícula. Uma constelação, com cinco estrelinhas e um tracejado entre elas, tão delicada quanto quando você falava sobre as suas plantas favoritas.

Você era tão bonito, Taehyung, que eu me perdi na sua pele e me aprofundei no céu fictício que havia no seu peito, acordando apenas ao ouvir a proposta de lhe pintar as estrelas.

Como eu poderia recusar?

Pintei cada uma delas, sentindo sua colônia bem de perto, fingindo ignorar seus arrepios quando minha respiração lhe chocava na pele. Eu percebi todos eles; me tornei amante de cada um e prometi os amar na calada da noite.

Ao fim, Taehyung, você se despediu, deixando para trás sua caneta bic usada, as memórias que tive com você e sua tela particular em minha mente.

Mergulhei em ti de uma única vez, sem medo de me afogar. Explorei alguns de teus planetas e me permiti manter a curiosidade de conhecer os restantes, principalmente seu Sol e sua Lua em cada pé. Cuidei de tuas estrelas como se fossem pedras preciosas e as beijei em minha imaginação, enquanto suspirava com o perfume das flores espalhadas em ti.

E a pergunta que rodeava minha mente não era onde você estaria, nem qual era o seu número, nem por que você simplesmente não me beijou quando estávamos pertinho um do outro.

Eu só queria saber: quando eu poderia pintar tuas galáxias mais uma vez?

No fundo eu sabia que hoje eu lhe havia pintado, amanhã seria outro e depois mais outro. Não pude deixar de rir da minha própria desgraça.

Reprimi meu desejo de lhe pintar todos os planetas, dessa vez com as respectivas cores, e até pintar de azul escuro, roxo e preto ao redor. Mantive apenas para mim a minha vontade de pintar aquelas estrelinhas mais uma vez, tendo a chance de não apenas usar as canetas, mas da minha boca e minhas carícias para as colorir. Enjaulei no peito o desejo de passear os dedos pelas pétalas em sua pele e comprova, mais uma vez, a hipótese de que eram tão macias quanto as verdadeiras. A minha vontade de tomar seu universo, você, só para mim.

O universo de Taehyung era o mais bonito que eu já havia visto na vida, mas também o único que eu veria apenas uma vez.

Afinal, você é só mais um fã de Arctic Monkeys. E eu, um intruso que admirava o museu que era teu corpo.

Galáxias PintáveisOnde histórias criam vida. Descubra agora