Capítulo Único

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Mesmo com os olhos fechados sinto toda a claridade vinda da janela, e ela me incomoda um bocado. Um fio de baba escorre pelo meu braço, que serve de apoio para a minha rápida soneca da segunda aula. Mal começamos o dia e eu já quero sair correndo desse lugar.

Eu estou quase adormecendo de novo quando escuto ao longe, bem ao longe, a voz da professora chamar meu nome. Que merda!

— Jeongguk, o que pensa que está fazendo ai? – A senhora Lee não é nada fofa quando o assunto é encher meu saco. Não vamos nos deixar enganar por essa carinha de senhora idosa e amigável, que de amigável não tem nada de fato, te garanto.

Nem me dou o trabalho de responder, mas abro os olhos e encaro a senhora que agora está parada na minha frente, as feições tão feias quanto suas roupas.

— Já conversamos sobre dormir em sala de aula, não é mesmo? — tiro força do além para respondê-la:

— Sim, senhora Lee. — Deixo o desdém bem claro em minha voz ainda sonolenta.

— E o que o senhor me diz? — Continua ela, petulante que só.

— Que a senhora atrapalhou os meus sonhos. — É bem isso mesmo que falo, voltando a babar no meu braço, virando a minha cara para a janela.

Ouço os sons das risadas dos outros alunos de fundo e um bufar da professora irritada. Os risos logo se cessam, como de costume, já que é sempre assim que acontece quando eu abro a boca, qualquer coisa que eu falo é motivo de riso solto do pessoal da sala querendo chamar a minha atenção, inutilmente, claro. Não que isso me incomode, eu até mesmo arrisco dizer que gosto. É como uma leve carícia no meu ego.

E assim meu dia passa, de saco cheio de tudo, tentando entender o porquê de estar ali. Alguém tão incrível como eu poderia estar em qualquer outro lugar no momento, menos ali. Assim que a hora de ir embora chega vou direto para meu armário na ânsia de sair logo daqueles muros altos, e ao chegar ao meu armário encontro um recado preso no mesmo. A letra cursiva é bem caprichada e a caneta é uma daquelas de glitter na cor roxa.

Ali está escrito:

"Você estava lindo hoje".

Nada de novo sob o sol, na realidade, os bilhetes são corriqueiros para mim.

Sim, eu estava realmente lindo hoje, mesmo vestindo apenas o uniforme da escola eu tinha aquele charme. Eu me olho no espelho todos os dias, qual é!

Eu já fiquei com algumas meninas da escola, mas eram uns beijos e nada mais. As meninas me cansavam e eu acabava dispensando cada uma delas depois de um tempo (curto, deixo avisado). Sempre havia um post-it colorido enfeitando meus armários e cadernos com um elogio ali, um pedido de beijos acalorados depois da aula acolá. Quando eu estava entediado eu atendia alguns desses pedidos, não poderia ignorar meus hormônios para todo sempre, eu era um menino adolescente e eles travam uma guerra diária dentro de mim.

E tenho que levar em conta que eu sou sim um aluno popular dentre os alunos na escola, tenho uma reputação a zelar, oras. Minha atitude com os educadores deixava a minha popularidade em alta na sala dos professores também, mas não pelos mesmos motivos, claro. Era sempre o aluno que fazia aquela piada gostosa quando o professor falava algo, ou quando não sabia a resposta da prova, ou até mesmo com a diretora. Mas no fundo, bem no fundo, sei que eles também me amavam, mesmo com minhas notas baixas.

Mas vou confessar uma coisa aqui, por mais que as pessoas riam do que eu falo, das minhas piadas sem graça nas aulas mais chatas, eu não tenho muitos amigos, sou uma pessoa de personalidade fechada e quieta na maior parte do tempo. Eu considero que tenho colegas, mas alguém pra compartilhar o segredo da humanidade e fazer aquelas noites do pijama (hétero much?) eu não tenho não.

Hétero até a página doisOnde histórias criam vida. Descubra agora